Uma das maiores franquias infantis da cultura pop já se ligou e resolveu se mudar pras internets
Cut the cord. Em bom português, “cortar o cabo”, aquele, que alguém puxa lá da rua, faz uns furos na parede da sua casa e conecta um receptor. Ou, numa tradução que talvez seja mais adequada: “cortar os laços”. Porque não é só deixar de pagar uma assinatura de TV. É o ato de mudar o relacionamento com o consumo de mídia. De se relacionar deixando a TV, o rádio, o cinema de lado e criando seus próprios hábitos, seus próprios horários, sua própria programação.
Cut the cord. Justamente o motivo que nos deu, vejam vocês, o porta-voz da franquia Vila Sésamo no Brasil, João Amorim, para o motivo de existir a nova iniciativa da marca no Brasil: um canal exclusivo no YouTube. “Acreditamos que faz sentido, pois hoje a primeira tela já não é necessariamente a TV. As crianças estão indo direto para plataformas como YouTube, Netflix e PlayKids para assistirem ao que querem e quando querem”.
Vila Sésamo, caso você não seja seu pai ou seu avó, surgiu inicialmente como um programa de TV, lá em 1969, com bonecos icônicos criados pela oficina de Jim Henson (o mesmo dos Muppets) pra ajudar no processo de alfabetização infantil, como Elmo, Garibaldo, Grover e o sensacional COME-COME (que você provavelmente conhece como Cookie Monster). Ou seja: não deixa de ser curioso perceber que uma das mais antigas e LONGEVAS marcas de entretenimento infantil no planeta – representada pela Sesame Workshop, organização educacional sem fins lucrativos que atua em mais de 150 países – tenha entendido que as coisas estão diferentes, enquanto tantas outras ainda dão murro em ponta de faca e tentam lutar contra isso. ;)
Lançado no Dia das Crianças, o canal é semanalmente abastecido com três vídeos da série O Mundo de Elmo, focada na molecada de 2 a 5 anos e que chegou a ter alguns poucos episódios lançados em DVD por aqui. Acompanhado pelo atrapalhado Senhor Nunes e sua peixinha dourada Dorothy, Elmo interage com crianças de verdade enquanto ensina noções de matemática, ciências e línguas, além de desafiar preconceitos (focando em ciência para meninas e em personagens deficientes, por exemplo) e mostrar diferentes tipos de famílias.
Entre 1972 e 1977, a Vila Sésamo clássica teve uma versão inteiramente produzida no Brasil – primeiro numa parceria entre a Globo e a TV Cultura e, logo depois, inteiramente a cargo da emissora carioca. Com canções compostas pelos irmãos Marcos e Paulo Sérgio Valle, a série nacionalizada trazia a participação de atores globais como Armando Bógus, Aracy Balabanian, Flávio Migliaccio, Milton Gonçalves e Sônia Braga.
A última co-produção da Vila Sésamo por aqui foi com a TV Cultura em 2007. “Claro que ainda rolam reprises desse material tanto na TV Cultura quanto na TV Rá-Tim-Bum. Mas agora temos a intenção de voltar com força para o Brasil”, afirmou Amorim. O projeto planejado para o nosso país inclui jogos, videoclipes e até uma série de animação, que está sendo produzida nacionalmente. A ideia é que sejam duas temporadas, com cerca de 26 episódios. “No máximo entre o final de 2016 e o começo de 2017 estará no ar. Só não posso revelar em qual canal ainda”. Mas ele deixa claro que não tem uma favorita na jogada, por enquanto. “Estamos tendo conversas com todos os maiores canais de TV com programação infantil no Brasil”.
A TV Cultura, claro, é uma opção, afinal só ela e o SBT têm investido em programas para crianças quando se fala em TV aberta. Mas os canais infantis de TV por assinatura têm sido aqueles que mais investem em produções nacionais. Em 2009, o Discovery Kids chegou a exibir 3,2,1, Vamos!, produção da Sesame Workshop especificamente para a América Latina apresentada pela a fada Abby Cadabby e que mostrava segmentos como As Viagens de Grover (cujo objetivo era mostrar como era a vida de crianças nas mais diferentes culturas em todo o mundo) e As Grandes Aventuras de Ênio e Beto (primeira iniciativa do grupo com animação em stop-motion).
“Estamos estudando diversas opções para diferentes conteúdos que temos”, afirma João, no entanto, deixando claro que o streaming também está na sua mira. “Netflix é uma possibilidade com certeza”.
Nos EUA, a Vila Sésamo está saindo da TV aberta e indo para a HBO – e o executivo afirma que todo mundo lá dentro tem avaliado esta parceria como sendo bastante positiva para o futuro. “Isso é algo que vai possibilitar a criação de mais conteúdo novo do que o que estávamos produzindo. Inclusive séries novas para um público um pouco mais velho”. Se seus primos Caco*, Piggy e afins são agora as estrelas de uma série para um outro tipo de público, será que Elmo, Garibaldo e companhia poderiam seguir o mesmo caminho? Calma, calma. Não vamos nos empolgar tanto. “Estamos estudando a possibilidade de criar novos programas voltados para crianças um pouco mais velhas. Sempre focamos na idade pré-escolar, mas agora queremos expandir para crianças um pouco maiores também”. Ou seja: ainda crianças, OK? ;)
Basicamente, a ideia lá fora é que a HBO tenha a primeira janela, mas que a PBS (que sempre exibiu a Vila Sésamo) continue com direito de exibir o programa, só que mais para frente. “Para o Brasil, essa parceria com a HBO é muito boa, pois a Sesame Workshop manterá os direitos internacionais desse novo conteúdo, que poderá ser disponibilizado aqui em outros canais”.
Atualmente, a marca tem sido bastante associada a projetos sociais no Brasil. “No momento, temos o projeto Sonhar, Planejar, Alcançar de educação financeira para famílias que está em curso em São Paulo, Recife e Belo Horizonte, mas deve ir para pelo menos 8 capitais até 2017”, conta João. “Para esse programa, que ocorre simultaneamente em quatro países (Brasil, China, Índia e México), temos atividades em escolas da rede pública, mas estamos também produzindo uma série em animação 2D com os personagens da Vila”. Além disso, também está em atividade o projeto Vivendo Juntos, cujo objetivo é a prevenção contra a violência doméstica no Complexo da Maré, no Rio de Janeiro.
“A Sesame é uma organização que tem em seu DNA a vocação de ajudar as crianças desfavorecidas ao redor do mundo. Tanto que a missão da empresa é ajudar as nossas crianças a crescerem mais espertas, fortes e saudáveis”, finaliza.
* Vai ser Caco para sempre e sempre.