Volta ao Mundo em 40 Dias: Qatar | JUDAO.com.br

Do mercado de paredes de barro, aos prédios de vidro; da burca ao biquini; do ocidente ao oriente. Fomos, vimos e deu tudo certo.

Durante uns 40 dias, entre Abril e Maio de 2014, eu abandonei o JUDÃO e saí viajando pelo Mundo. Doeu no coração, mas era uma daquelas oportunidades de vida — profissional e pessoal — que surgem uma vez a cada trinta anos ou menos. Fui pra Argentina, EUA, Espanha, Alemanha, Inglaterra, Qatar, Hong Kong, Austrália e Chile e, agora, vou tentar dividir com vocês um pouco de tudo o que conheci, ouvi, vi e senti — tirando essa maldita dor no joelho que me acompanha até agora. :D

A sexta parada foi no Qatar.

Se é difícil lembrar como se fala “milk shake” em alemão, é porque você nunca tentou falar “oi” em árabe. Tenta repetir comigo: مرحبا! Não rola, né?

A sorte é que Doha é uma daquelas cidades absolutamente internacionais, onde TUDO está em inglês e, mesmo que pouco ou ruim, todos falam — ou é assim ou vai ser difícil aproveitar todo o mundo de negócios que está chegando por lá pelos próximos anos.

Sim, chegando. Doha é uma cidade em construção. O aeroporto, que será desativado e trocado por um outro extremamente luxuoso, tinha diversos grupos de trabalhadores chegando e, nos fins de tarde, é bastante comum ver vans e ônibus cheios deles — e essa imagem, é bom que se diga, assusta um pouco. Onde quer que se olhe você encontra guindastes, tratores, desvios e obras — seja em qual lado da cidade estiver.

Eu tava com um PUTA CAGAÇO do que iria encontrar. Não sabia muito mais do que vemos por aí sobre a cultura islâmica, sempre com o peso dos ocidentais no ombro. Fica difícil discernir as coisas, entendê-las e até mesmo aceitá-las.

Porque é aquela coisa: Europa, por mais NOVA que tenha sido pra mim, tem muito a ver com a minha cultura, com o que eu conheço. Um país como Qatar, que agora está se abrindo, é surpresa atrás de surpresa e até um certo medo, que se vai rapidinho, ao perceber que não há razão pra temer qualquer coisa por lá — quer dizer, desde que você não seja um jornalista cobrindo as obras pra Copa do Mundo, mulher... Mas, no geral, é tudo tranquilo.

Por exemplo, no FANAR — o centro cultural Islâmico do Qatar — fomos recebidos por Abdullah, que nos deu livros em inglês que explicam a base do islamismo e nos serviu um chá, enquanto falava da cidade e fazia QUESTÃO de dizer que éramos bem-vindos naquele lugar. Mas, pra tudo isso, fez com que três mulheres sentadas dessem lugar a nós, o que me deixou BASTANTE incomodado.

Sim, as mulheres usam burca lá. Daquelas que só se vê os olhos — a não ser que o vento não as traia, mostrando saltos ALTÍSSIMOS, leggings e maquiagens (sim, isso aconteceu). A maior parte dos homens usam túnicas brancas... Eu, minha bermuda, minha camiseta e meu chinelo estávamos bem por lá, mas éramos, CLARAMENTE de fora.

O único problema disso é que, no hotel, meu chuveiro não tinha água fria. Ou morna. Ou mesmo quente. Era PELANDO. Um funcionário chegou a me levar um balde como solução (o mesmo que saiu com uma barata na mão de lá), mas eu preferi usar meias como ESPONJA, o que acabou resultando numa negligência na higiene dos meus pés, que ficaram encardidos por mais uns dois meses.

