Ra's Al Ghul vs. Arrow, um embate entre o real e o sobrenatural | JUDAO.com.br

Terceira temporada de Arrow tem alçado novos voos – em parte, pela mudança que o Flash trouxe a esse mundo, mas muito também pela presença de um certo líder da Liga dos Assassinos…

Um dos grandes méritos de Arrow foi justamente construir uma clara evolução de Oliver Queen. Agora, bem no meio da terceira temporada, ele está se transformando de fato em herói, questionando seus métodos e seus instintos violentos e com um grande objetivo em mente: salvar a própria cidade. O universo em torno dele também mudou bastante. De criminosos quase comuns, os vilões aos poucos foram se tornando mais quadrinísticos, principalmente com a introdução da substância chamada Mirakuru, usada por Slade Wilson (o Exterminador) para criar um exército de soldados superpoderosos ao final da segunda temporada.

E aí, pra completar, veio o Flash, super-herói com velocidade sobrenatural. Como o próprio Barry Allen diz na abertura de seu seriado, o velocista introduziu o “impossível” nesse universo. Mas não dá, do dia pra noite, pro Arqueiro Verde passar a enfrentar supervilões com poderes escalafobéticos (sim, eu usei essa palavra) como deliciosamente acontece com o Corredor Escarlate. É aí que entra um detalhe que pegaram emprestado do Batman: Ra’s Al Ghul.

A Liga dos Assassinos de Ra’s é citada desde a primeira temporada, claro. Já tínhamos conhecido inclusive a filha dele, Nyssa, mas foram os últimos episódios antes do break do midseason que não só introduziram o Sr. Ghul como revelaram que, assim como nos quadrinhos, ele caminhará na linha tênue entre o real e o irreal, o tecnológico e o místico.

Ou seja, indo por um caminho que os filmes do Christopher Nolan teimaram em não ir, quando construíram um Ra’s Al Ghul que era ~apenas mais um homem (o Liam Neeson, mas apenas um homem). Algo bem diferente dos quadrinhos. Algo bem diferente da opção pela realidade que Nolan fez nos seus bat-filmes, pelo pé no chão, pelo Batmóvel que mais parece um tanque de guerra. E uma opção na qual Arrow vinha se inspirando desde o começo da primeira temporada – mas da qual começou a fugir a partir do finalzinho da segunda.

Ra's

Ra’s Al Ghul (ou Cabeça do Demônio, numa tradução do árabe que só existe no mundo da ficção) foi introduzido nos gibis do Batman em 1971 pela dupla Dennis O’Neil e Neal Adams, que, na época, aproximavam o Homem-Morcego muito mais do lado detetive e do sombrio, fugindo do camp que havia sido visto na série de TV no final da década anterior. O vilão já surgiu descobrindo que Batman era Bruce Wayne e sequestrando o Robin – tudo para atrair a atenção do herói, a quem ele chama de Detetive, para encontrar Dick e a filha Talia, também ~desaparecida. No final, tudo não passava de um plano para descobrir se Bruce Wayne era digno de se casar com a Talia e se tornar herdeiro do próprio Ghul.

Ali começava uma relação de antagonismo e respeito entre os dois (isso se você não levar em consideração também que Ra’s é avô do filho do Batman – mas sobre esta história a gente fala depois). Por um lado, o Batman vê Ra’s como um oponente formidável, o líder da Liga dos Assassinos – uma organização terrorista internacional – que, apesar de ser um vilão, possui um forte código de ética e quer, mesmo que de uma forma doente, fazer algo pelo mundo. Já o vilão valoriza o herói, respeitando a identidade secreta e o trabalho que ele faz nas ruas de Gotham, por mais que acredite ser algo que não levará a nada.

Sob o domínio de Ra’s, a Liga dos Assassinos mistura elementos das artes marciais e tradições orientais com a tecnologia dos tempos modernos. Com o objetivo de “limpar o mundo”, o vilão recorre às mais diversas artimanhas do ecoterrorismo e da luta biológica. Nos quadrinhos dos anos 90, por exemplo, ele orquestrou um plano para jogar um grande vírus no mundo, uma variação de uma variação do Ebola chamada Legado. O objetivo? Limpeza. Só os mais fortes sobrevivem.

