Mute: o grande projeto da vida de Duncan Jones | JUDAO.com.br

Ficção científica noir com Alexander Skarsgård, Paul Rudd e Justin Theroux, que deveria ter sido o primeiro filme da carreira do diretor, finalmente sai em 2017

“Este é o meu Don Quixote”. Assim Duncan Jones, em entrevista ao Den of Geek, definiu Mute, o seu próximo filme pós-Warcraft. Não dá pra saber bem se ele tá fazendo uma comparação que se refere à luta eterna de Terry Gilliam para tirar seu The Man Who Killed Don Quixote do limbo cinematográfico ou, quem sabe, ao próprio personagem do livro de Miguel de Cervantes, que lutou contra um mundo que achava que ele estava apenas perseguindo moinhos de vento. Em qualquer um dos casos, faria muito sentido.

“Este é mesmo um projeto que tem sido a minha paixão, e foi incrivelmente desafiador encontrar uma casa pra ele e conseguir fazer com que pudesse ser produzido”, diz ele. A casa, neste caso, é o Netflix, que promete lançar a produção, mais um de seus filmes originais, ainda em 2017, com data final a definir. “Acho que eles vão fazer do mesmo jeito que fizeram com Beasts of No Nation”, explica o diretor, para a revista Empire. “Um lançamento nos cinemas simultâneo com o lançamento dentro do Netflix”.

Mute, na verdade, deveria ter sido a estreia de Duncan Jones como cineasta, mas o cara passou uns bons anos tentando financiá-lo e simplesmente não conseguiu o apoio de produtoras ou estúdios. Para que as pessoas entendam a escala, ele diz que Mute é definitivamente maior do que Lunar, longa lançado em 2009 e que acabou sendo, de fato, a sua estreia por trás das câmeras.

Lunar era mais solitário, sobre a saga de um homem entendendo a si mesmo. Já o novo filme é totalmente urbano, no qual é necessária a ambientação de uma cidade inteira para que ela também, de alguma forma, seja personagem da história. “E esta é a razão pela qual eu não consegui rodá-lo quando de fato eu queria”.

“O Duncan me entregou uma primeira versão do roteiro de Mute quando nos conhecemos, 13 anos atrás”, conta o produtor (e amigão) Stuart Fenegan, no comunicado oficial do início das filmagens. A dupla se encontrou no mundinho dos comerciais de TV e, juntos, fundaram a Liberty Films. “Desde então, eu sempre quis fazer Mute se tornar realidade”.

Ao longo destes anos, outro sujeito que ele conheceu e leu os primórdios do roteiro foi o ator Sam Rockwell. Jones queria, aliás, que ele fosse o vilão da história, mas Sam tinha interesse em outro papel do script. Eles jamais chegaram num acordo, mas o encontro entre eles resultou num papel principal para o ator em Lunar, que viveu o astronauta Sam Bell.

Em suas andanças para fazer com que Mute acontecesse, Duncan chegou até mesmo a desistir. E pensou: “vou tentar fazer esta história acontecer em OUTRA mídia”. Foi aí que, em 2013, a Dark Horse anunciou que Mute seria publicado em formato graphic novel, numa colaboração entre o próprio Jones e o cultuado artista Glenn Fabry (Preacher).

Em sua conta no Twitter, o diretor, que tava vibrando com a notícia, chegou até a mostrar uma página da obra no traço de Fabry. “Estou tão empolgado que Mute finalmente vai existir!”, disse ele, na época. Mas, quatro anos depois, o gibi nunca foi publicado. Se ele chegou a ser de fato finalizado em algum momento, não sabemos. “Tem muito trabalho envolvido numa graphic novel também, portanto este projeto meio que está num limbo agora, principalmente com o filme acontecendo de verdade”, explicou algum tempo depois.

Vale lembrar que o diretor pode estar muito bem planejando fazer como Darren Aronofsky em Fonte da Vida (The Fountain). Originalmente desenvolvida como uma forma de fazer o ambicioso projeto se tornar realidade de vez enquanto ele tentava eternamente financiar o filme, a HQ ficou no seu próprio limbo e acabou sendo publicada pela Vertigo só na época em que o filme acabou indo mesmo para os cinemas.

Para tentar ajudar as pessoas a entenderem do que se trata o filme, Duncan Jones faz um comparação interessante: uma espécie de Casablanca futurista. “Vai ajudar a entender o espírito”. Mas os cinéfilos imediatamente vão se lembrar de um certo clássico da ficção científica que também carrega no clima noir: que tal Blade Runner?

Jones admite a referência, mas não quer se deixar limitar por ela. “Tem uma conexão com Blade Runner, mas eu tenho algumas ideias que darão ao filme a sua própria assinatura de construção de personagem”, afirmou, em OUTRA entrevista para a Empire. “A trama se passa numa Berlim do futuro que se parece com uma versão da Los Angeles de Blade Runner, mas com uma sensibilidade europeia”, explica.

