Entre na sala de cinema deixando os preconceitos na porta e divirta-se um bocado!
Olha só, antes de qualquer coisa, é importante que sejam cortados pela raiz alguns conceitos pré-estabelecidos que certos fãs colocaram em suas cabeças, espontaneamente, antes mesmo de assistir ao filme X-Men: Dias de Um Futuro Esquecido, próximo capítulo da franquia mutante nos cinemas e que estreia no Brasil na próxima semana, no dia 22 de maio. E já começo dizendo, para não restarem dúvidas, que é um ótimo filme. Muito melhor do que eu sequer sonhei. É bom começar pelo diretor, Bryan Singer, aquele mesmo que voltou a assumir um x-filme depois de um trabalho que ainda divide opiniões nos dois primeiros filmes da saga, lá no começo dos anos 2000.
X-Men: Dias de Um Futuro Esquecido é, sem dúvida, uma continuação direta de Primeira Classe. O que quero dizer com isso? Que toda a condução da trama, todo o desenvolvimento da história, conversam muito mais com o filme anterior do que com os três primeiros longas. Aliás, se você tinha qualquer vã esperança de que Dias de Um Futuro Esquecido esteja aqui para servir como elemento de correção dos furos cronológicos que Primeira Classe deixou em relação aos três primeiros filmes e aos filmes-solo do Wolverine, esqueça. No máximo, a relação entre Logan e William Stryker e olhe lá. Dias de Um Futuro Esquecido continua Primeira Classe e estabelece, por assim dizer, um ponto zero, uma nova cronologia só sua. Deixa os filmes do Singer para lá. Tá, tudo bem, os atores originais estão ali, retomando seus papéis de outrora, bem legal e tal. Mas isso, para efeitos práticos, não quer dizer nada. E, honestamente, acho isso ÓTIMO.
Tomara que, conforme as décadas avançam nas próximas continuações, não exista um desejo de querer consertar tudo, de aparar arestas, de criar justificativas estúpidas. Porque esta necessidade passa a simplesmente inexistir depois de Dias de Um Futuro Esquecido.
Sim, é um filme sobre viagem no tempo, mas que se passa quase que essencialmente no passado – mais especificamente no ano de 1973. Patrick Stewart, Ian McKellen, Halle Berry e toda a turma estão ali apenas e tão somente como participações especiais de luxo. O tempo deles em tela é curto, curtíssimo na verdade e também muito bem aproveitado. Mesmo todos os outros mutantes, como Bishop, Mancha Solar, Blink (que é um dos grandes acertos desta nova safra de mutunas em película, com uma utilização brilhante de poderes), Apache e afins, estão ali apenas por uma razão específica, que é ajudar a dar ambientação de um futuro distópico e sombrio. Um futuro no qual os mutantes são caçados por modernas máquinas chamadas Sentinelas, e que têm a capacidade de detectar seus genes X e se adaptar quase que instantaneamente aos seus poderes. E já deu.
Ao contrário do que muitos alardearam, esta não é uma uma história na qual os personagens ficam se acotovelando em tela. E não, este NÃO é um filme sobre o Wolverine. Ele é apenas um elemento agregador, mas está longe de ser o personagem principal. A história existe e gira em torno do Professor Xavier (James McAvoy, ótimo novamente), de Magneto (Michael Fassbender, mais uma vez roubando a cena como um dos grandes vilões do ano) e, é claro, numa segunda camada, da Mística (Jennifer Lawrence, dando uma importância à personagem que ela jamais teve na primeira trilogia). Hugh Jackman está ali, o nome dele aparece em destaque, ele é legal e até paga bundinha. Mas o filme é todo dominado pela ótima trinca citada anteriormente. Logan é, na melhor das hipóteses, a força bruta em uma história que tem menos cenas de ação do que você pode imaginar. A história é mais intrincada e enrolada, então demanda mais diálogos, mais explicações, muito mais drama.
E sim, existe um motivo pelo qual Charles pode ser visto caminhando nos trailers, mesmo depois da bala que atingiu sua coluna ao final de Primeira Classe – e o motivo está intrinsecamente ligado ao fato de que é possível ver também Hank McKoy (Nicholas Hoult) em sua forma humana e não como o Fera azulado, pelo menos não o tempo todo. Pode não ser o motivo mais criativo do mundo, mas digamos que serve de maneira interessante a um momento dramático da história.
A história você já sabe: o futuro é um lugar desolador para os mutantes, com Sentinelas por todos os lados, cada vez mais fortes e invencíveis. O visual deles nesta versão futura é meio decepcionante, preguiçoso até, uma mistura sem graça de T-1000 com o Destruidor do filme do Thor, já alerto (custava ao menos ter feito algo similar a um Nimrod?). Mas, enfim. Como Lince Negra (Ellen Page) tem conseguido usar seus poderes para fazer com que a mente de Bishop faça breves deslizamentos no tempo, o Professor Xavier resolve fazer uma tentativa desesperada, talvez a última, e decide mandar alguém ao passado, para 1973, o ano em que Mística assassinou o cientista Bolívar Trask (Peter Dinklage) e ajudou o Governo dos EUA a considerarem os mutantes uma ameaça, tornando oficial o programa dos Sentinelas criado por ele. Capturada, ela é dissecada e sua capacidade de transformação/adaptação – uma particularidade de seu DNA – acaba servindo de base para a nova geração de robôs.