A pitada do irreal, do místico, está no Poço de Lázaro. Nos quadrinhos, trata-se de um fenômeno natural, que cria um poço (não diga!) com propriedades regenerativas, podendo devolver a saúde e o vigor para um moribundo (Lázaro, levanta-te e anda, lembra? Da Bíblia? Pois é...). Porém, o poço tem uma pequena grande limitação (originalmente, claro): só pode ser usado uma vez. Depois disso, é necessário encontrar um novo Poço de Lázaro e, a cada vez que for preciso, “renascer”.

Dessa forma, através dos séculos, Ra’s Al Ghul foi encontrando novos poços, estendendo a própria vida. Isso o transformou em um ser quase mitológico, alguém que conseguiu usar a vida ampliada para chegar ao máximo das capacidades físicas e mentais. Corta pra Starling City.

Contra o Arqueiro

Sim, o Ra’s Al Ghul se tornou, nos gibis, um vilão maior que as revistas do Batman, da mesma forma que o Doutor Destino ultrapassa as páginas dos gibis do Quarteto Fantástico para tornar-se um antagonista que ameaça todo o Universo Marvel. Por mais que tenha enfrentado outros heróis, Ra’s nunca foi lá muito ligado na vida do Arqueiro Verde. Mas tê-lo em Arrow é algo que se encaixa como uma luva.

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Se hoje Starling City tem o Arqueiro, é por causa da Liga dos Assassinos. Foram eles que treinaram Malcolm Merlyn, que, por sua vez, envolveu os ricos e poderosos da cidade em um plano típico da Liga para acabar com a pior parte da cidade. Foi o Merlyn que sabotou o Queen’s Gambit, o navio que naufragou e fez Oliver ir parar na tal da ilha infernal tendo em mãos apenas um livro com os nomes da escória de Starling.

A aparição de Ra’s fecha esse ciclo. Um vilão com “ética”, com preceitos, alguém para fazer com que o Arqueiro se torne melhor, saia de vez do lado vigilante e assuma as responsabilidades de ser um herói. Responsabilidades essas que o fizeram ir até Nanda Parbat, a sede da Liga, entrar em um clássico combate de espadas contra o líder da Liga dos Assassinos (os fãs da fase O’Neil/Adams do Batman deliraram, inclusive) e ~morrer.

Ra's staredown

Isso poderia ter sido o pior erro de Arrow até agora. Explico: levar o herói moribundo direto para o Poço de Lázaro, introduzir o místico neste universo assim, de supetão, poderia quebrar o clima que a série vem construindo desde o começo.

Mas não. Como vimos no episódio desta semana, Left Behind, ninguém joga o Oliver no poço. O retorno dele vai ser mais ~realista – se é assim que se pode dizer de um cara que passou um tempão sangrando num desfiladeiro e sobreviveu.

Só que negar completamente a existência do Poço de Lázaro seria também um grande erro – um erro cometido pelos filmes do Nolan. Mas em Arrow, ainda bem, não vai ser assim (sim, é exatamente isso que estamos dizendo, que o Ra’s Al Ghul de Arrow se parece bem mais com o personagem original do que a versão de Batman Begins. Chora, igreja do Nolan, rs).

“Isso não quer dizer necessariamente que vamos usá-lo”, disse o produtor Marc Guggenheim, tentando dar uma despistada no assunto do Poço, em entrevista ao ComicBook.com. “Mas eu acredito que tem uma forma de fazer isso em concordância com a série, mas eu não estou dizendo que ‘sim, vamos fazer isso’”. Bom, já tivemos a dica que o poço (ou uma nova abordagem para ele) estará presente, sim. “Já faz 67 anos que nenhum homem me desafia”, disse o Cabeça do Demônio ao Arqueiro no episódio The Climb, o último antes do midseason. É só reparar que o vilão tem cara de 40 e poucos anos, somar 1+1...

Como se não precisasse, o próprio Stephen Amell, o Arqueiro em pessoa, confirmou. “Nós veremos o Poço de Lázaro, mas não será algo que será usado em Oliver”, disse ele ao Collider.

Pelo visto, Arrow usará o famoso poço da melhor forma possível. Ou seja: no ápice da série, provavelmente num season finale, com Ra’s Al Ghul mergulhando quase morto e saindo de lá todo puto da vida. Aí, vão nos oferecer uma explicação mais científica pro Poço – uma saída, inclusive, usada nos quadrinhos. É algo que fecha o ciclo: o Arqueiro passa a enfrentar um vilão maior que a vida e a morte.

Enquanto isso, Oliver Queen fará aquilo que soube melhor fazer em toda a série até agora: se dar mal e, depois, sobreviver. Ou tentar.