Zoom: um filme sobre um livro dentro de um filme dentro de uma HQ e por aí vai :) | JUDAO.com.br

Longa do diretor brasileiro Pedro Morelli, com Mariana Ximenes, Alison Pill e Gael Garcia Bernal, é uma aposta praticamente inédita no cinema nacional em termos de linguagem e narrativa

Tudo começa com Emma (Alisson Pill), uma garota que trabalha numa fábrica de bonecas sexuais e que, nas horas vagas, desenha uma história em quadrinhos. O gibi de Emma é sobre Edward (Gael García Bernal), um diretor de cinema egocêntrico que esconde um “terrível” segredo. E Edward, vejam, está rodando um filme sobre Michelle (Mariana Ximenes), aspirante a escritora que foge para o Brasil e abandona sua antiga vida como modelo. Adivinha só qual é a trama do livro de Michelle? A história de Emma, uma garota que trabalha numa fábrica de bonecas sexuais.

Este ENTRELAÇAMENTO METALINGUÍSTICO maluco, com tramas que funcionam sozinhas mas estão interligadas de alguma forma, é a base de Zoom, primeiro longa-metragem solo de Pedro Morelli, mais uma co-produção da brasileira O2 Filmes e a canadense Rhombus Media, agora falada tanto em português quanto em inglês.

Formado em audiovisual pela USP, com especialização em fotografia cinematográfica pelo Maine Media College, nos EUA, Pedro, 29 anos, é mais conhecido por ter criado a série Contos do Edgar, exibida pela Fox e que adapta as histórias do escritor Edgar Allan Poe para a realidade brasileira. No cinema, até agora, sua única experiência como cineasta tinha sido em Entre Nós (2014), suspense com Caio Blat, Paulo Vilhena e Carolina Dieckmann no qual dividiu a cadeira de diretor com o paizão, Paulo Morelli (fundador da O2 ao lado de Fernando “Cidade de Deus” Meirelles).

Premiado nos festivais do Rio e de Manaus, Entre Nós chegou até a entrar em competição oficial do Festival de Roma e no Festival de Havana. Um ótimo começo. Mas Pedro, um fanático por estudos de linguagem, procurava ansioso seu primeiro projeto para um voo solo. E ele veio na forma deste Zoom, que mistura live-action com animação para dar vida ao primeiro roteiro de Matthew Hansen, que conhece bem a linguagem das HQs: o canadense já tinha trabalhado antes como editor na Dreamwave Productions (com títulos como Transformers) e na parceria entre Marvel Comics/Dabel Brothers Productions para as versões em quadrinhos de clássicos como The Highwayman, fantasia de R.A.Salvatore (conhecido por seu trabalho nos romances baseados em Forgotten Realms).

O convite veio primeiramente do produtor canadense Niv Fichman (O Homem Duplicado), quando Pedro ainda era estagiário e trabalhava ao lado do diretor Fernando Meirelles nas filmagens de Ensaio Sobre a Cegueira (2008). Fichman tinha o roteiro de Hansen em mãos e soltou pro jovem diretor cuidar, com uma única recomendação: “é pra pirar”. Pedro seguiu a regra à risca.

“São 29 minutos desenhados frame a frame, em que usamos a técnica de rotoscopia (aquela mesma de Take On Me, do A-Ha, lembra?). Filmamos tudo com atores e depois desenhamos sobre a imagem filmada”, explica Morelli, em comunicado oficial, contando que teve ao seu lado uma equipe de 25 desenhistas brasileiros que trabalharam no projeto – com orçamento estimado em US$ 5 milhões – por cinco meses.

Produzido por Fichman e Andrea Barata Ribeiro (Ensaio Sobre a Cegueira, Cidade de Deus), com produção executiva do Meirelles e do Paulo Morelli, Zoom teve uma première oficial em setembro de 2015, durante o Festival de Toronto e chamou a atenção não apenas do público, mas também da crítica. “Composto em parte por animações ordenadas numa estrutura colapsante, a referências pop-art garantem um filme que nunca é maçante”, disse Guy Lodge em sua crítica para a Variety.

Zoom_05Logo depois, Zoom teve uma jornada interessante por alguns festivais: seleção oficial do FICG – Festival Internacional de Cinema de Guadalajara, no México; Fantastic Fest, maior festival dos EUA dedicado a filmes de terror, fantasia, animação e ficção científica; e ainda foi o vencedor da votação popular no Ithaca International Fantastic Film Festival, de Nova York, focado na produção mundial de cinema fantástico e animação.

Aqui no Brasil, passou tanto pela Mostra Internacional de Cinema em São Paulo quanto pelo Festival do Rio, onde teve uma recepção calorosa. “Fiquei muito contente ao sentir que as piadas funcionaram”, diz Pedro. “Como o filme é falado em inglês, estava ansioso pra ver como o público do Rio iria reagir com as legendas. Mas foi muito bem”.

Em entrevista ao jornal O Dia, Pedro revela que o grande tema de Zoom “é a nossa sociedade superficial, onde todos estão buscando um ideal de beleza e tentando ser o que não são. (…) No atual momento, o padrão de beleza é a mulher ser peituda e magra e o homem ter o pau grande e ser musculoso”. Enquanto Emma lida com o resultado de imensas próteses de silicone, Edward vive atormentado por ter um instrumento entre as pernas bem menor do que a média do mercado.

A terceira parte deste questionamento da forma física ideal pode ser visto na história de Michele, a modelo que tenta provar ao namorado Dale (Jason Priestley, o Brandon de Barrados no Baile), que é mais do que um rostinho bonito – e acaba se envolvendo com uma mulher mais velha, vivida por Claudia Ohana. “As mulheres estão cada vez mais perfeitas nas fotos, por causa do Photoshop. O que faz as pessoas acreditarem que há um ideal de beleza inatingível”, opina ela. “Tenho muito medo disso. Às vezes, fica uma fantasia de como se fôssemos perfeitos como na revista, mas ninguém é”.

Pra quem curte música, um último item para ficar ligado: a trilha é do DJ canadense Eric San, mais conhecido pela ALCUNHA de Kid Koala – cujo trabalho ao lado de Damon Albarn no primeiríssimo álbum dos Gorillaz você talvez conheça.

Com os direitos de distribuição para os EUA já devidamente comprados pela independente Screen Media, Zoom terá sua estreia oficial aqui no Brasil dia 31 de Março.