Batemos um papo com os autores Timothy Zahn e Chris Taylor sobre como a franquia está se virando ao criar um “mundo paralelo” com o selo Legends — e também o que pode ou não gerar novos filmes, games e HQs no futuro
“Então, galera, ó só: tudo isso aqui não vale mais. Existe, legal, divertido, mas não é mais do CANON oficial. Considerem apenas o que vai sair daqui pra frente. O resto, esquece. O resto... bom, a gente vai colocar aí um novo selo e tocar a vida”. Talvez não tenha sido com essas palavras exatamente, mas foi dessa forma que a LucasFilm, agora sob o controle da Disney, anunciou como a banda ia tocar no universo de Star Wars a partir de agora.
Com filme novo por aí, surgiu a ideia de uma cronologia única, unindo o cinema com o que é produzido em outras mídias – incluindo novos jogos, novos livros, novos gibis. Tudo integrado. Dava pra esperar a chiadeira, né? Pois ela aconteceu. Só que tem gente que dá pra chamar de expert no assunto que discorda desta parte enfurecida dos fãs e defende a decisão.
“Esta é exatamente a forma de fazer isso, eles tiveram a oportunidade e agarraram”, aposta Chris Taylor, autor de Como Star Wars Conquistou o Universo, uma verdadeira bíblia sobre os bastidores da saga de George Lucas. “Eles fizeram o movimento de transformar o restante em Legends, aí começaram de novo e integraram tudo. E agora não está tudo focado numa pessoa, temos um bando de nerds sentados ao redor de uma mesa que sabem TUDO sobre Star Wars, mais do que nós até, integrando tudo, fazendo sentido”.
O JUDÃO teve a chance de bater um papo com Taylor e também com Timothy Zahn, autor da cultuada Trilogia Thrawn de livros (Herdeiro do Império, Ascensão da Força Sombria e O Último Comando), talvez o mais adorado pedaço do universo expandido e ambientado exatamente cinco anos depois de O Retorno de Jedi – e que, para efeitos de O Despertar da Força, deve ser desconsiderado. Mas o próprio Zahn afirma não enxergar problemas na decisão da LucasFilm. Pelo contrário, aliás: segundo ele, pelo menos metade do chamado Story Group que agora comanda as decisões criativas e cronológicas da saga gosta muito do universo expandido. Assim sendo, eles não vão “destruir” nada simplesmente porque têm o poder para isso. “Eles estão sendo bastante cuidadosos e cautelosos”, opina Zahn. “Se eles querem reescrever alguma coisa, como por exemplo o retorno do Chewbacca [que morreu no livro Star Wars: The New Jedi Order – Vector Prime, publicado em 1999], vai haver uma boa razão para isso”.
O escritor relata uma conversa que teve com Leland Chee, integrante do Story Group e responsável pela manutenção do imenso banco de dados de continuidade da LucasFilm, batizado de Holocron. “Chee lembrou, por exemplo, do Jaxxson, The Big Green Rabbit — um coadjuvante criado na época dos primeiros gibis de Star Wars pela Marvel — e disse que qualquer um em Star Wars é o favorito de alguém. Inclusive Jaxxson. Não podemos derrubar o personagem favorito de alguém a não ser que exista uma boa razão”. E isso inclui até o controverso Jar Jar Binks? “Claro que sim. Talvez alguém que tenha crescido vendo aqueles filmes realmente goste dele”.
Taylor diz que a decisão sobre Legends foi difícil, mas acredita que, em retrospectiva, dá para entender porque eles a tomaram. “Assim que surgiu o conceito de O Despertar da Força, ficou a coisa do ‘nós não sabemos o que aconteceu na galáxia nos últimos 30 anos’. Se a intenção fosse manter o universo expandido, eles teriam muito a explicar graças às histórias do universo expandido que rolaram neste período, Chewie não estaria vivo, personagens fazendo um monte de referências que nem todos entenderiam. Este não é o jeito Star Wars de fazer as coisas”. Além de achar que a saída de criar o Legends funciona especialmente bem para livros e quadrinhos, o jornalista arrisca que esta poderia ser uma saída até mesmo para uma nova série de filmes. “Algo que rolasse em paralelo. Não é preciso ter apenas um cânone. Existem múltiplos universos”.
Para Zahn, não dá pra esquecer também que a Disney tem quatro emissoras de TV. “O Disney XD tem Rebels, oficialmente renovado para uma terceira temporada. Meu sonho é que tenhamos, algum dia, um line-up farto e variado com séries como Rogue Squadron, Tales of The Jedi e Chronicles of The Empire. Algo assim, cobrindo diversos temas deste universo. George Lucas nunca conseguiu fazer isso. Mas a Disney tem o dinheiro para isso. O futuro é brilhante”.
E é justamente pegando este gancho que Zahn deixa claro que nada do que se tornou Legends, incluindo os seus próprios livros, pode ser considerado perdido. A sua comparação faz menção a nomes como Robin Hood ou o Rei Arthur e os Cavaleiros da Távola Redonda. “As pessoas ainda fazem filmes sobre estes personagens. Mas eles não existiram ou, pelo menos, não da forma que os filmes os retratam. Nada impede a LucasFilm de voltar e dizer ‘vamos fazer um filme ou uma série de TV sobre este livro’. Eles nunca disseram ‘isso não aconteceu’. Eles apenas disseram ‘não existe confirmação de que isso aconteceu’. É como Robin Hood”, explica ele. “É uma lenda dentro daquele universo. E a própria Disney tem transformado lendas em filmes, como fez com Pocahontas, Hércules... Eles poderiam tranquilamente escolher algo do universo expandido e trabalhar em cima. A Trilogia Thrawn não está perdida. Ela apenas não foi provada como sendo verdade no universo de Star Wars”.
