O último episódio de How I Met Your Mother não foi a única decepção da série | JUDAO.com.br

Nove temporadas e 208 episódios depois, finalmente chegamos onde queríamos: sabemos como Ted Mosby conheceu a mãe de seus dois filhos. Mas isso foi o suficiente?

(Antes de começar a ler, já aviso que esse texto só fará sentido se você assistiu ou sabe o que rolou no último episódio de How I Met Your Mother, na última segunda. O final da série não tem previsão de exibição na TV brasileira ainda. Portanto, se você não acompanhou... MAJOR SPOILERS AHEAD! **Major Spoilers** o> :D)

Demorou, mas chegamos. Hoje sabemos exatamente como Ted Mosby conheceu Tracy McConnell, sua (primeira?) esposa. Sabemos como e quando foi o primeiro encontro e o primeiro beijo deles, a primeira música que ele a ouviu tocar, já vimos o momento em que ele disse o primeiro “eu te amo” para ela e acompanhamos o(s) pedido(s) de casamento. Conhecemos a casa em que viveram e os filhos que tiveram.

Tudo bem, já há algum tempo nós sabíamos o onde e o como Ted conhecia a mãe. Afinal, desde o fim da 6ª temporada – três anos atrás – sabíamos que Mosby a conheceria no casamento do Barney – e mais à frente, no final da 7ª, descobrimos que a noiva desse casamento seria a Robin.

Viemos catando farelinhos de pão por todo esse caminho, ganhando pequenas pistas em vários episódios até entendermos quem era a Mãe e o que ela estava fazendo naquela plataforma de trem em Farhampton.

E se em todas as outras temporadas já tínhamos acompanhado os desencontros de Ted e Tracy e visto fragmentos do que viria a ser o relacionamento dos dois, na 9ª tivemos a chance de conhecê-la. “a me” deixou de ser um personagem etéreo e virtual para se tornar uma mulher linda, talentosa, cativante, inteligente, engraçada, forte e completamente apaixonada pelo Ted.

E é exatamente por isso que o final dado na segunda-feira pareceu tão... amargo.

O falso “arco de crescimento” do Ted

How I Met Your Mother foi uma série sobre o Ted, seu crescimento e suas dificuldades para encontrar o amor de sua vida. Acompanhamos ele em sua jornada desde um jovem arquiteto solteiro em Nova York até que ele fosse um viúvo com filhos e um arranha-céu no currículo. Passamos por Victoria, Stella, Zoey, Blahblah (Carol!), Karen e sabe-se lá mais quantas namoradas, além de inúmeras investidas – infrutíferas – com a Robin.

Antes dos dez últimos minutos da série, o que acreditamos era que toda essa história era sobre como você só encontra o amor quando está pronto para ele. Ted só conhece a mulher perfeita quando aprende de uma vez por todas a se soltar de ilusões românticas exageradas – especialmente aquelas envolvendo a Robin. Isso inclusive se tornou a origem do que deve ter sido a cena mais CAFONA de todos os tempos:

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Ted vendo a Tracy pela primeira vez no casamento de Robin e Barney era a metáfora ideal para isso: o “destino” estava ali, avisando a ele que era hora de soltar aquele velho osso, deixar ir, se abrir para o novo. Muito diferente de quando ele conheceu, por exemplo, Victoria, em um outro casamento, para o qual ele tinha convidado – e sido recusado – pela ex-senhorita Scherbatsky.

Robin, por outro lado, mostrou virtualmente crescimento nenhum durante a série. Por mais divertida, charmosa e ~AWESOME~ que a personagem sempre tenha sido, começamos a série com Robin solteira em NY focando praticamente apenas em seu trabalho e terminamos com... Robin solteira em NY focando praticamente apenas em seu trabalho.

Não que isso tenha sido uma coisa ruim – ela se torna uma das maiores âncoras jornalísticas do mundo. Mas... não nos faz sentir que ela “mereceu” o fim com nosso herói.

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25 anos depois...

Enquanto Ted se esforça em várias oportunidades para demonstrar seus sentimentos por ela (rouba a blue french horn, contrata uma orquestra de instrumentos azuis, propõe que se mudem para a Argentina juntos, faz um arranjo gigantesco de luzes natalinas, a acolhe quando ela não tem onde morar, diz que a ama em repetidas investidas e mais milhares de vezes que vocês se lembram), Robin diz a Ted uma vez que eles deveriam estar juntos: 32 minutos antes de seu casamento com seu melhor amigo (desculpa, Marshall), no meio de uma crise nervosa por não achar que as coisas vão dar certo com seu futuro marido. Quer dizer...