De qualquer forma, Mute acontece numa Berlim que fica mais ou menos quarenta anos no futuro (“Eu não sei se vou ambientar a história em um ano em particular, porque isso meio que detona a credibilidade do filme”). Esta é uma cidade repleta de imigrantes, onde o Oriente entra em conflito com o Ocidente. Leo Beiler (Alexander Skarsgård), um bartender mudo, tem apenas uma única razão para viver nesta cidade: uma mulher que ama. Mas esta razão desapareceu misteriosamente, sem deixar vestígios.

Conforme a sua busca por ela o leva cada vez mais fundo nas ENTRANHAS DA METRÓPOLE, um estranho par de cirurgiões americanos (Paul Rudd e Justin Theroux) são a única pista recorrente. Mas Leo não sabe bem se eles podem ajudar de verdade...

O próprio Skarsgård explica que Leo se envolveu de alguma forma em um acidente quando era criança, e que isso marcou e moldou sua vida e suas escolhas para o futuro. “Ele é um ex-Amish, então vive uma vida meio MONÁSTICA, não tem celular e nada disso. Ele saiu da comunidade, mas ainda meio que segue as regras”.

Duncan Jones conta que, portanto, Mute é a reunião de tudo que o fascina, enquanto contador de histórias: noir, ficção científica e pessoas únicas (aka estranhas, o que é sempre muito legal) metidas em problemas por causa de quem e o que elas são. “Estou empolgado por poder retornar à Berlim para as filmagens, um lugar no qual vivi uma boa parte da minha vida”.

Importante lembrar que o que ele chama de retorno à Berlim faz a gente relembrar um dos mais vibrantes momentos da carreira de seu pai genial (David Bowie, alguém?) – que, entre os anos de 1977 e 1979, morava na cidade alemã e de lá lançou a trinca de discos conhecida como “Trilogia de Berlim”, que contou com a preciosa colaboração de Brian Eno. Estamos falando dos álbuns Low (1977), Heroes (1977) e Lodger (1979), com sua sonoridade experimental, inspirada pelos pioneiros do Kraftwerk e pela cena do chamado krautrock de grupos como Tangerine Dream, Faust, Amon Düül II e Can.

Mute é a reunião de tudo que o fascina, enquanto contador de histórias: noir, ficção científica e pessoas únicas metidas em problemas por causa de quem e o que elas são

A versão final do roteiro do filme, escrita por Jones em parceria com Michael Robert Johnson (Sherlock Holmes), tem pelo menos uma confirmação importante: algum tipo de conexão entre Lunar e Mute. Ambos seriam, de alguma maneira, ambientados no tal Mooniverse, conforme o próprio diretor já batizou, em tom de brincadeira. Mas ele não se refere a Mute como continuação direta do filme anterior, de 2009, mas sim como uma espécie de “sequência espiritual”.

Existe inclusive uma conversa sobre Sam Rockwell fazer uma participação especial no filme. Mas... será que ele vai interpretar o mesmo Sam Bell, o astronauta de Lunar? E qual será o tamanho desta participação especial?

As teorias começaram a pipocar: há quem diga que Rockwell pode aparecer como o jovem clone de Bell que, ao final de Lunar, foge e vem pra Terra, derrubando as ações da Lunar Industries. Outros arriscam que podemos ver justamente o destino de alguns de seus clones restantes, abandonados na Lua. E há até quem acredite que veremos pela primeira vez o Sam Bell DE VERDADE.

Aliás, se você reparar em uma das fotos já liberadas de Mute, aquela que está lá em cima, é possível ver a hashtag #FreeThe156, que é o mesmo número da quantidade de cópias do astronauta deixadas para trás...

Em entrevista ao Nerdist, Duncan confirma ainda que a coisa não vai se encerrar em Lunar e Mute – e que teremos, portanto, uma trilogia improvável. O terceiro filme, ainda sem nome, também teria enfrentado suas dificuldades para sair do papel com a resistência de produtores e afins. Mas não teve muito a ver com grana... “É uma ficção científica com uma mulher como protagonista. Há cerca de quatro ou cinco anos, tava difícil realizar por conta disso, mas acho que hoje tem uma predisposição maior no mundo para rolar”. Só que ele já deixa claro que a pegada da história deve ser diferente dos anteriores “Mas não posso falar mais do que isso agora”.

Já em conversa com o Bleeding Cool, Duncan explicou um pouco sobre como os três filmes devem se conectar. “Eles existem no mesmo universo e cada um vai se meter um pouquinho na história dos outros. Mas é só um pequeno link entre eles. Então, em Mute e no outro filme, você vai saber um pouco mais sobre o que aconteceu em Lunar”. E completa: “definitivamente, você vai ver este mundo se expandindo”.

O recado de Duncan, pra fechar, é bastante claro: “mal posso esperar para finalizar este filme estranho, que creio que as pessoas vão amar ou odiar”. E, como sempre deveria ser, ele finaliza: “E eu não me importo com o lado que elas vão escolher”.

Tá certo.