Já estava mais do que na hora dos suecos abrirem um pouco mais o leque do seu death metal melódico, né? O peso continua mas, ah, QUANTA DIFERENÇA!
Talvez eles soubessem disso desde o começo e fizeram de propósito. Ou, quem sabe, tenham sido proféticos a respeito das reações que seu novo álbum causaria. Tanto faz.
O fato é que o vídeo teaser todo cheio de graça que os suecos do Amon Amarth fizeram com a participação do lutador de MMA Josh Barnett pra sacanear os comentaristas profissionais de internet, por eles batizados de “keyboard warriors”, tem bastante relação com o que aconteceu assim que saiu o recém-lançado Jomsviking.
“Eles ficaram melódicos demais”, reclama um. “Onde foi parar o peso?”, questiona outro. “O problema é desta produção limpinha demais”, dispara um terceiro. “Que historinha mais merda, do cara apaixonadinho”, crava um quarto mais irônico. O feitiço virou contra o feiticeiro e os keyboard warriors realmente se voltaram contra o Amon Amarth. Mas faça como os próprios caras da banda e ligue um enorme e sonoro FODA-SE.
Afinal, Jomsviking é um PUTA disco. Talvez um dos melhores do quarteto nos últimos anos.
Mas vamos todos concordar numa coisa aqui? Sim, a produção esmerada de Andy Sneap é impecável e cristalina – só que isso apenas ajuda a dar ainda mais destaque a cada um dos instrumentos da trupe. Principalmente, combinemos aqui também, às guitarras de Olavi Mikkonen e Johan Söderberg. Que, sim, sim, estão mais melódicas do que de costume. Acendam suas tochas e corram pelo vilarejo em busca do monstro da vez a ser perseguido.
Há quem tenha comparado a sonoridade das ditas cujas (guitarras, não tochas, por favor) com a pegada de um Blind Guardian da vida, num flerte com a escola do power metal alemão, o que em teoria seria uma baita disruptura para uma banda que, em sua essência, é considerada como sendo de death metal. E daí? Jomsviking é sim um disco mais melódico e nem por isso menos poderoso, pesado, agressivo. Ainda é pra bater cabeça, pedindo a devida proteção para Odin.
O vocalista Johan Hegg continua urrando como nunca, talvez o suficiente para fazer até mesmo as forças sombrias de Helheim tremerem de medo. “Fico imaginando que este vocalista aí deve ter três testículos, pra cantar deste jeito”, li certa vez na área de comentários de um vídeo deles no YouTube e nunca mais esqueci. Só que a banda faz questão de se arriscar e ousar em território desconhecido e coloca Hegg num dueto com a voz sutil e cheia de emoção da eterna rainha do metal Doro Pesch, ao longo da belíssima A Dream That Cannot Be. E funciona? Porra, mas um bocado.
O décimo disco de estúdio do Amon Amarth é também o seu primeiro álbum conceitual – o que é uma informação que pode chocar muita gente que acompanha a carreira dos caras, já que este lance de contar jornadas épicas combina tão perfeitamente com a linguagem quase cinematográfica deles que dá pra gente pensar “uau, por que diabos eles demoraram tanto assim pra fazer uma obra que contasse uma história única ao longo de todas as suas faixas?”. Mas é claro que o tema da parada continua sendo aquele que ainda vem caracterizando o Amon Amarth desde os primórdios de sua discografia: os vikings e a rica mitologia nórdica.
O título do disco faz referência aos chamados vikings de Jomsborg, um lendário e temido grupo de mercenários. “Guerreiros brutais e mortais que lutavam por quem estivesse disposto a pagar melhor, seu código era simples: nunca demonstre que está com medo e nunca se renda. Defenda seus irmãos e, quando for convocado para isso, vingue suas mortes”, explica o próprio vocalista, em entrevista ao Blabbermouth.
“Eles servem como pano de fundo para a história de um jovem rapaz que se apaixona por uma garota mas ela infelizmente acaba se casando. Ele então mata um homem acidentalmente quando isso acontece e tem que fugir – mas jura que terá sua vingança e vai recuperá-la de volta. Ele não consegue deixar o passado para trás. Ele acha que foi enganado e sua vida foi destruída. Esta não é uma história com um final feliz”, revela.
Olha só, estamos diante de um disco CONCEITUAL – e, como tal, é inevitável que ele tenha esta levada meio trilha sonora de filme. Isso fez com que o Amon Amarth tivesse que abrir a sua paleta sonora, entende? Precisou brincar um pouco para dar diferentes atmosferas, para construir o clima de cada pedaço da jornada do personagem, fazendo com este fosse, de longe, seu lançamento mais diverso. E isso é bom pra caralho.
Raise Your Horns é daquelas músicas que tem um clima que te dá vontade de pular enquanto repete um refrão grudento que só (quem diria que, um dia, a gente poderia dizer isso de um disco do Amon Amarth). Do outro lado, temos a fúria destruidora de On a Sea of Blood, que é quase thrash metal – quem aí deu aquela lembradinha do Kreator, assim, só de leve? :)
As duas músicas, ambas destaques do disco, não poderiam ser mais diferentes entre elas. E, mesmo assim, esta coisa toda funciona e dá samba.
E eles ainda se metem, para ajudar a contar a história, a colocar diálogos falados em canções como At Dawn’s First Light e Wanderer (que lindas melodias as desta faixa, por falar nisso). Outra boa novidade no trabalho do grupo e que cria a imagem de que somos todos um bando de aprendizes da arte da guerra ouvindo atentamente enquanto um velho lutador viking conta uma história antiga de sangue e aço em torno de uma fogueira.
Jomsviking é uma aposta? Sem dúvida que é. Perigosa. Pode até ser o item da discografia dos caras que vai afastar aquele fã mais tradicionalista. Mas olha só, os discos mais recentes do Amon Amarth, temos que conversar sobre eles. Porque, em especial Surtur Rising (2011) e Deceiver of the Gods (2013) são bons, padrão de qualidade OK, mas não prezam exatamente pela criatividade. São um tanto óbvios, com variações sutis daquela mesma puta velocidade galopante. Parecem um monte de versões da mesma música.
Confesso que, para o meu lado fã, aquele que adora principalmente os álbuns With Oden on Our Side (2006) e Twilight of the Thunder God (2008), Jomsviking é uma espécie de BÁLSAMO para os ouvidos.
E que a continuação desta história, mesmo com um desfecho bastante sangrento, venha muito em breve.