Um final planejado... por tempo demais

Os criadores e principais roteiristas da série, Carter Bays e Craig Thomas, já começaram How I Met Your Mother sabendo como a série terminaria. A conversa que Ted tem com seus filhos ao final do episódio foi gravada em 2006 (é!) e Craig disse em 2008 que “nós tínhamos um plano desde o episódio-piloto e filmamos um pedaço desse plano no início da segunda temporada usando as crianças, porque sabíamos que se esperássemos até o fim da série, eles teriam envelhecido uns seis anos. Então sim, parte do nosso plano para como queremos que tudo termine já está pronto”.

Ou seja: como os próprios Luke e Penny dizem ao pai na penúltima cena da série, esta nunca foi uma história sobre Ted e Tracy. Sempre foi uma história sobre Ted e Robin – ou ao menos DEVERIA ter sido uma história sobre eles. O grande problema foi que a verdade da série acabou se distanciando disso um bom bocado.

Barney, Robin e o primeiro grande problema da nona temporada

Barney Stinson foi, dos cinco protagonistas, o que completou de forma mais contundente seu ciclo de crescimento – pelo menos de um ponto de vista narrativo.

Se Ted acaba jogando fora toda a lição que aprendeu em relação à Robin, Barney tem seu arco completo de outra forma: a história dele nunca foi sobre

Ele aprende a lidar com as mentiras contadas por sua mãe Loretta quando garoto, a aceitar as falhas de Jerry, seu pai ausente, e a colocar a felicidade de seu irmão – e de seus “bros” – num patamar tão importante quanto a dele próprio. Portanto, é seguro dizer que o noivado com Quinn e o casamento com Robin foram tentativas de estabelecer seus próprios laços familiares (e não necessariamente através de filhos, já que sua esposa era estéril). No fim, mesmo sem esposa, ele consegue isso por meio de sua filha não-planejada, Ellie (um adendo: qualquer momento que mostre o Neil Patrick Harris interagindo com crianças ganha todos os pontos possíveis, portanto, esse final já venceu apenas por isso).

A grande questão aqui, no entanto, é: antes de sabermos que Barney teria esse final feliz sozinho-mas-muito-bem-acompanhado, nós nos forçamos a torcer por Barney e Robin juntos. Aliás, nós fomos quase forçados a isso. Vez depois de vez depois de vez surgiram problemas no relacionamento dos dois e nos reafirmaram vez depois de vez depois de vez que o amor deles era mais forte do que qualquer adversidade.

HIMYM

A nona temporada é o grande exemplo: em quase todos os episódios temos uma crise entre eles que é resolvida com um longo discurso sobre sentimentos e uma bonita declaração de amor. Nos 22 episódios que cobrem dois dias e meio a sensação é de que os roteiristas tentaram de toda forma nos fazer acreditar que Swarkles (Swarley + Sparkles – esse é um apelido real usado pelo fandom de HIMYM, acreditem ou não) ia dar certo – uma ilusão que seria jogada no chão sem grandes cerimônias ou explicações nos dez primeiros minutos do episódio final.

A mãe e o 2º problema da 9ª temporada

Vimos a mãe pela primeira vez no começo de 2013. Depois de oito anos esperando que ela aparecesse, Tracy McConnell veio com suas botas e seu guarda-chuva amarelo pronta para comprar uma passagem e tocar baixo no casamento mais complicado de todos os tempos. Se você é fã da série, deve se lembrar da primeira aparição dela na season finale da 8ª temporada, com “Simple Song” do The Shins tocando e a sensação de “MEU DEUS DO CÉU É A MÃE!1!!11!11”.

Mãe

Conforme o tempo passou, conhecemos mais sobre ela: como ela teve um papel fundamental no subsequente pedido de casamento Barney-Robin e os conselhos e a franca amabilidade que ela teve para cada um dos membros da “gang” mesmo acabando de conhecê-los.

E aí, no episódio 200 (“How Your Mother Met Me”), vimos o mundo que ela habitou antes de conhecer Ted. Nos impressionamos com a força com que ela lidou com as adversidades da vida, rimos com o senso de humor e as esquisitices dela, percebemos o quão próxima deles – e de nós – ela esteve por todos esses anos e a ouvimos cantar La Vie En Rose tocando um ukulele.

