Ou “o efeito que a cultura pop e as artes têm no psicológico do jovem do século XXI”
Existe uma grande chance de você ter assistido a 500 Dias com Ela, originalmente chamado 500 Days of Summer. Ele tem esse nome por mostrar os tais 500 dias desde que um jovem conhece a tal Summer até o momento em que desencana dela. O filme é dirigido pelo Marc Webb e estrelado por Joseph Gordon-Levitt e Zooey Deschanel. O filme é legal, bonitinho, mas foi extremamente hypado.
A meninadinha “descobriu” Gordon-Levitt antes dele trabalhar em A Origem e ser o Robin (FUCK SPOILERS), apesar de já ter uma carreira consideravelmente sólida antes do filme (ASSISTAM BRICK! É FODA! E acessem o projeto de “arte” do cara, o HitRecord. É bem legal).
Assim como o filme, a Zooey Deschannel também se tornou hypadinha, ao ponto de muita gente começar a virar a cara pra moça. “Ui, ela é sem sal”. VAI SE FODER! Ainda a chamaria de minha linda numa segunda-feira nublada.
O ponto principal é que o filme apresenta o efeito que essa mina tem em um cara “bonzinho”. Grande parte das pessoas (inclusive eu) que assistiram ao filme, inicialmente, tinham apenas uma coisa em mente: A Summer é uma vadia!
Não vadia no sentido “deu pra geral enquanto tava com ele”, mas sim uma pessoa que não está nem aí pros outros, pensando só nela mesma. Uma puta lóqui. Ela destrói com o cara sem um motivo aparente. O Tom só a amava e foi destruído em retorno.
Aquela cena do “Expectativa/Realidade” é uma das coisas mais reais que eu já vi num filme e, mesmo você não gostando do longa, deve concordar que aquilo é perfeito. Todo mundo já passou por algo parecido.
Por um bom tempo, eu concordei com tudo isso. “Foda-se a Summer, aquela vadia do caralho”. Pensava assim por me identificar até demais com o personagem principal. Do tipo de pensar e agir parecido, de passar por situações parecidas. Infelizmente, não herdei o equipamento de um milionário doente que lutava contra o crime e me tornei o Robin.
AINDA.
Então, recentemente eu resolvi assistir ao filme novamente. Tava sem fazer nada e achei que seria uma boa ideia. “Tá na bad, mimimi”, mas não. Eu só gosto do filme. Acho maneiro. Foi aí que eu percebi, ao término do longa, que na verdade a Summer não é uma vadia. Ela foi só sincera. Meio sem tato, mas sincera.
Logo no começo do filme, através de uma narração, é contada a história do Tom e da Summer. Ela, desde pequena, nunca conseguiu se apegar muito às coisas, nem mesmo àquelas que ela realmente gostava. Tom, por outro lado, graças a uma interpretação cagada da história do filme A Primeira Noite de Um Homem e músicas pop, tem uma visão deturpada do que é o amor. Basicamente, ele é um romântico. Por causa disso, a chance dele se apaixonar por alguém com certa facilidade e ver naquela pessoa a resposta pra tudo era enorme.
Quando ele conhece a mina, logicamente se apaixona por ela, já que ambos compartilham vários gostos de merda que ele tinha e acredita que ela é o amor da sua vida. Do outro lado, ela não acredita em porra nenhuma de amor e quer apenas curtir, se importando com isso mais pra frente.
Tom tem três wake up calls durante a história. A primeira, quando a própria Summer fala “Não sei o que é esse negócio que você chama de amor”, o que ele responde com “Você vai saber quando sentir”; quando a irmã fala pra ele que só porque uma mina gosta das mesmas merdas que ele isso significa que ela é a sua alma gêmea; e quando, depois de uma briga, ela conta sobre seus ex e como eles não significaram grande coisa pra ela, apesar de lembrar deles sem ódio.
Ela, em momento algum, esconde que tá ali pela farra. Acha o cara legal, quer ficar com ele e fica. Nada além disso. Sem imaginar um futuro, como constituir família, ter uma casa bonitinha e envelhecer juntos. Apenas curtir.
Pensando nisso, comecei a analisar as atitudes do maluco (e até as minhas) e cheguei à conclusão de que ele é um iludido do caralho. Alguma parte do cérebro dele é tão fodida que ele não consegue imaginar um cenário em que, se acabar gostando de alguém que tem os mesmos gostos, os dois não estão destinados a passar a eternidade juntos. Tudo o que acontece de “ruim” com ele é resultado dessa mentalidade. Ele não é maduro o suficiente pra entender que pessoas são diferentes e não existe uma fórmula especial pra fazer tudo dar certo.
Depois dos vários avisos que teve, a mente dele deveria tê-lo preparado pra uma possível desilusão, fazendo com que ele começasse a aproveitar o tempo que passou com a mina. Basicamente, a mina queria ficar com ele, fazer algum sexo no chuveiro e, quando não tivesse mais se sentindo tão bem com tudo aquilo, ir embora. Bola pra frente, merda acontece.
Só que a cabeça dele não consegue entender o porque disso tudo, principalmente quando descobre que ela iria se casar e, tudo aquilo que disse que era contra e fez com que o deixasse, se tornou realidade. Ela descobriu o que era amar, só não foi com ele.
Paciência! Não precisa achar que tua vida não faz mais sentido.
