Uma banda que você precisa ouvir: Volbeat | JUDAO.com.br

Talvez uma das atrações mais obscuras da edição 2018 do Lollapalooza, o quarteto surgido na Dinamarca faz um som vigoroso e moderno, um hard rock que fala com heavy metal e hardcore — sem deixar de pagar tributo pra Elvis Presley e Johnny Cash

Geralmente, a escalação de bandas para um festival segue uma fórmula mercadológica porque, afinal de contas, o lance dos caras não é filantropia e eles querem ganhar dinheiro. Então, sempre vão querer meter aquelas bandas gigantes como headliners, ainda que elas venham ao Brasil a cada seis meses — mas, bom, se o público tá sempre topando e esgotando os ingressos a cada passagem, nada mais natural nesta fórmula de mercado que os empresários continuem apostando nos mesmos caras de sempre, né?

O legal, no entanto, é ver que ainda existe, bem ou mal, um espaço para garimpar sonoridades diferentes, vindas de CONJUNTOS que podem nunca ter passado antes pelo Brasil. E ele acaba sendo nos tais palcos secundários, coisa que rola atualmente em todo grande festival.

Então, num Lollapalooza da vida, tão lá os Red Hot Chili Peppers, o Pearl Jam, The Killers. O de sempre. Mas também tem espaço para uma pérola dinamarquesa chamada Volbeat, em sua primeiríssima passagem pelos nossos palcos, prevista pra fazer um show curto, ainda sob a luz do sol. Mas ainda que você não consiga chegar a tempo de VER a banda, seria maravilhoso que você pudesse CONHECER a banda.

E digamos que o som deles ao vivo é a melhor carta de apresentação que poderia existir.

Tudo começou lá nos primórdios dos anos 2000. O cantor/guitarrista e principal compositor do grupo, Michael Schøn Poulsen, cresceu em Ringsted, cidade que fica a cerca de 60 quilômetros da capital dinamarquesa Copenhague. Filho de uma família de classe média, o sujeito passou a infância toda ouvindo Elvis Presley, Jerry Lee Lewis, Johnny Cash e Chuck Berry, de quem seus pais eram fãs e, na adolescência, foi apresentado ao rock mais pesado de nomes tão variados quanto Metallica, Iron Maiden, Whitesnake, Deep Purple, Iced Earth e Black Sabbath. Aos 17 anos, quando se mudou para a capital, formou sua primeira banda, Dominus, mas a sonoridade desta primeira tentativa musical, rapaz, era algo MUITO diferente. Afinal, o que Poulsen cantava na época era death metal, especialmente inspirado por um rapaz de nome Chuck Schuldiner.

Mas aí que o músico então ficou meio de saco cheio desta coisa toda de metal mais extremo. E o Dominus chegou ao fim, depois de lançar quatro discos entre 1994 e 2000, com a separação de seus integrantes. Aquele foi o começo do Volbeat, o nome que Poulsen resolveu assumir pro seu novo projeto depois que começou a escrever umas paradas mais rock n’ roll clássico, de raiz. Um nome inspirado em Vol.Beat, título do terceiro disco do Dominus. E um nome que começou a fazer barulho localmente depois que a demo Beat the Meat vendeu 1.000 cópias e o selo Rebel Monster Records resolveu apostar naqueles camaradas.

A aposta parece ter sido acertadíssima, já que, depois de lançar outras duas demos, seu primeiro disco, The Strength / The Sound / The Songs, chegou às paradas dinamarquesas em 2005 em 18o lugar. O feito foi bastante representativo, já que fazia duas décadas desde que uma banda local de metal tinha conseguido adentrar o Top 20. Mas aí cabe um adendo importante: já a partir deste primeiro disco, com Michael Poulsen no papel de frontman e devidamente acompanhado por Franz Gottschalk (guitarra), Anders Kjølholm (baixo) e Jon Larsen (bateria), dá pra perceber que é injusto dizer que o Volbeat é uma banda de METAL. Ou, bom, APENAS de metal.

Para o AXS, Poulsen chegou a descrever o Volbeat como uma mistura de metal, rockabilly e country. Mas ele mesmo admite que a combinação é difícil de imaginar. “Soa esquisito assim, no papel, quando a gente escreve esta descrição. Mas ao vivo, cara, faz total sentido”, explica. “Não é como se eu sentasse e pensasse ‘ah, tenho que escrever uma música que tenha metal, country e rockabilly na mesma faixa’. É só o jeito que escrevo. Porque eu sou muito influenciado por tantos estilos que, durante uma canção, eu poderia ficar entediado se a gente seguisse do mesmo jeito que começou”.

Apesar dos riffs poderosos terem feito com que, de alguma forma, o Volbeat tenha sido “adotado” pelos cabeludos de plantão, dá pra escutar um banjo soando aqui, um refrão grudento acolá, uma levada meio rock clássico dos anos 50 nos solos... E tudo isso faz um sentido danado, carregando uma assinatura que parece ser só deles. “Meus pais ouviam muito isso e, definitivamente, dá pra escutar isso no som do Volbeat. Dá pra analisar nosso estilo e escutar esta mistura de metal das antigas e rock dos anos 50”, diz o vocalista, para a Billboard. “Da nossa terra natal, talvez a única influência que carregamos seria King Diamond e sua banda original, o Mercyful Fate”.