Eis aí o segundo grande problema da 9ª temporada: ela nos deu a chance de nos apaixonarmos por Tracy. Não apenas Cristin Milioti a interpretou com toda a graça e carisma possíveis, a aparição da mãe deu um sopro de vida novo à série. Em uma temporada em que Marshall passou grande parte do tempo preso em uma roadtrip sem sentido, Lily se resignou a fazer apenas o papel de conselheira do Ted, Robin se ocupou de ficar nessa dança das cadeiras sem saber se queria ou não se casar com Barney enquanto Barney tentava dar provas de amor a cada cinco minutos, a presença de Tracy foi o que nos lembrou do que era How I Met Your Mother desde o princípio: leve e engraçada, mas ainda assim com um grande coração. :)

Ter uma personagem tão bem construída e viva era um trunfo na manga do programa. Um trunfo que eles jogaram fora com uma rapidíssima montagem de fotos e uma doença misteriosa (que a gente imagina que é câncer, mas vai saber, nem isso foi explicado), sem maiores detalhes.

O tempo, o terceiro e maior problema da nona temporada

HIMYM sempre foi uma série pautada pelo tempo. Contada inteirinha em flashback e construindo flashbacks dentro de flashbacks (INCEPTION!) o tempo todo. Talvez por isso a forma com que trabalharam o tempo e a dinâmica de flashbacks/flashfowards tenha sido tão decepcionante nesse final.

Passamos vinte e tantos episódios acompanhando todos os mínimos passos de todos os eventos de um fim de semana lendário – aquele em que Barney e Robin se casaram. No entanto, tivemos pouco menos de uma hora para digerir um divórcio, três bebês (os dois do Ted mais o terceiro de Lily e Marshall), a despedida d’O Apartamento, o casamento de Ted e Tracy, Robin se separando de todo mundo, Ted e Tracy se conhecendo na estação de trem, Ted terminando sua história e indo lá fazer aquilo que eu discutirei mais a fundo ali embaixo.QUE BOLOLÔ, GENTE.

Precisava esticar tanto uma coisa que no fim nem seria tão relevante assim e espremer todo o resto em tão pouco tempo? Sério, a cena de um dos tapas finais da Slap Bet durou mais do que a explicação sobre a morte da Tracy.

E isso porque nem explicaram o abacaxi (embora muita gente esteja apostando que isso seja uma das cenas exclusivas que sairão no DVD, junto com um incrível momento da Robin cantando Let’s Go To The Mall no casamento enquanto a Mãe toca baixo)!

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O grande problema do final: o timing

Antes de mais nada: sim, Ted e Robin são um casal divertido e que funciona de uma forma interessante. A segunda temporada, quando eles estão juntos, é uma das melhores. O breve momento em que eles moram juntos e resolvem fazer sexo para resolver problemas domésticos é uma das sacadas mais engraçadas da série. A dinâmica entre os dois sempre foi cheia de meandros interessantes que passavam da amizade ao amor em piscadas. Maaasss... Há algumas temporadas eles não funcionavam mais assim.

Como dito lá em cima, esse final estava planejado há MUITO tempo. Antes mesmo que imaginássemos Robin e Barney juntos, antes que Ted aprendesse todas as lições que aprendeu e passasse por tudo que passou, o plano sempre foi que Ted ficasse com “aquela garota” da gola rolê verde – um fim que teria funcionado maravilhosamente bem se tivesse acontecido há uns quatro anos.

Como sabiamente disse nosso próprio Mosby, “se você tem química, tudo que você precisa é do timing”. E o timing em que a série terminou, infelizmente, pedia um final diferente. Um que estivesse adequado a toda a jornada que se desenhou, um que não fosse engessado. Um final feliz que desse ao Ted (por mais chatonildo que ele tenha sido em tantas vezes nos últimos anos) o que ele merecia – não aquilo que ele deveria ter aprendido a deixar ir.

Uma história quando contada para crianças geralmente tem uma lição, e a que ficou de toda a saga longamente narrada por Ted Mosby – mesmo que tenha sido apenas uma sitcom – não foi uma sobre crescimento ou maturidade.

Foi a de que se você se agarrar MUITO forte a um osso, MAS MUITO FORTE MESMO, TIPO NÃO LARGUE ELE DE JEITO NENHUM EM NENHUMA CIRCUNSTÂNCIA OU HIPÓTESE MESMO QUANDO APARECER UM OSSO MELHOR E MAIS LEGAL E INTERESSANTE, não importa por quanto tempo ou por quanta coisa você passe junto ou separado desse osso, no fim, ele vai ser seu.

No fim, nunca foi uma história sobre encontrar o guarda-chuva amarelo. Sempre foi uma sobre guardar a blue french horn.