Uma razão para assistir à Carol | JUDAO.com.br

Um filme libertador como a imponência de sua protagonista

“Está tudo caminhando pra eu virar budista.” A risada veio espontânea, mas eu tive que engolir quase instantaneamente. O cidadão falava sério, mesmo vindo de uma ressaca monstra.

“Vou aprender Krav Maga, cara. A civilização está indo por um caminho onde a gente precisa estar preparado pra se salvar.” Estava abrindo um vinho quando ouvi essa, o clima da conversa era animado. Mais uma vez, no entanto, tive que descer a gargalhada goela abaixo, o papo era sério.

Sério?

Faz um tempo que a gente vêm falando de ódio, que aumentou o volume do sentimento amargo que faz as pessoas fiscalizarem o direito alheio, mas esse olhar, hoje em dia, me parece meio fantasioso. Acho que os milhares de coraçõezinhos e termos como “coração quentinho” e “é muito amor” deixaram nosso bom senso meio amortecido, a gente acreditou que, pelo andar da carruagem, ia seguir fingindo que o estilo de vida do outro não irrita a gente e que mandaríamos todos um forte abraço pra “bad”. Enfim, não foi o caso.

Orelha formigando

A verdade é que muita gente acha uma fraude eu dizer que não ligo pra carreira ou que considero uma bosta dirigir carros como símbolo de independência, por exemplo, à medida que considero a busca constante pelo próximo automóvel, trocar de apartamento assim que termina de quitar o anterior ou mesmo manter casamento por causa de filhos meios de se distrair da vida até a pessoa ficar velhinha e poder usufruir da liberdade que a previdência privada lhe proporciona, embora agora com artrite, prole adulta pedindo dinheiro emprestado e possíveis problemas de disfunção erétil.

Achamos que, por meio de uma postura zen ou da força física, entre outras opções, vamos criar atalhos para lidar com uma sociedade em carne viva, dividida por ideias e opiniões divergentes, muita intolerância e péssima interpretação de texto, o problema mais grave na época atual, na minha mequetrefe opinião, que apresenta a maior produção textual de toda história humana.

Embora tenha mesmo muito blá rolando o tempo todo e filosofia de boteco pra dar e vender, como a que escrevo semanalmente neste espaço, existe um único jeito de lidar com isso tudo: vivendo.

O que fanáticos religiosos do mundo inteiro têm em comum?De uma forma ou de outra, todos eles atacam o prazer alheio. O...

Posted by Mário Lemes on Sunday, November 15, 2015

É disso que fala Carol, um dos líderes de indicações ao Oscar deste ano (esse mesmo da lista mais branca que lençol de comercial de sabão em pó). Trata-se de um melodrama cujo ritmo quebra os atuais padrões de blockbusters clipados, um filme que “rouba” nosso tempo e arrasta a gente para uma história sem atalhos, que rima amor com dor, como é e tem que ser uma boa história de amor, e lembra que, para viver como se é, não tem outro jeito a não ser vivendo.

Trata-se de um filme libertador como a imponência de sua protagonista homônima, vivida pela já eterna Cate Blanchett, e mais do que necessário nessa época xarope que vivemos.