Se queres ser tão popular, por que não se modernizar, oh Oscar? | JUDAO.com.br

Academia de Ciências e Artes Cinematográficas anunciou nessa quarta (08) uma série de mudanças na premiação a partir de 2020 com a ideia de tornar a cerimônia mais assistível, mas acabou esquecendo completamente a ideia de que é uma academia de ARTES e CIÊNCIAS CINEMATOGRÁFICAS, né?

A Academia de Ciências Cinematográficas anunciou nessa quarta-feira (08) algumas mudanças, digamos assim, interessantes para a 91a edição do Oscar, que acontece em 2020. A primeira delas e talvez menos importante é a data: a cerimônia de premiação abandonou o fim de Fevereiro e passou pro dia 09, um Domingo.

Eu disse que “talvez” seja a menos importante porque, olha só, com essa mudança a entrega da premiação deixa de ser no meio do Carnaval, fazendo com que só o Fantástico atrapalhe a transmissão pro povo da TV aberta.

Transmissão essa que, aliás, é a segunda mudança do Oscar 2020: ela passará a ser mais curta, com no máximo 3h de duração — o que fará com que alguns prêmios sejam entregues nos INTERVALOS, o que fará com que muita gente deixe de beber durante a premiação, o que provavelmente não vai atrapalhar muito os xixis. A ideia, claro, é deixar a brincadeira um pouco mais ASSISTÍVEL, sem tanta enrolação (a entrega desses Oscares [!] seria exibida depois, editada).

Mas, porém, contudo, entretanto, todavia, é justamente na tentativa mais popular de popularizar as coisas que a Academia escorregou BONITO e tá até agora catando cavaco: a criação de uma categoria para melhor filme popular (ou, em inglês, “outstanding achievement in popular film”). O QUE A FODA SERIA ISSO? “O que será necessário para eligibilidade e detalhes chaves serão definidos em breve”, informou a Academia, que ainda esclareceu que isso não impediria que o filme fosse indicado como melhor filme também, mas aí a gente tem o exemplo das animações, né?

É inegável que, quanto mais populares forem os filmes ANTES da premiação, mais assistida ela é, e isso é bom pra ABC, que transmite. Ninguém queria ver Spotlight levando um Oscar, mas todo mundo esperava Mad Max: Estrada da Fúria; todo mundo queria ver, enfim, o Leonardo DiCaprio levando o Oscar, e toda aquela pataquada entre La La Land e Moonlight (lembrando que Moonlight é MUITO mais filme que La La Land) fez com que muita gente mudasse de canal na hora.

Mas, tirando os fãs dos filmes da DC, quem em sã consciência acredita que a grande bilheteria de um filme significa sua boa qualidade? E por que um filme que teve grande bilheteria de fato não pode ser considerado um filme de qualidade boa suficiente pra concorrer na categoria de “Melhor Filme”?

Um filme é um filme, afinal. Mas... Quão se importando com o cinema a Academia está, de fato?

Porque, veja bem, há um bom tanto de coisas que poderiam ser feitas se a ideia fosse premiar outros tipos de filmes, inclusive os mais populares. Poderíamos começar pelos dublês, por exemplo, que há anos lutam para ter seu trabalho reconhecido. E nem é necessariamente uma premiação pra um dublê específico num filme, não! Bastaria premiar os coordenadores, que trabalham diretamente com os diretores e costumam ser os responsáveis pelas cenas de ação (dois deles já ganharam Oscar de Conjunto da Obra, os dois únicos).

“E de quebrar o coração porque você coloca sua vida e sangue nisso. Você tá sozinho assistindo todos os chefes de departamento lá, menos você”, disse Jack Gill, que há pelo menos 20 anos tenta fazer com que a Academia reconheça o trabalho dos dublês, em entrevista à BBC. “Todo coordenador de sucesso que eu conheço fica em casa assistindo ao seu filme ganhar um Oscar e ele não faz parte disso”

Nesse vídeo aí embaixo, o mesmo Gill afirma que nem precisaria ser um prêmio televisionado, como os tantos prêmios técnicos entregues uma semana antes. “Eu só quero estar entre os meus”.

Ainda seguindo essa linha de “coordenador de dublês”, uma premiação que poderia ser legal e popular — e já existe no SAG Awards — é a de melhor elenco, quando toda uma EQUIPE de atores faz um trabalho ótimo, ainda que nenhum tenha se destacado como um ou outro nome em algum outro filme.

Se essa categoria existisse, e se também fossem premiados os primeiros trabalhos de diretores, roteiristas e atores, só em 2018 teríamos visto Projeto Flórida ter saído com dois Carecas Pelados (uma pro elenco e outra pra Bria Vinaite, se não pudermos considerar Brooklynn Prince estreante), assim como Jordan Peele poderia ter levado um prêmia pela direção de Corra!... E por aí vai.

Ainda seria legal se outros tipo de premiação a atuações existissem — justamente aquelas em que nós não vemos a cara dos atores... Ou não vemos a cara deles EXATAMENTE. Melhor ator de voz, melhor ator de captura de movimento... Quem sabe misturar as duas de alguma maneira? Andy Serkis teria VÁRIOS...

O cinema muda o fucking tempo todo. Literalmente tem gente que, sentindo a necessidade de fazer alguma coisa inexistente, vai lá e dá seus pulos. A Academia, se tem a intenção de entregar prêmios a quem faz o melhor cinema e o melhor do cinema, precisa mudar também — antes dessa categoria de “filme popular”, a última novidade foi a categoria de Melhor Animação, o que é uma mudança bastante discutível do quão progressista foi, da mesma maneira que essa de “filme popular”. NO MÁXIMO, as animações passaram a ganhar Oscar; serem consideradas filmes bons o suficiente pra ser indicadas a “Melhor Filme”, bem...

Isso sem contar também as maneiras de consumir cinema. A Academia tá fazendo o possível pra manter os filmes do Netflix e outros serviços de streaming longe da premiação, mas... Isso não é cinema, também? Um novo tipo, é verdade. Mas... Cinema. Certo?

No fim das contas, o Oscar só reforça a sua imagem de politicagem e elitismo, que não consegue enxergar a indústria que representa — uma indústria que também já não consegue enxergar a si mesma direito, então imagina.

Vamos ver o que vai acontecer, né? Não dá pra saber ainda... Voltamos a qualquer momento com novas informações.