A atriz defende a velha história de separar a obra do artista em nome do “trabalho de toda uma comunidade”, mesmo que isso signifique ignorar um pouco os sentimentos de toda uma outra.
Olha… tem situação que é mesmo uma merda. Desde 2017, com a onde de exposição de abusadores de Hollywood, tem MUITA obra por aí que perdeu o sentido pra várias pessoas. Passou a não fazer muito sentido dar audiência e dinheiro por algo, mesmo que você estivesse ADORANDO tudo aquilo dois ou três meses antes. Comigo, foi o Louis C.K. Eu amava seus shows, assistia seu seriado Louie e inclusive PAGUEI pra ver Horace and Pete, uma websérie feita todinha por ele, estrelando também Steve Buscemi e Jessica Lange. Mas aí ele foi acusado de assédio. E admitiu ser verdade. E agora, depois de um tempo fora, voltou a fazer shows que são cheios de um discurso que faz pouco de identidades de gênero diferentes ou sobre sobreviventes de um tiroteio numa escola. Nem as piadas mais básicas dele me fazem rir. Algo sobre a imagem dele foi quebrada pra mim – e isso não dá pra reparar.
É JUSTAMENTE isso que Thora Birch teme. Ao podcast It Happened In Hollywood do Hollywood Reporter, a atriz, que interpretou Jane Burnham em Beleza Americana, falou sobre como achava que fãs deveriam dar uma ~relevada~ na presença de Kevin Spacey no filme, que completa 20 anos em 2019, pra não desmerecer o trabalho de TANTOS e tantos profissionais ali. “Não dá pra não pensar: ‘ah, ótimo, agora temos essa mancha no filme’”, afirmou. “Mas, não, essa mancha não deveria existir. Sabe quem é o culpado [por assédio sexual]? Kevin. Não tem nada a ver com Beleza Americana”.
Para Birch, é sempre importante lembrar que ali existiam atores menores aprendendo com grandes estrelas num filme especial.
A atriz contou que não sabia muito sobre a vida de Kevin além do que via em estúdio. Ele era alguém agradável de se conviver e, segundo ela, dividia coisas importantes sobre traumas nas sessões de terapia em grupo realizadas como forma de preparação de elenco. “É curioso ver atores alternarem de seu estado natural e uma persona mais preocupada com a imagem sempre que se sentem desprotegidos”, contou. “Era libertador pra mim. E pensava: ‘Se Kevin Spacey, o Keyser Soze [de Os Suspeitos], consegue se abrir, acho que consigo também.’
Apesar de ter ficado surpresa com os relatos de abuso sexual contra Spacey feitos em Outubro de 2017 por Anthony Rapp, ela espera de verdade que o público separe a arte da vida real. “Acho que cabe a mim, que fui parte de Beleza Americana, lembrar a todos que o longa foi feito por toda uma comunidade. Todos amamos o filme. E, no final das contas, ele não tem nada a ver com Kevin.”
...só que tem, né?
Lester, personagem de Spacey, é um homem em crise que fantasia sexualmente com a amiga de sua filha. Uma garota menor de idade. E do mesmo jeito que piadas sobre masturbação indevida de Louis C.K. passaram a ser bizarramente reais, assistir a esse tipo de ação performada por um homem que SABEMOS que tem muito daquilo nele pode ser altamente perturbador. Beleza Americana é uma obra ganhadora de Oscars, feita num momento bom e, sim, é bem boa. Ninguém pode negar a importância do filme. Mas esperar que o público dissocie os escândalos envolvendo o protagonista é TALVEZ pedir um pouco demais por enquanto. Dá pra falar sobre ressignificação, sobre um novo olhar sobre a interpretação de Kevin… mas lidar com a existência de um abusador em tela pode ser algo angustiante e tentar colocar um padrão nisso é, sem dúvidas, algo insensível.