Afinal, não é preciso empunhar um sabre de luz para levar a filosofia Jedi em frente…
Assim como acontece com a maior parte dos times tradicionais de futebol, que tem seus torcedores-símbolo, o gerente de TI Fernando Netto, 34 anos, é daqueles caras que dá para se dizer que é uma espécie de “fã-símbolo” para a incansável comunidade de devotos da saga espacial criada por George Lucas. Fã das antigas de Star Wars, ele atende por um apelido sintomático, que o faz ser reconhecido nos mais diferentes eventos e convenções: Jedi Master. A relação com o universo da linhagem dos Skywalker lhe é tão familiar que ele simplesmente não consegue se lembrar do momento em que aconteceu o clique, em que foi definitivamente conquistado por esta criação.
“Nasci em 1980 e sou do interior de São Paulo, portanto não tive a oportunidade de assistir no cinema”, revela ele, contando ainda que, no entanto, assim que passou na TV, já sabia do que se tratava. “É como se não houvesse uma primeira memória de Star Wars. Como se isso já existisse em mim”. Falando de Star Wars sempre em tom emocional, ele confessa que não consegue explicar os motivos de sua paixão. “Seria como pedir para um pai explicar porque ama seu filho. Ele simplesmente ama. Não se enumera algo assim”.
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Mas não dá para definir como nada diferente de amor, isso é fato. Dono de uma coleção que inclui praticamente dez exemplares de cada um dos seis filmes lançados até o momento (nos formatos VHS, DVD, Laser Disc, Blu-ray… “só não tenho em Super-8”, brinca), além de estatuetas, bustos e principalmente memorabilias raras (“Prefiro ter um saco de bala japonês que saiu com tema de Star Wars do que uma coleção de action figures que todo mundo tem”), ele chegou a comprar de uma vez só rigorosamente todos os bonequinhos da franquia que vinham como brindes nos lanches infantis da rede de fast food Burger King (“Ah, me dá qualquer lanche, eu quero só os brinquedos mesmo”). Os lanches acabaram sendo convertidos em vales que foram entregues para crianças de rua que ficam nas imediações do shopping.
No caso da carioca Priscila Queiroz, as primeiras sementes foram plantadas na infância, quando ela via o filme na TV e acabava encenando lutas de sabre de luz com o irmão, usando cabos de vassoura. Mas o grande mergulho viria em 1998, quando comprou a caixa de VHS das edições especiais – e a loja especializada fez um combo com a trilogia de livros Herdeiros do Império, do autor Timothy Zahn. “Comprei em janeiro daquele ano, e durante as férias, devorei os livros e assisti a trilogia em loop, todos os dias. Minha mãe já não aguentava mais. Acho que a combinação trilogia clássica + novas histórias com os personagens queridos fez alguma coisa clicar no meu cérebro e eu nunca mais fui a mesma”. Logo ela se tornaria membro integrante e bastante ativo do Conselho Jedi, um fã-clube com capítulos regionais atuantes na realização das chamadas Jedicons, eventos dedicados aos fãs de Star Wars realizados anualmente.
“Na época que eu entrei para o Conselho, a família não entendeu muito”, conta Priscila. “Era época de vestibular e eu não queria estudar física, queria ouvir e ler sobre a trilha sonora de SW. Foi uma mudança na minha vida, porque eu sempre fui meio bicho do mato, ficava muito em casa, e agora eu queria sair o tempo todo para ir aos encontros do Conselho, ao cinema com o pessoal, ao barzinho para falar de filmes”. Não demorou até eles entendessem o que estava acontecendo, vendo o quão envolvida ela estava, e começaram a aceitar. “Minha mãe é meio nerd, sempre gostou dos filmes também, hoje participa dos eventos e conhece todo mundo do Conselho. Ela até ajudou na bilheteria da primeira JediCon no Rio”, diz Priscila.
