Fase final da linha que reinventou os heróis da Casa das Ideias no começo dos anos 2000 chega provando também que boas histórias são feitas com o coração
E lá se vão quase 14 anos desde que Marvel Século 21 – Homem-Aranha #1 foi publicada no Brasil. Aquele era o fim dos tempos da Marvel na Editora Abril – foram apenas quatro edições antes que o conteúdo migrasse pra Panini e virasse Marvel Millenium – Homem-Aranha -, mas representou o começo do Universo Ultimate da Casa das Ideias em terras tupiniquins. Sim, é aquele que buscou recriar os super-heróis da editora pra uma nova geração, pra um novo público.
De lá pra cá, a linha teve seus erros e acertos. Como não lembrar do trabalho feito por Brian Michael Bendis com o Homem-Aranha? Os dois primeiros volumes de O Supremos? Ou ainda sagas mais recentes, como Dividimos, Tombaremos e Unidos, Venceremos? Mas teve partes ruins, também -– raramente alguma coisa do próprio Aranha, o terceiro volume dos Supremos, muita coisa do Quarteto Fantástico, Ultimatum...
Agora, esse Universo Ultimate está morrendo. Uma última fase, a da saideira, está sendo aberta agora no Brasil com a publicação de uma nova Ultimate Marvel #1.
É evidente que, uma hora, o esgotamento chega – principalmente porque esta não é a linha principal, então a Marvel não tem medo de tomar atitudes mais drásticas. Reed Richards é um vilão, o Wolverine está morto, aqueles Supremos de tanto sucesso não existem mais, e até o Capitão América partiu dessa pra melhor. Eventualmente alguém volta ou algo é desfeito, mas a tendência aqui é tentar manter as decisões editoriais que vieram antes – o que, numa linha com já tanto tempo de estrada, vai limitando criativamente os quadrinistas e editores.
Tanto é que esse Ultimate Marvel #1, que traz as HQs publicadas a partir do relançamento chamado All-New Marvel NOW! (ou, em PT-BR, Totalmente Nova Marvel) é da molecada e abrindo justamente com o Homem-Aranha de Miles Morales.
Essa primeira história, aliás, é uma grande homenagem ao legado do selo Ultimate, originalmente publicada nos EUA na edição especial Ultimate Spider-Man #200. Após o Cataclismo que foi a passagem de Galactus, a Tia May (com o singelo e-mail de hippiegrisalha@jotamail.com) convoca os amigos de Peter Parker para relembrar os dois anos da morte do garoto – não com tristeza, mas sim com a alegria que era tão característica dele.
Uma grande homenagem ao legado do selo Ultimate, que está saindo de circulação
E é impressionante o quanto o roteirista Brian Michael Bendis nos consegue cativar pelos convidados, uma ~turminha do barulho formada por Miles Morales, Ganke Lee, Bobby Drake, Johnny Storm, Gwen Stacy, Mary Jane, Jessica Drew, Kitty Pryde, Liz Allen, Lana Baumgartner, Kong... e até por J. Jonah Jameson, que só dá uma passada de carro pela porta da casa dos Parker, meio que envergonhado. É como se todos eles fossem seus amigos, seus brothers, colegas de escola pelos quais você tem tanto carinho.
Todo mundo ali suspirando pelo que Peter Parker poderia ter sido. Pelo futuro brilhante que um jovem (assim como tantos) deixou de ter. Tudo isso embalado pela arte do Dave Marquez, que consegue dar uma expressividade incrível pra todos aqueles personagens.
A segunda HQ entregue pela edição brasileira saiu em Miles Morales: Ultimate Spider-Man #1, que é efetivamente a abertura da última fase do Aranha no Ultiverso. E, como todo recomeço, traz Miles tentando reconstruir a vida depois do Cataclismo e da briga com o pai. Não tem sido fácil viver sozinho, apesar da ajuda do amigo Ganke, como também não tem sido fácil esconder da namorada Kate Bishop que ele é o Cabeça-de-Teia.
Pra ajudar (ou não), um grande inimigo do passado está querendo voltar... E com uma decisão polêmica do próprio Bendis tomando espaço.
Depois dessas duas grandes HQs, a revista traz a primeira história dos Novíssimos Supremos, agora formados por Manto & Adaga, Mulher-Aranha (que, no meio da aventura, troca de nome pra Viúva Negra), Kitty Pryde, Granada e, claro, o Homem-Aranha.
Apesar de ter ar de “putz, somos superpoderosos, mas não temos a mínima ideia do que fazer e estamos fodidos de grana”, que sempre rende um ou outro momento interessante, a história escrita por Michel Fiffe não funciona – falta exatamente o coração visto nas páginas anteriores. Fora que a arte de Amilcar Pinna não ajuda muito.
Fechando o gibi, chega Ultimate FF. Sim, é a versão do Ultiverso pra Fundação Futuro, que aqui surge como uma organização de pessoas mega inteligentes pra resolver “as fendas na essência da criação” causadas durante Cataclismo – algo que a SHIELD não pode fazer, porque, bom, ela não existe mais. O time principal da FF é formado por Sue Storm, Sam Wilson (o Falcão), Tony Stark (Homem de Ferro), Danny Ketch (Homem-Máquina) e sob direção de Phil Coulson.
Esse começo, escrito pelo Joshua Hale Fialkov, também não funciona muito bem. Talvez seja por tentar remexer (e resolver) uma das piores besteiras do Quarteto Fantástico Ultimate: o Senhor Destino. Sei lá, eu deixaria o Victor Van Damme pra lá...
Só que o que piora mesmo é a arte inconsistente da dupla Mario Guevara e Tom Grummett (de quem gosto muito, mas que parece estar longe dos seus melhores momentos). Os personagens não têm quase expressão, fora os erros anatômicos e outros problemas. Assim fica difícil.
Bom, o fato é que Ultimate Marvel #1 é um gibi que deve ser cancelado daqui um pouco mais de um ano, assim que o selo chegar ao fim por aqui. Depois, só mesmo o Homem-Aranha de Brian Michael Bendis continuará na ativa, agora totalmente integrado ao Universo Marvel 616, o principal.
E os motivos ficam totalmente claros pra quem ler esta edição até o final.