O cara não só conta boas histórias em seus filmes como os usa pra mudar a indústria do cinema
Sempre que eu digo em alguma conversa aleatória que Avatar é um dos meus filmes preferidos, o “por quê?” meio indignado, meio genuinamente curioso, vem quase que automático, enquanto a cara da pessoa se transforma leeeentamente na da Pocahontas.
Bom, se você se olhou no espelho agora e não lembrava desse cabelo liso, longo e negro, são duas as principais razões: a primeira, que meio que serve como gatilho para a DESTRANSMORFAÇÃO, é que boas histórias podem e devem ser contadas pela eternidade — e Avatar conta uma boa história. Conta MUITO BEM uma boa história.
A segunda razão atende pelo nome de James Cameron. Sabe, um filme raramente é só um filme. Claro, você pode ficar 2h no escuro e assistir à umas coisas legais e ficar por aí, mas você pode também se aprofundar mais naquilo que viu, entendendo motivações, ideias e enfim, são quase infinitas as possibilidades pra se ir além.
No caso de Avatar — e da essência da filmografia de James Cameron — o que me faz gostar ainda mais do filme são as inovações tecnológicas que o cara empurra pra frente, abrindo caminhos e facilitando as coisas pra quem vem atrás. Pessoas como James Cameron fazem a indústria do cinema ir pra frente, nunca se contentando com o que tem disponível, tecnologicamente falando, pra contar suas histórias.
O Fusion Camera System é uma das grandes novidades de Avatar, um sistema que junta duas câmeras Sony HDC-F950 HD a poucos centímetros uma da outra, pra imitar a separação dos olhos humanos — ou, em outras palavras, é por isso que o 3D desse filme funciona TÃO bem — algo absolutamente necessário para o filme. O mesmo vale pra As Aventuras de Pi, que usou o sistema alguns anos depois.
Swing camera (que tem esse nome já que ela pode ir pra qualquer lugar) é uma “câmera” virtual, que permite ver em tempo real não só a captura de movimento dos atores como o cenário em que elas se encaixam — e ela surgiu na Weta, a partir da necessidade que James Cameron sentiu ao filmar Avatar. Ele precisava ver as coisas enquanto elas aconteciam, e não juntar todos os dados que tinham e torcer pra dar certo na pós-produção.
Essa mesma tecnologia foi usada em As Aventuras de Tintin, por exemplo.
É comum você ouvir falar em “motion capture”, ou “captura de movimentos”. James Cameron, porém, não gosta da expressão, preferindo usar “performance capture” ou, adivinha só, “captura de performance”. Pra ele, muita coisa se perdia com o sistema de captura de movimentos, que dava apenas um básico para os animadores trabalharem.
Até então, esses movimentos faciais eram todos feitos NA MÃO. Sim, o Gollum é expressivo daquele jeito graças ao trabalho dos animadores.
Com Avatar, Cameron resolveu tirar de um guardanapo desenhado em 1995 a ideia de uma câmera pequena bem próxima da cara do ator, pendurada por um capacete, que iria mapear cada movimento facial — de olhos tremendo de nervoso a uma mexida no nariz, passando pela força dos músculos numa mordida.
Foi necessário um ano de trabalho, aperfeiçoando o algoritmo de tradução daquele mapeamento para a animação, mas o resultado fez tudo valer a pena.
Essa mesma técnica deu vida ao César e todos os outros SÍMIOS de Planeta dos Macacos e, já bem mais evoluída, nos permitiu conhecer a Maz Kanata de Star Wars: O Despertar da Força, interpretada por Lupita Nyong’o.
Então Avatar 2 tá demorando, né? Já estamos indo para o OITAVO ano de espera, e muito provavelmente esperaremos mais alguns. A razão é bem simples, e muito interessante, de acordo com o IndieWire: James Cameron quer que você assista ao filme, em 3D, mas sem óculos. “Eu ainda sou muito otimista em relação ao 3D, mas a gente precisa de uma projeção mais brilhante, e eu realmente acredito que pode acontecer, sem óculos. A gente vai chegar lá” afirmou o diretor durante um evento da Associação dos Engenheiros do Cinema e Televisão, que deu a ele um título de membro honorário, uma DISTINÇÃO que pessoas como Walt Disney, Ray Dolby e George Lucas ganharam.
“Eu vou forçar. Não só pra ter melhores ferramentas, workflow, grande alcance dinâmico (HDR) e high frame rates (HFR) — as coisas nas quais estamos trabalhando”, prometeu Cameron. “A magia do cinema precisa surpreender e isso envolve a criação constante de novas ferramentas e técnicas. Os olhos do público se ajustaram ao que a gente fez, então precisamos ir além”.
A ideia do 3D sem óculos não é nova e se você já chegou perto de um Nintendo 3DS deve saber mais ou menos como funciona. A questão é que o 3DS é algo que apenas uma pessoa vê, tendo a chance de ajustar o efeito para o que melhor LHE APETECE — e tudo isso de perto. Numa sala de cinema, é preciso pensar em larga escala, o que dificulta e MUITO o esquema, já que é necessário um único ponto de foco.
E se você parar pra pensar que os donos das salas de cinema precisarão fazer investimentos...
A magia do cinema precisa surpreender e isso envolve a criação constante de novas ferramentas e técnicas. Os olhos do público se ajustaram ao que a gente fez, então precisamos ir além
Quem, na história do mundo, mesmo com aquelas versões promocionais de vários filmes, um dia desse pensou com sinceridade algo como “OBA! Vou usar esses óculos!” na hora de uma sessão 3D? Ok gostar dos efeitos — eu mesmo não consigo assistir à Avatar na minha televisão, que é 2D — mas gostar dos ÓCULOS é impossível. James Cameron está prometendo o melhor de vários mundos.
Se precisarmos esperar pra que isso aconteça antes de assistir às sequências de Avatar, por mim tudo bem. Um enorme bem à indústria do entretenimento e cultura pop seria feito.
Mas, mais do que isso: é pra respeitar alguém que se preocupa TANTO com a maneira que seus filmes serão vistos. Cinema, no fim das contas, é isso. É magia. E Cameron é o Mago Supremo.