Em 2010, ela passou por uma situação mais do que inusitada. Pairava no ar a dúvida se ela iria ou não à Star Wars Celebration, na Califórnia, um dos mais consagrados eventos de fãs no mundo. “Tinha acabado de mudar de área no trabalho, era uma grana para ir, a dúvida pairava. Eles confirmaram Mark Hamill, a vontade de ir aumentou, mas ainda fiquei balançada. Quando confirmaram George Lucas, coisa de um mês antes, aí não deu: avisei no trabalho, peguei uma passagem com milhas daquelas Miami via Resende e fui, resolvi tudo duas semanas antes de embarcar”. Para poder ver Lucas, ela e uma amiga passaram a noite na calçada do lado de fora do Centro de Convenções, dormindo num papelão e com lençóis que pegaram emprestado no hotel, para garantir lugar dentro do auditório onde o Lucas estaria. “Eu não tinha viajado do Brasil para deixar de ver o homem de perto, né?”, diz, rindo da lembrança.
Agora, mais velha, além de tudo isso, para ela Star Wars também é um elo com os amigos que fez através da saga, participando dos Conselhos Jedi, organizando eventos, indo a encontros. “Star Wars é amizade”, carimba. “Não consigo mais me envolver com os Conselhos Jedi como gostaria, ou organizar eventos, devido a demandas de trabalho e vida pessoal. Mas estou sempre por dentro do que está acontecendo, vou aos eventos dos Conselhos como fã, converso a respeito com os amigos, me empolgo com as novidades... O carinho e a paixão continuam”.
Outro egresso da chamada velha guarda, o paulistano Paulo Silvestre faz um tipo de fã bem diferente de Fernando e Priscila. Não é figura carimbada das Jedicons, por exemplo. Embora seja bem mais low profile, no entanto, Silvestre não deixa de ser igualmente apaixonado. O estalo, no caso dele, veio depois de assistir ao Episódio V na telona. “Tudo aquilo era uma coisa meio mágica para uma criança, muito mais que nas telinhas da época (as TVs tinham 14″, né?)! Tinha também muitos elementos que, por si só, já me magnetizavam, como o supervilão com voz cavernosa, poderoso e impiedoso, os sabres de luz, aquelas lutas quase coreografadas, e a Força, claro. A soma de tudo isso me fisgou de um jeito inescapável!”.
O resultado? Assistir ao questionável Episódio I exatas onze vezes nos cinemas. “E com o infame Jar Jar Binks”, ri ele de seu próprio destino. Hoje, já um pai de família, ele se orgulha de dizer que seus filhos estão aprendendo certas coisas, como fazer citações a partir das falas dos personagens “Motivo de orgulho máximo foi quando meu filho, quando tinha quatro anos, disse que queria ser um jedi quando crescesse. Pensei na hora: esse é o meu filho!”.
Embora não tenha filhos, a publicitária Ludimyla Russo, gravou a devoção de um jeito muito diferente. Particularmente alucinada por um certo Lord Sith que outrora foi conhecido como Anakin (“Fiquei até bem chateada quando vi que por alguma razão idiota gerou-se um frisson em cima dele”), a tatuagem que ela tem com seu impassível capacete não foi bastante. Tampouco os acessórios de cozinha que têm a sua cara. Ela se inscreveu na versão nacional do programa Pimp My Ride, da encarnação anterior da MTV Brasil. E adivinha no que a equipe liderada pelo vocalista Jimmy, da banda Matanza, fez no carro da moça? Transformou-o em uma versão particular da Estrela da Morte – só que com quatro rodas e a figura de Vader gravada no capô. Duvida?
Engana-se, todavia, quem acredita que os fãs de Star Wars se resumem àqueles que conheceram a série graças à trilogia clássica. Embora o assunto seja bastante controverso entre os fãs, uma safra mais atual de maníacos pintou a partir do Episódio 1, que então lhes serviu de porta de entrada para o restante do universo.
Foi o que aconteceu com o santista Victor Cabral Ferreira. Por mais que tenha visto O Retorno de Jedi no cinema, foi só em 2002 que mergulhou de cabeça na mirabolante criação de George Lucas, graças ao hype causado pelos novos capítulos. Conheceu o que, segundo ele, são histórias mais profundas do que apenas “duelos de sabres ou batalhas espaciais” – e, depois de subir a serra e se envolver com o Conselho Jedi de São Paulo, começou a se envolver com encontros mensais e listas de discussão. “Hoje, participo de vários clubes oficiais e conduzo um posto avançado do CJSP na Baixada Santista, que reúne outros tantos amantes de Star Wars aqui da região”, revela, confessando ainda que “hoje não consigo mais diferenciar loucura de algo normal relacionado a Star Wars”.
