A história dos piratas no cinema | JUDAO.com.br

Antes de Piratas do Caribe, as histórias dos corsários nos cinemas tiveram lá seu momento de glória e também um declínio considerável, repleto de fracassos retumbantes

Não apenas um inesperado e gratificante sucesso de bilheteria, o divertidíssimo Piratas do Caribe: A Maldição do Pérola Negra representou também o retorno magistral às telonas de um gênero totalmente desgastado e a quebra de uma regra já tradicional no cinema de entretenimento até então — os pouquíssimos filmes de piratas surgidos nos últimos resultaram em fracassos retumbantes de bilheteria e em filmecos ruinzinhos que só eles...

Da mesma forma que acontece em boa parte dos ESPECTROS da cultura pop, o pirata cinematográfico padrão segue aquele arquétipo da chamada Era de Ouro de Pirataria, que compreende a atuação dos bucaneiros entre os anos de 1650 e 1730, conforme registrado inicialmente pelo Capitão Charles Johnson em seu livro A General History of the Robberies and Murders of the Most Notorious Pyrates, publicado em 1724.

Criando uma aura quase mística ao redor dos corsários, ele foi a grande influência de escritores como J.M.Barrie (dramaturgo que escreveu a peça The Boy Who Wouldn’t Grow Up, aquela que deu origem ao personagem Peter Pan) e Robert Louis Stevenson, do clássico A Ilha do Tesouro, de 1883. Além de ganhar uma porrada de adaptações ao longo dos anos, a obra de Stevenson tem na figura do vilão Long John Silver talvez a maior contribuição para o visual dos piratas nas telonas.

Apesar de alguns experimentos com curtas, dá para dizer que o cinema-pirata surgiu MESMO com o advento dos filmes de aventura, isso lá pelos anos 1920, ao lado das produções capa e espada, tipo Zorro, fazendo um baita sucesso. Seu primeiro título significativo foi O Pirata Negro (1926), superprodução dirigida por Albert Parker e estrelada pelo rei dos primórdios dos blockbusters, o astro Douglas Fairbanks – intérprete de outras nobres figuras como D’Artagnan e o próprio Zorro.

O Pirata Negro

Além de bastante engraçado, ainda que totalmente datado, O Pirata Negro (que conta a história de um homem que infiltra-se em uma gangue pirata para vingar a morte de seu pai) serviu também para fixar os alicerces do subgênero. Pra ser um bom filme de pirata, era obrigatório ter uma história mais do que ROCAMBOLESCA, ação desenfreada, locações em ilhas desconhecidas, tesouros escondidos e, claro, a mocinha que começa a história como vítima do ataque dos piratas e termina como aliada e interesse amoroso para o astro da história. Os efeitos visuais, que utilizam miniaturas e imagens do longa mudo The Sea Hawk (1924), são RISÍVEIS hoje em dia, mas em sua época, eram um verdadeiro fenômeno.

O gênero fortaleceu-se pouco depois com a chegada de um astro que mexeu com o público nos anos 30, o australiano Errol Flynn. Radicado nos EUA e um dos primeiros sex symbols dE Hollywood, talvez um Brad Pitt da época, Flynn estrelou o fantástico Capitão Blood (1935) ao lado de Olivia de Havilland e com direção de Michael Curtiz. A fita, que readapta a história de Robin Hood (outro papel no qual Flynn se tornou célebre), mostra um médico condenado injustamente por roubo em 1685, que foge da cadeia e decide tornar-se um pirata para “tirar dos ricos e dar aos pobres”.

A parceria entre Curtiz e Flynn rendeu mais um longa de piratas em 1940, o ótimo O Gavião do Mar, que conta a história de Geoffrey Thorne (Flynn), um aventureiro contratado pela Rainha Elizabeth I em pessoa para subjugar a armada espanhola, que pretende atacar a Inglaterra, mas que acaba questionando sua posição ao se apaixonar por uma bela tripulante inimiga, Dona Maria (a simplesmente sensacional Brenda Marshall).