Tomar banho BANHO em hotel, amigo, não é fácil. :D

Souq Waqif

Souq Waqif

Dependendo de onde você estiver, porém, talvez se sinta menos outsider. De um lado da baía, aqueles prédios enormes, cheios de vidros, lindos, ilumindados e recheados de gente de todo o mundo, construções planejadas no meio do mar e dinheiro, MUITO dinheiro; do outro, a Doha mais real, árabe, que praticamente se concentra no Souq Waqif. Sabe aqueles mercados que se vê na TV, que vendem de tudo (tipo POMBAS) e a cada rua que você entra parece que está indo em outro mundo? :D

O Souq Waqif é antigo e chegou a ficar fechado por muito tempo. No começo, os locais e beduínos se encontravam pra vender seus produtos — cabras, peixes e etc; em 2006, com o início da modernização de Doha, que teoricamente vai culminar com a Copa de 2022, o mercado foi reaberto, com hoteis e várias lojas, das mais ROOTS às mais “atrações turísticas”, cheias de ímãs e outros souvenires, além de restaurantes e cafés. É o grande centro de Doha, onde se encontra gente de todos os lugares e culturas — e que funciona basicamente a noite, o que é ótimo, porque COMO É QUENTE aquele lugar.

Lá você encontra a Shisha, que é tipo um cigarro com sabor, ainda que sem tanto tobaco (que eu experimentei e parecia que estava tomando um chá de fumaça, mas até que gostoso) em TODOS OS LUGARES; também encontra comidas de países da região, além das locais mesmo, como no lugar onde comi a tal da comida árabe de verdade, com direito ao que nós chamamos de pão-sírio, assado na hora. Delicioso e muito, muito barato. :D

Um ótimo lugar pra comer, sempre. Homus, te amo!

Mas é só por lá. Do outro lado da cidade foi muito difícil encontrar esse tipo de comida, que é chamada por lá de saudável, expremida entre grandes redes de fast food mundiais. Uma pena. :(

Do lado “ocidental” da cidade, porém, fica a State Grand Mosque. Visitamos no fim da tarde e, com aquela luz, aquele silêncio... Foi uma das coisas mais bonitas que vi nessa Volta ao Mundo. Dentro e fora, de dentro e de fora. Novamente, estava morrendo de medo de entrar e tudo mais, mas, novamente, fui muito bem recebido.

Doha vista da Grand Mosque

Doha vista da Grand Mosque

Doha é um bom lugar pra se contemplar. Seja o skyline, com os prédios iluminados à noite; seja o céu, mais amarelado, mais embaçado, por conta da areia — que até forma uma linha no horizonte, tipo aquela que temos de fumaça, em dias secos em São Paulo.

Por isso mesmo, aproveitamos o segundo dia por lá pra ir até o deserto. Farooq nos buscou no hotel e passou tempo todo dizendo que só queria que curtíssemos a viagem, nos levou até as dunas, onde fez diversas PERIPÉCIAS, até nos levar para a praia, sempre parando um pouco pra que pudéssemos olhar e experimentar aquela brisa e uma areia com uma temperatura muito boa, que permitiu que eu ficasse descalço o tempo todo. O mar, o sal, as dunas se formam e deformando... Deu pra ver até a Arábia Saudita! :D

Mais uma vez, uma das coisas mais bonitas que vi em toda essa viagem — e, também, uma das únicas. Não sei quando é que terei novamente a chance de passar um dia no deserto e terminá-lo na praia, com uma Shisha, tentando olhar mais as estrelas, empolgado com a primeira temporada de Cosmos, que eu tava assistindo na época.

Outra coisa linda que vi nessa viagem foi uma romena saindo do mar, enquanto eu esperava o jantar (fazia parte do pacote!). Ela era linda, sim, mas foi uma sensação inédita, essa de “nossa, estou vendo uma mulher de biquini, OMG!”. Eu tava no Qatar, afinal de contas. Eu já tinha me acostumado com as burcas e me senti, por uns segundos, um garoto de 12 anos. ¯\_(ツ)_/¯

Qatar

Doha foi uma nova experiência, um novo mundo completamente fora de tudo o que já conheci. Mas, ao mesmo tempo, uma cidade que ainda está se construindo, que ainda está se preparando pra receber todo o mundo. Em alguns anos, será totalmente diferente do que eu vi nesses dias — mas a que preço, né?

Mas o deserto... <3