O músico Marcelo Moreira, da banda Almah, apresenta Marmor, projeto multimídia no qual livro, CD, sistema de RPG e quadrinhos se completam para contar uma trama ambientada inicialmente na cultura celta
Em latim, a palavra Marmor quer dizer “mármore” – mas, no caso de um ambicioso projeto brasileiro multiplataforma, ele faz referência direta ao nome do seu idealizador. Trata-se do músico Marcelo Moreira (Mar Mor, sacou? SACOU!? :D), baterista gaúcho conhecido dos fãs de rock pesado por seu trabalho com a banda Burning in Hell e, mais tarde, por ser integrante definitivo do Almah, grupo do ex-vocalista do Angra, Edu Falaschi.
O objetivo do Marmor é contar histórias de fantasia usando uma intrincada fusão de plataformas midiáticas. Basicamente, estamos falando de uma reunião de dezenas de artistas das mais diferentes vertentes para construir uma trama que começa na literatura, passa pela música, depois se torna um jogo de RPG, uma história em quadrinhos e, por fim, chega num espetáculo musical.
O primeiro ciclo, batizado de Alma Celta, vai ser centrado na cultura do povo que se espalhou pelo oeste da Europa a partir do segundo milênio antes de Cristo. O segundo ciclo, ainda sem previsão de lançamento, vai versar a respeito dos vikings e da cultura nórdica como um todo – enquanto um terceiro ciclo já está previsto, mas com o tema ainda sendo mantido em segredo.
“Eu tenho vários amigos em diversos campos da arte, música, dança, arte contemporânea, e a gente sempre conversou muito sobre este mercado atual, sobre o mundo artístico”, explica Marcelo, em um papo com o JUDÃO realizado durante a Comic Con Experience. Segundo ele, as conversas sempre giraram sobre o futuro, sobre os formatos de consumo da cultura. “A coisa do CD, a gente não sabe quanto tempo dura. Ao mesmo tempo, tem cada vez mais música em tudo que é lugar, as pessoas sempre com fones de ouvido por aí. A música é mais consumida hoje do que outrora, no carro, no metrô, no ônibus”. Neste papos, que começaram há cerca de quatro anos, os amigos artistas abordavam as dificuldades, sobre entrar neste mercado, sem a presença das gravadoras, sem editoras. “E descobrimos várias dificuldades em comum. E muitas conexões em comum – por exemplo, a dança não vive sem a música. O RPG precisa de uma boa trilha sonora. Então, pensamos, putz, vamos trabalhar juntos? Porque na verdade estas artes já estão juntas, já se cruzam, mas com as pessoas trabalhando separadamente”.
A primeira parte de Alma Celta, o livro, já está nas lojas – escrita por Eduardo Amaro (amigo pessoal de Marcelo há mais de 20 anos), com consultoria dos historiadores e especialistas em cultura celta Bellovesos Isarnos e Rowena Seneween. Na história, o mago Amergin, do povo dos milesianos, está disposto a voltar com um exército à Terra Verde (atualmente o território conhecido como Irlanda) para vingar a morte do tio. Em seu caminho, estarão os Tuatha De Danann – que não, não é a banda, mas sim uma tribo local, os filhos da deusa, formada por druidas, guerreiros, reis e rainhas de poderes lendários e fora do comum. “A trama é toda fictícia, mas completamente imersa em uma base real”, conta o músico. “A galera que curte a cultura celta é muito empolgada e especializada, por isso tivemos um cuidado a mais para tratar do assunto. Além disso, descobrimos que existe uma certa deficiência em literatura sobre cultura celta no mercado brasileiro”.
A obra vem acompanhada de um CD com dez faixas musicais, cada uma servindo como trilha sonora para cada um dos capítulos do livro. Além do próprio Marcelo na bateria, o disco conta com o vocalista Gus Monsanto (das bandas Adagio e Revolution Renaissance, projeto com Timo Tolkki), com a cantora boliviana Cláudia Barron, o guitarrista Rogério Vaz e a violinista inglesa Anna Phoebe – que já acompanhou o vocalista do Jethro Tull, Ian Anderson, o finado tecladista do Deep Purple, Jon Lord, e o conceituado projeto Trans-Siberian Orchestra, de Jon Oliva. A experiência de Anna com a TSO, aliás, foi fundamental para os próximos passos. “A Anna tem esta escola do rock com orquestra envolvida. A gente não queria que a parte orquestral fosse muito séria, muito clássica. Queríamos que tivesse um pé no rock, nas trilhas sonoras de filme”.
Alma Celta, o CD, pode ser considerado metal, pela presença do próprio Marcelo e também de nomes como Gus Monsanto? Pode ser. Mas, musicalmente, parece ser mais do que isso. “Quisemos fazer algo mais abrangente, mesmo. Ao mesmo tempo em que estamos com os pés fincados nas raízes do rock, do metal, queríamos que lembrasse as trilhas sonoras de filmes épicos. Então, em determinados momentos, as orquestrações estão muito mais presentes do que a banda. O violino aparece até mais do que a guitarra. Ficou uma mescla interessante”.
Para quem acompanha o cenário do rock pesado no Brasil, Alma Celta guarda uma inusitada surpresa. Trata-se também de um dos derradeiros registros em áudio do guitarrista Paulo Schroeber, parceiro do Marcelo no Almah e morto no começo de 2014. “Ele gravou alguns solos para mim tem algum tempo e estamos usando isso aqui. É uma espécie de tributo”.
De acordo com Marcelo Moreira, as músicas foram desenvolvidas pensando no fato de que, mais pra frente, elas teriam que fazer parte de um espetáculo, pensando nos figurinos dos personagens, nas performances, na presença real da orquestra. “O plano é fazer uma turnê”, revela. “Através de negociações com alguns investidores, queremos montar este show, que obviamente é um show bem caro. A ideia é ter figurinos no nível de Hollywood. Estamos em contato com empresas lá de fora, com artesãos, maquiadores, figurinistas. Já estamos fechados com uma empresa de cenários brasileira”, finaliza.
No entanto, o combo livro + CD (lançado pela editora Leya – “A gente só está junto com os livros de Game of Thrones, olha só”, empolga-se Marcelo) é apenas o primeiro passo. A escritora Suzy Hekamiah (do livro Código dos Mares), que é especializada em literatura fantástica, está cuidando da parte editorial do RPG neste momento e vai trabalhar a parte dos quadrinhos com uma equipe que Marcelo e cia. ainda estão selecionando. “E o detalhe é que o RPG é baseado no livro, mas tem um elo de ligação com o segundo livro, do próximo ciclo, que é este da cultura nórdica. E os quadrinhos serão diretamente baseados nas aventuras do RPG. Estamos caçando os talentos para estas próximas fases”. As datas de lançamento ainda não estão definidas.
Além de seu projeto próprio, o Marmor vai levar adiante uma espécie de “projeto paralelo”. Afinal, aconteceu recentemente uma proximidade com o escritor Affonso Solano, outro que tem seus livros lançados pela Leya. “E ele também tem um pé no metal”, diverte-se Marcelo ao revelar um lado que nem todo mundo parece conhecer. “Ele curte diversas bandas que eu também curto. E foi desta integração, e do interesse pelo formato em que saiu Alma Celta, que a gente fechou uma parceria. Vamos fazer um disco baseado no livro O Espadachim de Carvão [o primeiro da trilogia de fantasia do autor]”.