500 Dias Com Ela é de fato uma história sobre amor. De como ele pode ser grandioso, mas não correspondido. De como ele pode surgir do mais absoluto nada, fazendo com que a sua vida faça sentido e mude a sua percepção das coisas. Não sobre um cara que tomou um tombo por ter se apaixonado por uma mina que não queria nada sério com ele.
Agora, vamos ao ponto e motivo disso tudo. Durante anos, jovens que não são considerados “populares” acabam se encontrando em obras criadas por outros para exteriorizar seus demônios e sentimentos. Por causa disso, talvez uma música ou um filme que mostre alguém como você é ou que ponha em palavras e acordes aquilo que você está sentindo, forma uma ligação com a sua psique.
Vê aquele filme que o cara é como você, age parecido, encontra uma menina, sofre, mas, no final, supera todos os obstáculos possíveis e consegue ser feliz. Você quer aquilo e pensa que apenas sendo verdadeiro ao seu eu, conseguirá tudo o que deseja. As músicas podem colocar poesia naquilo que você sente, por mais que seja alegria ou sofrimento. Deixa de ser uma coisa feia, triste, pra ser algo digno.
A indústria do entretenimento vê nisso tudo uma possibilidade de ganhar dinheiro e, por isso, investe nesse tipo de história. No passado, durante uma temporada perdida do PoOOoOooODCAST!, nós falamos sobre a “venda da ilusão” quando o assunto era Transformers e o Shia LeBeouf pegando a Megan Fox.
Um moleque gago e falido como ele NUNCA pegaria uma gostosa daquelas, mas no filme ele consegue. Agora, calcule o efeito na mente de um jovem que tá absorvendo tudo o que vê de um filme em que, por mais JACU que o personagem principal seja, ele ainda consegue a garota. Ouvir músicas que traduzem tudo aquilo que ele sente, mas não consegue colocar pra fora, romantizando coisas que não precisava ser romantizado.
Tudo isso colabora pro cara se tornar propenso a ser mais um “Tom”. Um cara que poderia encontrar alguém legal, que conseguiria o fazer feliz caso ele fosse mais “normal”, mas que fica tão fixado no padrão “amor perfeito”, fixados na sua mente durante anos de exposição à cultura pop, que o único resultado possível é acabar tomando no cu.
E isso não é uma exclusividade dos homens. Pense em meninas que cresceram com os desenhos das Disney, com as suas princesas e príncipes encantados, comédias românticas com personagens principais cheias de manias, mas que encontram um homem bonito e que as aceitem mesmo elas passando a impressão de serem insuportáveis caso vivessem no mundo real.
Tudo isso contribui para que tanto homens quanto mulheres tenham uma percepção completamente torta sobre como lidar com o sexo oposto e sobre relacionamentos. Enquanto um lado espera mulheres que os aceitem EXATAMENTE da maneira que eles são, gostando das mesmas coisas (e provavelmente sendo INCRÍVEIS na cama), o outro espera um príncipe encantado ou o homem mais maravilhoso do mundo, detentor apenas de virtudes e sem nenhum defeito.
Isso faz com que todo mundo crie expectativas e arquétipos da “pessoa perfeita” que NUNCA serão alcançados, deixando todo mundo infeliz como se o mundo fosse acabar a cada desilusão amorosa. Isso, claro, até aparecer uma nova possibilidade de uma criatura se encaixar naquele molde cretino que você criou. No final das contas, ninguém consegue ser feliz, porque você acredita que a pessoa deve te amar pelo simples fato de “POR QUE CARALHOS ELA NÃO ME AMARIA? EU A AMO!”, e a pessoa em questão perde o interesse pelo simples fato que, hey, pessoas mudam. Você nem sempre tem o que quer. A vida é assim, se acostume.
O que eu quero dizer com tudo isso é que sempre existem dois lados da mesma história. No caso do filme, o cara é incrivelmente iludido, acreditando num relacionamento perfeito, ignorando vários pontos que mostram que as coisas não são bem assim, enquanto a mina só foi sincera. O único momento em que você pode falar “Porra, que filha da puta!” é quando ela não avisa que tá noiva e chama o cara pra festa. Só ali. De resto, ela coloca todas as suas cartas na mesa no início. O errado foi ele que não soube lidar com isso.
Nenhum dos dois eram pessoas ruins, querendo se aproveitar um do outro. Ele só tinha uma expectativa maior do que aquilo tudo poderia dar, enquanto ela, desde o começo, explicou o que queria.
Tudo por causa de uma percepção errada sobre relacionamentos, graças a anos de criação com músicas melosas e filmes que o fizeram crer que apenas amar alguém e ter alguns interesses em comum é o suficiente. Não adiantar chamar uma mulher de vadia (ou um cara de cachorro) pelo simples fato que ela (ou ele) não gosta tanto de você. Isso é ridículo, você não é um precioso floco de neve que todos devem adorar. Se tudo está bem agora, não acredite que o seu relacionamento será eterno porque você viu um filme em que o cara parecido contigo foi feliz até morrer. Pessoas mudam, sentimentos mudam. Aproveite o agora, seja ele durando um dia ou uma vida.
Se uma “Summer” te deixou, arrumou outro e está feliz, fique feliz por ela. Em algum momento ela te fez feliz, não foi? Então por que o ódio?* É só esperar aparecer a tua Autumn que tudo passa. :)
* A não ser que ela tenha te corneado ou matado seu bicho de estimação. Aí ela que se foda.