Logo começou a coleção (“Os filmes são a base de tudo – mas as prateleiras, os armários e as paredes de casa conseguem contar até os detalhes que passam desapercebidos nos filmes”, diverte-se) e o gosto pelos cosplays. “Já andei de metrô vestido de Darth Vader, já incorporei o General Grievous – com uma estrutura pesando quase 50kg e por mais de 4 horas em uma Jedicon”, fala, com uma pitada de orgulho.
Foi também o caso de Olivio Farias, que na época em que A Ameaça Fantasma chegou aos cinemas estava com 15/16 anos. Não demorou para que ele mergulhasse de cabeça e gastasse o primeiro salário de sua vida profissional em um sabre de luz que custou R$ 750,00. “Eu digo pra amigos e familiares que respiro Star Wars. Então, Star Wars passou a ser meu passatempo e quase que uma religião pra mim”, conta. Ele não tem qualquer problema em afirmou que, em alguns pontos, a saga ajudou em momentos difíceis de sua vida. “Pode parecer brincadeira mas, em momentos de raiva que já passei em broncas familiares, os dizeres ‘Paciência Jovem Jedi’ citados por Obi-Wan e a citação do Yoda ‘O medo é o caminho para o lado negro. O medo leva a raiva, a raiva leva ao ódio, o ódio leva ao sofrimento’, me ajudaram a não fazer besteiras”.
Mas se você acredita que os fãs mais hardcore, os verdadeiros herdeiros Jedi de Lucas, soltaram fogos assim que a empresa do Mickey Mouse anunciou que estava colocando a Lucasfilm no bolso e iria lançar uma nova trilogia, se engana. A grande preocupação foi com a infantilização da trama. “Cara, eu só pedi ao espírito de Qui-Gon Jinn que não permita que eles parem a ação para cantar e dançar!”, brinca Paulo. No entanto, Priscila conta que, passado o momento inicial de “não, deixem Star Wars em paz”, pensou no assunto com a cabeça fria e aprovou a ideia. “Os caras entendem de administrar marcas de entretenimento com sucesso, olha o Mickey aí que não me deixa mentir”. Para ela, esta é uma boa chance de expandir a galáxia, de contar histórias secundárias interessantes, com uma escala que a Lucasfilm não conseguiria sozinha. “Ainda quero ver uma série do Rogue Squadron!”, diz, esperando que os deuses de Hollywood possam ouvi-la.
Priscila conta ainda que relaxou assim que descobriu que o diretor seria J.J. Abrams. “Ele é fã, ele entende quem é fã, ele curtiu a trilogia clássica como eu curti, e eu acho que ele fará um bom trabalho”, opina. Paulo também acha que o cineasta não será capaz de nenhuma barbaridade, principalmente depois de declarar, nos extras dos discos do seu primeiro Star Trek, que “aprendeu a fazer Star Trek assistindo a Star Wars”. Para ele, tudo que importa é que Abrams mantenha a essência do que é a saga.
Mas, afinal, que essência seria esta? “Star Wars dá tão certo porque o Lucas fez muito bem a lição de criar uma história cheia de arquétipos, que falam de uma maneira muito forte com qualquer pessoa. Aquela história da luta do bem contra o mal, do heroísmo puro e desinteressado (mesmo em um contrabandista espacial), da princesa meiga e forte ao mesmo tempo, do mal devastador e sem regras... Só de conseguir mesclar tudo isso em uma história com começo, meio e fim já é um feito!”, ensina Paulo. Para Ludimyla, o uso da Força acaba sendo o coração central da história: “É uma coisa maluca: se você tem um super auto-controle e se priva de coisas ‘mundanas’ você é um Jedi e ‘do bem’ mas, se você se libertar e sentir com toda a força do coração você é um Sith e ‘do mal’. Por que ser passional é uma coisa ruim? Esse tipo de conflito é o que me fascina”.
Para o über fã Fernando, Star Wars é como se fosse um “familiar do qual você gosta” – aquele que, mesmo longe, você sempre lembra. “Que algumas vezes pode te decepcionar (como no caso do infame especial de Natal), mas você releva”, brinca. “Mas que sempre terá um espaço no seu coração”.
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