Poulsen faz questão de ressaltar que eles sabem que estavam contra todas as apostas assim que começaram e que ninguém queria assinar com eles. “A gente só achava que tava fazendo o que era certo pra nós. Éramos teimosos e fazíamos tudo por conta própria. Acertávamos os shows, cuidávamos do transporte, das taxas, porque não tinha dinheiro pra contratar mais gente. Não tinha tempo pra ficar bêbado todos os dias ou ficar de ressaca no dia seguinte”.

Dois anos depois, viria Rock the Rebel / Metal the Devil e a chance de abrir para Metallica e Megadeth em apresentações na região, tocando inclusive no Roskilde Festival. Mas foi só com seu terceiro álbum, Guitar Gangsters & Cadillac Blood (2008), que começaria uma bem-vinda exposição no mercado americano. Primeiro, com a abertura para o Nightwish em sua turnê na Terra do Tio Sam, em 2009. “Esta série de shows foi ótima. Acho que ninguém ali sabia muito bem quem nós éramos, mas ganhamos muitos dos fãs do Nightwish”, explica Poulsen. Pouco depois, viria a chance de ouro: cuidar da abertura dos shows do Metallica por lá, na turnê do disco Death Magnetic. E foi aí que a banda explodiu por lá. “Sair fazendo shows com a maior banda de heavy rock do mundo é o maior pacote promocional que poderíamos querer”. E foi: tanto é que, quando voltavam para apresentações solo nas cidades onde tocaram com o Metallica, eles claramente sentiram seu público crescendo. Aí, não demorou até que tivessem a chance de assinar com a Universal e fossem, finalmente, parar nas rádios.

Com seu quarto disco, Beyond Hell / Above Heaven, de 2010, viria a chance ainda maior de abrir os trabalhos para Metallica, Megadeth, Anthrax e Slayer na apresentação histórica do Big 4, em pleno Sonisphere, na Suíça. Na sequência, outra porrada, e bingo, lá estavam eles na Gigantour com Megadeth, Motörhead e Lacuna Coil. Mesmo a perda do guitarrista Thomas Bredahl, que tinha entrado algum tempo antes para substituir Gottschalk mas acabou anunciando sua saída também, abalou o quarteto. Inicialmente, quem deu uma força foi o conterrâneo Hank Shermann, lendário senhor das seis cordas no Mercyful Fate. Mas um convidado especial e produtor de seu novo disco, Outlaw Gentlemen and Shady Ladies, teve um momento tão interessante em estúdio, com uma química tão especial, que não teve outra opção a não ser convidá-lo para integrar o time: Rob Caggiano, ex-guitarrista do Anthrax.

Originalmente, Rob saiu do gigante do thrash metal para justamente se focar em seu trabalho como produtor. Teve um pouco de medo da decisão, depois de tantos anos dedicado aos palcos, mas seguiu em frente. Só que aí... “Em certo momento, eu disse pra ele ‘cara, você não devia ficar aí sentado numa sala escura, apertando botões e produzindo, você devia entrar pro Volbeat’. Ele riu porque achou que era uma piada, até que todos nos entreolhamos e eu disse: ‘se você quiser a vaga, ela é toda sua’. Era tarde da noite, ele pediu pra pensar nisso até o dia seguinte”, revela o cantor. “Aí, quando nos encontramos na manhã seguinte, eu disse ‘cê tá pronto?’ e ele mandou ‘sim, estou, vamos nessa’. Entramos no estúdio como um trio e saímos como um quarteto”.

Outlaw Gentlemen and Shady Ladies, o resultado, é até o momento o melhor e mais bem-sucedido álbum dos caras, vendendo quase 40.000 cópias na primeira semana e entrando na parada Billboard 200 em NONO lugar, a melhor posição de uma banda/artista dinamarquês dentro do Top 10 desde Aquarium, do Aqua (SÉRIO). “Ficamos muito orgulhosos de ver o que alcançamos e de perceber como disco sobreviveu até o momento. Ainda temos singles tocando nas rádios e ainda tá vendendo, meu”, comemorou Poulsen em entrevista ao Metal Insider em 2015, quase dois anos depois que o disco chegou às lojas. “Não dá pra pedir por nada diferente disso”.

O disco mais recente do Volbeat, Seal the Deal and Let’s Boogie, é de 2016, e mantém o mesmo nível de qualidade do lançamento anterior, com o mesmo tipo de entrega do líder do grupo em termos de letras bastante pessoais — a morte de seu pai, por exemplo, inspirou canções como Dead but Rising. “Tudo tem que vir do coração. Não dá pra pensar muito sobre isso. Quer dizer, você até pode... mas eu não sei como fazer isso. Não quero perder meu tempo”, conta ele. “Quero fazer algo com que me importe e acho que é o que todo mundo quer no fim do dia. Preciso sentar e escrever uma canção sobre o que sinto e me dá algum significado”.

No palco do Lolla, talvez eles repitam um pouco da performance que fizeram no icônico Coachella, em 2016. “Nós somos um bando de caipiras dinamarqueses, nunca tínhamos ouvido falar do festival”, diverte-se Poulsen. “Rob estava maluco, rindo, ‘vocês tão malucos, é um dos festivais mais importantes dos EUA!’. Mas a gente não tava muito impressionado, não conhecíamos nem o festival e nem metade das bandas que tocariam nele. Pra nós, era só mais um festival na América. Mas dava pra sacar o quão importante ele era. Tocamos e todos parecem ter gostado de nós. No fim, ficamos felizes de ter feito, embora tenha sido um dos mais estranhos nos quais tocamos”.