Repita comigo: uma grande inovação tecnológica nem sempre significa uma grande história. | JUDAO.com.br

Uma história de ação simples que peca pela falta de um roteiro tão imersivo quanto a tecnologia que se tornou o grande ponto de venda do filme

Originalmente escrito em 1997, demorou muito tempo para Projeto Gemini chegar nas mãos de Ang Lee e sair do papel. Como tradicionalmente acontece com projetos que passam muito tempo em desenvolvimento, diversos diretores e atores tiveram seus nomes ligados ao projeto, como Clint Eastwood e Harrison Ford.

Mas, ao mesmo tempo, Projeto Gemini é a prova de que, às vezes, é melhor deixar certas histórias engavetadas

A trama de Projeto Gemini é bastante simples e bem reconhecível de histórias de ação e espionagem. Com pequenos toques de ficção científica, o enredo acompanha Henry Brogan (Will Smith), um assassino de elite que decide se aposentar após uma última missão. Mas, enquanto esperava viver sossegadamente o resto da sua vida, Henry se torna alvo do próprio governo e começa a ser perseguido por um agente misterioso, que é uma versão mais nova de si mesmo e consegue prever todos os seus movimentos.

Sendo um apanhado de outros personagens do gênero, Henry não apresenta nenhuma característica realmente interessante, se enquadrando no clássico herói cansado que está arrependido de diversas escolhas que fez, mas se encontra lutando contra uma grande força conspiratória com a ajuda de pouquíssimos aliados – também são facilmente enquadrados em sidekicks tradicionais.

Interpretada por Mary Elizabeth Winstead, Danny Zakarweski é a clássica personagem plana que acompanha o protagonista, mas tem pouquíssimo da sua própria história para oferecer — o que, pelo simples fato de não formar um casal com o protagonista, já me fez respirar aliviada. Já Baron (Benedict Wong) é o alívio cômico do trio que tem um passado com o protagonista e simplesmente não pode deixar seu amigo lidando com isso sozinho.

No lado vilanesco, Clive Owen interpreta um homem poderoso e sem escrúpulos tão clichê quanto suas motivações. Mesmo se ele não abrisse a boca, você facilmente conseguiria identificá-lo como o vilão da história e sua explicação para clonar Henry é um tanto anticlímax. Mas o ponto é que, em nenhum momento, você realmente se importa com os personagens ou com suas histórias.

Apesar de ter um enredo sobre clonagem, por exemplo, o filme apenas arranha a clássica pergunta sobre o que você faria se encontrasse uma outra versão de si. Dificilmente a história se aprofunda nas questões morais da escolha de Henry em desejar salvar sua versão mais nova, o peso na consciência por erros do passado ou questões maiores, como a escolha governamental de replicar seu melhor soldado sem sua permissão.

No filme, essa cena é com o JOVEM Will Smith :P

Com tão pouco a oferecer, Projeto Gemini é principalmente vendido como uma inovação tecnológica chamada 3D+. Essa é uma evolução da projeção a 60 quadros por segundo que tem como objetivo ampliar a experiência em 3D ao torná-la mais imersiva. Como uma sócia assídua do clube Morte ao 3D, o 3D+ é, em tese, verdadeiramente mais interessante que o recurso que estamos acostumados, mas precisa de claros aprimoramentos.

Existe uma óbvia preocupação do diretor em criar imagens inteiramente realistas, o que dá a sensação de estar vendo algo em VR. O primeiro confronto de Henry e Junior — sua versão mais nova — parece saído de um videogame. Ao alinhar sua câmera com a ação dos personagens, Lee nos posiciona no centro da ação como participantes e não apenas como espectadores. Esse posicionamento também colabora para o filme não ter cenas de ação com coreografias limpas, o que pode ser incômodo para o público acostumado em ver cada detalhe de uma sequência de briga, por exemplo. Outro ponto é que, com a câmera tão perto da ação, não é difícil ver o flash do rosto do dublê do Smith... Mas mesmo com toda essa tecnologia, Projeto Gemini parece um filme B com efeitos especiais irregulares, como o rosto de Junior que muda de textura de cena para cena — repare que pela maior parte do tempo ele aparece no escuro.

A mudança da taxa de quadros não é exatamente uma novidade para Lee, já que ele é responsável por A Longa Caminhada de Billy Lynn, o primeiro filme a mostrar a tecnologia. Na época, a falta de um bom roteiro prejudicou a introdução da inovação tecnológica que não foi capaz de segurar uma história fraca. Agora, Lee retorna ao recurso com uma história de ação simples que também peca pela falta de um roteiro tão imersivo quanto a própria tecnologia.

Com um apanhado de clichês subutilizados, Projeto Gemini foca inteiramente na tecnologia e não se preocupa em desenvolver um enredo minimamente interessante. E, aprendam crianças, nenhuma inovação será capaz de transformar uma história ruim em algo bom.