Jack Sparrow já deu o que tinha que dar | JUDAO.com.br

Em Piratas do Caribe: A Vingança de Salazar, o personagem de Johnny Depp acaba sendo vítima de um esgotamento causado pelo próprio ator

Vamos admitir uma coisa aqui: desde o primeiro filme, láááá em 2003, não importa muito a batelada de participações especiais (e, rapaz, foram muitas), referências ou efeitos especiais de ponta. Em Piratas do Caribe, só o que importa de verdade é Jack Sparrow. Para o bem e para o mal. É a figura de Johnny Depp que rouba a cena, ainda que ao longo de algumas das muitas tramas paralelas ele não seja mais do que um coadjuvante. Mas é basicamente por causa dele que as pessoas vão ao cinema. Tudo é construído ao seu redor, para que ele brilhe. Os holofotes estão todos ali.

E, vejam, o expediente funcionou bastante. Pelo menos lá atrás, pelo menos naquele momento. Mas, ao perceber que a sua EMULAÇÃO de Keith Richards tinha dado resultado, Depp parece ter se acomodado e, há mais de uma década, resolveu que praticamente TODO personagem que interpreta é a porra do Jack Sparrow. Basta lembrar do vampiro Barnabas Collins, do Chapeleiro Maluco, do Willie Wonka, do libertino Rochester e até do Grindelwald, se é que é possível em menos de dois minutos de tela.

Todos “adoravelmente” excêntricos, de olhar esbugalhado e andar meio torto. Tudo no mesmo modelo Jack Sparrow. Até uma hora que, sinto muito, a gente ficou de saco cheio do cara atuando no piloto automático, naquela lamentável escola Jack Nicholson/Robert DeNiro de pagar as contas.

Aí ele volta para o papel original em Piratas do Caribe: A Vingança de Salazar e... bom, meio que já deu, né? Ninguém aguenta mais o Jack Sparrow.

Esse quinto filme tem lá seus momentos... Mas Jack Sparrow já deu o que tinha que dar.

Este quinto filme nem é de todo RUIM, sabe? Tem até seus momentos. Mas o foco está novamente em Jack Sparrow e não tem nada de novo pra ver ali. Todos os trejeitos do anti-herói, o humor físico, o jeito de falar, as olhadas, as sacadas, acaba sendo tudo mais do mesmo. São todas as cartas que ele gastou no primeiro filme e depois andou fotocopiando com o passar dos anos. É tudo óbvio, esperado, sem aquele sabor de novidade das primeiras aparições de Jack.

Pior: parece que a dupla de diretores Joachim Rønning e Espen Sandberg quer forçar Depp a roubar a cena como antes, só que ele não parece lá muito empolgado com essa missão, não...

A história, na real, meio que caga pro filme anterior, Navegando em Águas Misteriosas (2011), e serve como uma espécie de amarração da trilogia original. Henry Turner (Brenton Thwaites), filho de Will (Orlando Bloom) e Elizabeth Swann (Keira Knightley), cresceu e virou um ENCRENQUEIRO, um obcecado por encontrar o “corajoso” pirata Jack Sparrow, que lutou ao lado de seu pai um dia, para que então ambos possam sair em busca do mitológico Tridente de Poseidon, artefato místico que promete quebrar a maldição e enfim libertar Will do seu lado monstrengo submarino lá no Holandês Voador.

Só que Jack, sempre relutante, está mais uma vez na merda e não consegue – e nem quer – ajudar ninguém. Considerem ainda que o tal Salazar do título, vivido com magistral canastrice por Javier Bardem (é uma delícia quando ele não se leva a sério e se entrega à zoeira), um pirata morto-vivo que se fodeu nas mãos de um Sparrow ainda adolescente, está vindo buscá-lo, e a zona está feita.

Carina Smyth, a astrônoma interpretada por Kaya Scodelario que cruza o caminho de todo mundo, até é uma adição interessante à história, mas basta ela se encontrar com o Henry para ambos se tornarem uma cópia picareta de Will e Elizabeth nas aventuras anteriores, uma dinâmica praticamente idêntica.

Além de Bardem e da fiel tripulação de Sparrow, a começar pelo igualmente relutante Gibbs (Kevin McNally), quem vai bem demais é Geoffrey Rush, que se entrega ao exagero e, ao mesmo tempo, apresenta uma nova camada de significado ao seu Hector Barbossa, tornando-o algo diferente do velhote reclamão que morre de inveja de Jack Sparrow. Se dá pra chamar alguém de destaque por aqui, sem sombra de dúvidas é ele — e talvez o macaco que, por algo que não se pode chamar de coincidência, também se chama Jack.

E, sim, tem Paul McCartney mas... não se empolgue muito. Sua participação é total e simplesmente WHATEVER. Tá anos-luz distante das sequências em que pudemos ver Keith Richards como o papai de Jack lá atrás. Portanto, mais uma vez, como de costume, Rolling Stones > Beatles. ;)

Em entrevista ao Cinemablend, Rønning afirma que é difícil saber se este é mesmo, como se imaginava inicialmente, o último filme de Jack Sparrow. “Acho que é o começo do fim”, dispara, aos risos. Para quem assistiu com um mínimo de atenção ao final do filme e ainda aguentou esperar até a cena pós-créditos, dá pra acreditar 100% no que o cara tá dizendo. Os ganchos para que qualquer um com metade do cérebro faça um novo filme estão bem ali.

“Tudo depende de como você olha pra isso. Eu nunca aceito nada como totalmente garantido – e eu amo esta franquia. É um sonho se tornando realidade. Não sei se é o último ou se nós faremos mais dez deles. Mas eu adoraria”.

Cara, veja só. Eu adoro filmes de piratas. Adoro principalmente os dois primeiros capítulos da história destes Piratas do Caribe (o terceiro é megalomaníaco demais e o quarto... é só ruim mesmo). E sempre gostei do Jack Sparrow, mesmo depois do bode monstro que peguei do Depp por uma série de questões. Mas quando você cansa de um personagem que deveria segurar um filme inteiro nas costas, já seria complicado encarar outra sequência, o que dirá então aturar mais DEZ continuações?

Como aparentemente se tornou impossível dissociar Piratas do Caribe de Jack Sparrow, melhor continuar dando aquela olhada em outras atrações dos parques da Disney, talvez? Já teve Mansão Mal-Assombrada, Tomorrowland, vai ter Jungle Cruise com o Rock... Se é pra fazer filme baseado em atração dos parques, opção não falta. Mas, se em algum momento quiserem voltar mesmo pra Piratas do Caribe, seria bom experimentar um detox de Jack Sparrow.