Mas uma viagem tão longa no tempo desmantelaria o cérebro de qualquer um. Menos o de Wolverine, que tem uma capacidade regenerativa que já bem conhecemos. Então, ela transporta a mente do Wolverine do futuro para o seu jovem corpo setentista. Aí, o baixinho canadensety terá que procurar Xavier e Magneto para que os três impeçam Raven de fazer a histórica cagada. Problema 1: numa vibe meio junkie, sem esperança alguma na vida, e em uma mansão Xavier jogada às traças, o Professor X dos anos 70 parece pouco interessado em acreditar neste lance futurista contado por Logan, e também em rever sua “irmã” Raven (que o abandonou) ou mesmo Magneto (que se tornou a cristalização ideológica de seus piores pesadelos). Problema 2: graças ao seu envolvimento com a morte do presidente Kennedy (lembram dos virais?), o mestre do magnetismo está preso em uma prisão de segurança máxima, sem qualquer metal, metros e mais metros abaixo do Pentágono. Como resgatá-lo?
O primeiro problema até que é meio fácil de resolver (ou quase). Mas e o segundo? Para isso, Wolverine resolve recorrer à ajuda da versão jovem de um sujeito que ele conhece há muito tempo, um certo Peter Maximoff (não entendo por que diabos não chamá-lo de Pietro, mas enfim...). Sim, estamos falando do velocista chamado Mercúrio (vivido por Evan Peters, bastante à vontade), aqui ainda um moleque usando seus poderes para pequenos crimes. E sim, o mesmo personagem que a Marvel Films vai usar na segunda aventura dos Vingadores, junto com a irmã, Feiticeira Escarlate (aqui, nem sequer mencionada). Não se fala que ele é filho do Magneto, mas digamos que fica subentendido, como algo que nem um e nem o outro sequer imaginam ainda. O fato é: a Marvel vai ter trabalho. Porque todo fã xiita do mundo encheu o saco por causa do visual do personagem. Mas ele é, tranquilamente, um dos três mutantes mais legais da trama, mesmo aparecendo bem menos do que deveria. A utilização de sua velocidade é divertida e visualmente impressionante. Dá vontade de tê-lo mais tempo em ação. Fica a dica, Singer.
No fim das contas, Xavier e Magneto colocam temporariamente as diferenças de lado e partem para impedir Mística. Mas só que isso é apenas o começo da história. Porque quando as diferenças de pensamento entre o maior telepata da Terra e do senhor das forças magnéticas voltam a ficar evidentes, em especial no que diz respeito em relação com a raça humana e com quem é superior ou não, parece que o futuro sombrio continua tendo chances de ocorrer mesmo com Trask ainda vivo. E é aí, nesta dualidade entre dois, que a trama tem graça e ganha vida. Exatamente como aconteceu em Primeira Classe.
Quando as luzes se acendem, Fassbender tornou Magneto uma antagonista ainda mais surpreendente e mais assustador, fazendo uma utilização simplesmente épica de suas habilidades (McKellen, desculpa aí, mas o Erik dele faz muito mais sentido do que o seu). E McAvoy tornou o seu Professor Xavier ainda mais próximo do Xavier idealista de Patrick Stewart. Mas, veja, com um tempero todo especial, só seu, sem soar como pastiche. E X-Men: Dias de Um Futuro Esquecido é o filme deles.
O longa deixa um gosto bastante positivo na boca do espectador. É Bryan Singer se rendendo e compreendendo, doa a quem doer, que Primeira Classe tinha sido, até então, a versão definitiva dos X-Men, deixando seus mutantes comendo poeira. Apesar de estar de volta, ele não é mais dono do destino destes heróis e vilões. Há quem defenda, como nosso intrépido editor Borbs, que este projeto estaria semi-pronto e que Singer quando assumiu, não teve escolha a não ser seguir como podia. Mais coordenando do que colocando sua marca. Vamos ver se este foi o caso, como ele reage, no próximo filme. Porque caminhar para frente já mostrou ser bem mais efetivo do que tentar andar para trás. Por mais que uma olhadela por cima dos ombros, de vez em quando, ajude a soprar uma lufada de ar fresco.
P.S.: Anna Paquin aparece no filme como a Vampira, senhoras e senhores. Muito brevemente no entanto. Mas aparece, depois de todo aquele falatório. Assim como outros nomes da trilogia de Singer e que andaram alardeando aos quatro ventos que não dariam as caras. Vamos deixar o elemento surpresa neste caso. Mas já avisamos. Eles vão aparecer todos de uma vez. E, diabos, vão deixar a cronologia ainda mais confusa para quem tem os filmes do Singer em mente. Desapegue. De verdade.
P.P.S.: Ah, sim, temos uma cena pós-créditos. E ela é ótima. Para deixar qualquer fã empolgadaço. Se você já sabe quem vai ser o vilão do filme seguinte, tenha em mente que esta breve sequência é o equivalente à aparição relâmpago de Thanos no final de Vingadores. Nem precisamos dizer mais nada. Só curtam o momento! :)