A era de ouro das garrafas de rum

As investidas de Douglas Fairbanks e Errol Flynn no subgênero dos piratas deixaram os estúdios empolgadíssimos. Em 1934, por exemplo, a Metro-Goldwyn-Mayer tratou de filmar A Ilha do Tesouro, com o popularíssimo Wallace Beery e o pivete Jackie Coogan (que muitos anos depois, tornaria-se o mal-humorado Perry White dos longas do Superman com Christopher Reeve).

A Ilha do Tesouro – cujo comando ficou a cargo do mesmo Victor Fleming que cinco anos depois entraria para a história ao dirigir as grandes obras-primas O Mágico de Oz e E o Vento Levou – foi refilmado em 1950 por Byron Haskin (o mesmo que dirigiu a primeira e definitiva versão de A Guerra dos Mundos) e também rendeu um filminho estrelado pelos Muppets em 1996 e um fracassado animado futurista da Disney em 2002, Planeta do Tesouro (Treasure Planet).

Outros notórios longas que beberam nesta fonte foram Os Mares da China (1935), cujo elenco era formado pelo adorado Clark Gable e pela gloriosa vênus platinada Jean Harlow; A Princesa e o Pirata (1944), mistura de ação e comédia que serviu de veículo cômico para a dupla de comediantes Bob Hope e Virginia Mayo; Capitão Kid (1945), clássico da Sessão da Tarde com elenco formado por Charles Laughton, Randolph Scott e John Carradine; e o não menos importante O Corsário sem Pátria (1958), com direção de Anthony Quinn e atuação de Charlton Heston e um Yul Brynner em início de carreira.

Maureen O’Hara, a capitã Spitfire

Um outro destaque foi Contra Todas as Bandeiras (1952), no qual o eterno Errol Flynn vive o oficial britânico Brian Hawke, infiltrado num esconderijo de piratas localizado na costa de Madagascar, se fazendo passar por um desertor. Seu par romântico é Maureen O’Hara que, surpreendentemente para a época, não era uma mocinha em perigo, mas sim uma capitã pirata, Prudence Stevens, que atendia pelo nome de Spitfire.

Os cinemas deste período também presenciaram a febre das serials, aqueles filmes divididos em episódios que as pessoas iam ver nos cinemas, semanalmente, e claro que os piratas não poderiam ficar fora desta: pelo menos dois trabalhos em forma de seriado trabalharam esta temática em grande estilo. O primeiro deles foi The Sea Hound (1947), uma das mais elogiadas serials de todos os tempos (não à toa, seu astro era ninguém menos que Buster Crabbe, o rei dos seriados de cinema), seguido de As Aventuras do Capitão Kid (1953), com John Crawford e a impressionante duração de 15 capítulos.

O declínio

Mas tudo que sobe, um dia tem que descer... e se os piratas gozaram de absoluta popularidade nas décadas de 40 e 50, os anos 60 chegaram e trouxeram o declínio ao lado de paupérrimas e tenebrosíssimas produções oriundas principalmente da Itália. Fitas como La Venere Dei Pirati (1960), Morgan Il Pirata (1961), Il Leone di San Marco (1963) e I Pirati della Malesia (1964) ajudaram a enterrar o gênero, que já sofrera um desgaste por conta do interesse do público em filmes mais maduros.

Um dos primeiros a tentar trazer os baderneiros dos sete mares de volta à vida no celuloide foi um certo Roman Polanski, no ultra-mega-hiper-super-fuckin-fracassado Piratas (Pirates), comédia de humor-negro que tentou seguir a mesma fórmula de sucesso do bacanudo A Dança dos Vampiros (The Fearless Vampire Killers/Pardon Me, But Your Teeth Are in My Neck, 1967) e acabou se dando mal – custou cerca de US$ 40 milhões e só rendeu por volta de 1,5 milhões de doletinhas em território americano...

O filme foi originalmente concebido logo depois do sucesso de Chinatown, tendo inclusive Jack Nicholson na mira pro papel principal mas, com as acusações de estupro de uma menor de idade, Polanski fugiu dos EUA, fazendo com que o projeto fosse interrompido por lá, sendo retomado anos depois em Paris. Assim sendo, entre o começo das atividades e o seu lançamento DE FATO, foram 12 anos de desenvolvimento. Um inferno para todos os envolvidos.

