Para espanto geral da nação que NÃO acompanha os quadrinhos Disney… :D
Este lance todo de laços de sangue é mesmo uma das coisas mais complicadas para quem não acompanha tão de perto os gibis da Disney e só tá ligado nos personagens nas versões dos desenhos.
Vejamos o caso da família mais famosa da cidade de Patópolis, por exemplo. Temos o Pato Donald, que cria os três sobrinhos gêmeos, Huguinho, Zezinho e Luizinho. Mas ora essa, se eles são sobrinhos do sujeito, quem diabos são seus pais? Talvez o Donald tenha um irmão ou uma irmã nunca antes revelados?
Então... tem sim. E é mais simples do que parece. Apesar de não se ter uma única cronologia assim tãããããããão coesa, já que certos países no mundo têm maior liberdade de criação para as histórias que produzem localmente, se procurar direitinho a gente acaba encontrando as respostas, como no caso da árvore genealógica da família Pato, organizada originalmente pelo lendário Carl Barks e depois aperfeiçoada por seu sucessor direto, Don Rosa.
Sabe a Vovó Donalda, que mora numa fazenda nos arredores de Patópolis? Então, ela se casou com Tomás Reco e teve três filhos: Patoso (pai do Donald), Patolfo (pai do Peninha) e Patrícia (mãe do Gastão). O tal Patoso se casou com Hortênsia MacPatinhas, que é irmã de Patinhas Mac Patinhas, o ricaço que hoje conhecemos como Tio Patinhas. E então Patoso e Hortênsia tiveram dois filhos gêmeos: Donald e Dumbela Pato. BINGO. Embora não se saiba quem é o pai, Dumbela é a mãe de Huguinho, Zezinho e Luizinho, que os deixou aos cuidados do irmão e nunca mais voltou.
Essa história, aliás, passou a ser explorada na nova versão de DuckTales. :)
Se o Donald tem seus sobrinhos, assim como o Pateta também tem (Gilberto) e igualmente têm a Margarida (Lalá, Lelé e Lili) e Minnie (Millie e Melody Mouse, sendo que estes nomes variem um pouco e algumas vezes apenas a última, traduzida como Melodia, apareça nas histórias sozinha), o Mickey também tem os seus. E, claro, TAMBÉM são gêmeos (o que faz sentido, já que os bichos que eles representam raramente dão à luz à apenas um filhote, né).
Estamos falando aqui de Morty e Ferdie, uma dupla que aqui no Brasil foi rebatizada para Chiquinho e Francisquinho. Embora eles estejam muito longe de ser tão populares quanto os sobrinhos do Pato Donald, a dupla foi criada pelo menos seis anos antes, estreando na história Mickey’s Nephews, de 1932, do cartunista Floyd Gottfredson. Aliás, é preciso dizer que, historicamente, se considera que Floyd teria de alguma forma tido o mesmo impacto para a versão quadrinística do Mickey que Carl Barks teve para a Família Pato.
De qualquer forma, nesta história inicial, publicada em nosso país só em 1973, na edição número 1 da revista Cinquentenário Disney e sob o título de Sobrinhos do Barulho (a republicação mais recente foi em 50 Anos da Revista Mickey, de 2002), os dois são entregues na casa do Mickey por uma certa Sra. Fieldmouse. O ponto é que ali ela é retratada como uma senhora muito mais velha e não se cria qualquer relação familiar entre o ratinho e a senhora que mais tarde seria oficialmente chamada Amelia, a versão americanizada do nome “Amalia”, como usado na tradução do gibi lá na Holanda. Ela só deixou os moleques pro Mickey tomar conta, foi buscar no final do dia e deu. No entanto, eles chamam o Sr. Mouse de “tio”. Podia ser apenas uma forma carinhosa que, anos mais tarde, foi entendida como parentesco? Podia. Até porque o Mickey a chama de “Mrs. Fieldmouse” quando recebe os moleques.
O ponto é que Chiquinho e Francisquinho voltaram a aparecer inúmeras vezes nos gibis do tio famoso, mas sem qualquer outra menção a esta tal Sra. Fieldmouse, seja ela Amelia, Amalia ou qualquer coisa semelhante. Mas corta pros anos 2000. Na Dinamarca, no caso.
Já faz um boooom tempo que as atuais histórias de linha das HQs da Disney, diferente do que acontece com Marvel e DC, costumam ser produzidas na Europa e depois exportadas para republicação no restante do mundo. A gente sabe que grande parte deste material, incluindo o que vinha sendo publicado pela Abril no Brasil, tem origem na Itália. Mas existe um outro ponto de produção bastante interessante — no caso, a Dinamarca.
Lá, sob o controle da editora Egmont Publishing, o roteirista Paul Halas e o desenhista espanhol Francisco Rodriguez Peinado, que atende pela alcunha de Paco Rodriguez, escreveram uma história chamada Riverside Rovers, na qual Chiquinho, Francisquinho e o amigo Gilberto resolvem jogar futebol. E adivinha quem aparece aqui, cuidando dos moleques? Não é o Mickey, mas sim uma certa Amelia Fieldmouse. Que a história diz claramente tratar-se da irmã mais velha do Mickey. Ora, ora.
Aqui cabe uma explicação adicional: na verdade, na versão original produzida na Dinamarca, a mãe/irmã é chamada de Felicity Fieldmouse, aparentemente uma jornalista casada com um certo Frank que não chega a aparecer na trama (e que talvez seja o motivo de ela ter um sobrenome diferente do irmão). O ponto é que em outros territórios, como aqui no Brasil, ela é chamada de Amelia.
Basta ver a história Com a bola toda!, publicada em Mickey n° 648, de junho de 2001. Seria aquela Amelia original, de 1932, uma tia distante ou mesmo a avó por parte de pai dos meninos? Ou então, com esta confusão de nomes à parte, estamos falando de um reboot da mesma personagem? Afinal, apesar de ainda ser mais alta do que o Mickey, a nova Felicity/Amelia tem mesmo um visual mais jovem, mais modernoso, descolado.
O pessoal do Huffington Post conversou com Paco, o desenhista, que não soube precisar se a ratinha é uma personagem nova ou a revitalização de uma personagem anterior. Mas ele explica que tanto ele quanto Halas e Lars Bergstrom, o editor, passaram apenas uma semana de trabalho efetivamente juntos na cidade dinamarquesa de Copenhagen para alinhar as pontas da trama.
Aliás, leia-se, das MUITAS tramas, já que esta primeira história daria origem a uma série de HQs com Chiquinho, Francisquinho e Gilberto integrando um time chamado Pernetas Futebol Clube. Muitas delas saíram posteriormente no Brasil, mais recentemente no especial Futebol Disney n° 2, de 2014, no maior clima de Copa do Mundo.
O HuffPost tentou falar com o restante do time criativo e mesmo com a Disney, para ter uma resposta definitiva a respeito, mas não obteve resposta alguma. Afinal, família é mesmo um troço complicado quando se trata destes ratos e patos. Isso quando a gente não coloca um coelho no meio e diz que ele é o meio-irmão mais velho do Mickey... Mas aí é outra história. ;)