Portanto, amiguinhos, não percam as esperanças de ver Jeremy Irons como o Grande Almirante Thrawn, principal vilão dos livros de Zahn. “Acho que ele faria um trabalho excelente. Até porque acho que seria um pouco demais para o Sean Connery, por exemplo”, ri o escritor.
Por enquanto, todavia, não temos notícias a respeito de Zahn escrevendo novas obras de Star Wars, sejam elas Legends ou não. “Não vou pedir nada a eles. Eles sabem onde me encontrar, eles sabem que estou disposto, é só me procurar”. Mas, obviamente, tudo vai depender muito do que eles quiserem que o autor faça. “Se eles pegam alguém do novo filme, por exemplo Finn, e dizem que querem uma história a respeito dele, eu provavelmente toparia”. O esquema funciona quase sempre assim: eles pegam um personagem ou uma linha de história e dizem “queremos isso”. Aí cabe ao autor aceitar e desenvolver. “Se fosse alguém que me interessasse e eu achasse que daria uma boa história, eu estaria disposto a fazer. Se eles quiserem algo como As Nobres Aventuras de Jar Jar Binks [MUITOS RISOS]... Não sei. Eu posso fazer. Posso torná-lo um bom personagem”.
Gostei da confiança, Zahn, isso aí. <3
Timothy faz questão de deixar claro, apesar de qualquer coisa, que é um completo apaixonado por Star Wars e acredita que o produto está em excelentes mãos, levando em consideração não apenas o Story Group, mas também a liderança de Kathleen Kennedy e o apoio irrestrito da Disney. “Não conheço nenhum outro estúdio em Hollywood que deixaria o departamento criativo criar como a Disney está deixando a LucasFilm criar, sem meter a mão nas coisas e estragando tudo. Acho que eles vão nos apresentar filmes incríveis, divertidos e de altíssima qualidade”.
Taylor levanta ainda a bola de que um espectador em particular deve estar curtindo esta nova abordagem, só que pela primeira vez como um mero mortal: George Lucas, o criador original. “Uma coisa que ele já disse sobre todos os filmes de Star Wars é que ele acaba não assistindo depois. Porque ele fica olhando para a tela em busca dos erros, do que poderia ter feito melhor”, relembra o inglês. Agora no papel que o próprio Lucas descreveu como “pai divorciado”, aquele que não está mais criando o filho tão de perto, na mesma casa, que acompanha de longe e deixa as crianças fazerem suas coisas sozinhas, vai ser hora de relaxar um pouco. “Creio que ele vai acabar vendo lá no Rancho Skywalker, porque ele tem a melhor sala de cinema do mundo, com o melhor sistema de som. E acho que ele vai ficar empolgado”.
Já sabemos, por exemplo, que ele anda comprando os gibis da Marvel – o barbudo esteve em uma loja em Manhattan comprando os primeiros números dos novos quadrinhos de Star Wars. “Deve ser ótimo pra ele poder ler a história e não saber o que acontece depois”, acredita Taylor. “Ele está experimentando novamente a sensação de ser um geek como nós, um fanático que está apenas curtindo o momento, como há muito tempo não sentia. Acho que este deve ser um bônus que ele ganhou, além daqueles 4 bilhões de dólares”, brinca.
Depois desse papo, a visão do Chris Taylor se provou a certa: Lucas não só viu o novo filme, de acordo com o THR, mas também gostou e esteve presente na première em Los Angeles.
Tinha uma coisa, obviamente, que a gente não podia deixar de perguntar pra estes dois caras. Afinal, o que eles estão esperando de O Despertar da Força, que estreia ESTA FUCKING SEMANA? “Eu não tenho expectativas”, diz Timothy. “Vi apenas os trailers. Tenho apenas a esperança de que seja tão empolgante e mágico quanto a primeira vez em que vi Uma Nova Esperança, lá em 1977. Não quero ter expectativas, por isso não leio spoilers, quero tudo novo”.
No caso de Taylor, no entanto, nem tem muito jeito de fugir de tanta informação – afinal, estamos falando de um cara que não apenas é uma jornalista especializado em entretenimento, mas também um jornalista especializado em Star Wars. “Mas eis o ponto. Eu posso te contar tudo, quem vive, quem morre, os diálogos. Mas nada disso seria Star Wars. Porque você precisa da música, dos efeitos especiais. Dos belos enquadramentos coloridos, da interpretação dos atores”, aposta ele. “Eu estou mantendo minhas expectativas próximas de zero, esperando que talvez alguns itens do universo expandido tenham sido aproveitados no filme, talvez apresentados de forma diferente. É isso. Estou aqui esperando não ter outro momento do tipo A Ameaça Fantasma”.
Rapaz... a gente também, viu. Se conseguirmos deixar este capítulo para trás, JJ Abrams já vai ter obtido uma vitória e tanto. ;)