Ainda que fracassado comercialmente, no entanto, é errado dizer que Piratas é ruim. Não é lá aquela maravilha, mas vale uma espiada, nem que seja para se deliciar com a magnífica interpretação de Walter Matthau na pele do psicótico Capitão Red, astro da película.

Piratas, de Roman Polanski

Três anos antes chegaria às telas a divertida adaptação do espetáculo da Broadway The Pirates of Penzance (1983), do compositor de óperas William S. Gilbert, também conhecido como Gilbert & Sullivan. A comédia-musical acompanha um jovem (Kevin Kline) que torna-se o Rei dos Piratas por engano, mas acabou se tornando um tremendo fiasco de bilheteria por conta de uma ideia inovadora dos produtores: a produção foi exibida simultaneamente no cinema e na TV, mais especificamente na emissora SelecTV, de Los Angeles. Lembra daquela discussão sobre as janelas, que vez por outra pinta por aqui no JUDÃO? Pois é, os caras resolveram cutucar a onça com vara curta já nos anos 80.

A reação veio a cavalo: irados, os exibidores e donos de cinemas simplesmente boicotaram o filme, tirando-o do circuito em seu segundo dia de exibição. Apenas uma sala de cinema nos EUA, localizada em Washington, manteve a produção rodando por mais de uma semana. O que, convenhamos, não adiantou muito...

Criou-se então, nos corredores de Hollywood, um status de maldição para filmes envolvendo piratas. E realmente não parou por aí: em 1991, tivemos a chegada aos cinemas do ambicioso Hook – A Volta do Capitão Gancho de Steven Spielberg, livre adaptação da clássica trama de Peter Pan centrada em seu vilão, o maligno Capitão Gancho (Dustin Hoffman), talvez o pirata mais famoso da cultura pop.

Relativo fracasso em números – rendeu US$ 119 milhões só nos EUA, cifra considerada baixa para seu custo de mais de US$ 70 milhões – e massacrado pela crítica, Hook não decolou como o esperado, por mais que hoje carregue o status de cult na lembrança dos trintões e quarentões.

O mesmo destino teve, apesar de estarmos falando de um filme cujo resultado final é BEEEEEM diferente, o ENGODO que atende pelo nome de A Ilha da Garganta Cortada (1995), dirigido por Renny Harlin e estrelado por Matthew Modine e Geena Davis. A brilhante direção de arte não conseguiu disfarçar o péssimo enredo e ninguém caiu na armadilha. Resultado? Rendeu apenas US$ 10 milhões por lá — e olhe que o dito cujo custou polpudos US$ 92 milhões.

O gênero dos piratas só voltou mesmo a cair nas graças do público com um certo longa-metragem lançado em 2003, com um tal de Johnny Depp, inspirado em uma certa atração de um certo parque temático americano... mas isso aí é outra história. Uma outra história que renderia a sua obrigatória adaptação pornô, aliás. Estamos falando de Pirates, épico (leia-se: filme de SUADEIRA com historinha) dirigido por Joone (?) e estrelado por Jesse Jane e Janine Lindemulder, que ganhou nada menos que 11 prêmios no AVN Awards, o Oscar do pornô.

Independente das cenas mais, hm, “nervosas” a gente tem que admitir que o trailer desta pérola do cinema pornográfico tem, no mínimo, uma produção muito bem cuidada. Pudera: com um orçamento de mais de US$ 1 milhão e cenas rodadas com câmeras de alta definição, eles apostaram tanto na produção e nas sequências de aventura que chegaram até a lançar uma versão editada para DVD, sem cenas de sexo explícito, garantindo uma classificação R-Rated pra tentar atingir um público mais amplo.

O sucesso renderia até mesmo uma continuação, lançada em 2008, com Belladonna e Sasha Grey se juntando ao elenco. Em Pirates II: Stagnetti’s Revenge, com um orçamento ainda mais astronômico (US$ 8 milhões, considerado um dos filmes pornôs mais caros da história), a produção investiu novamente na tal da versão R-Rated, garantindo até uma exibição pública – com sua dose de polêmica envolvendo políticos locais, claro – pelos alunos da University of Maryland.

Assista ao trailer e diga pra gente se não parece melhor do que muita coisa que anda sendo lançada por aí... ;)