No segundo episódio a série confirma que o universo podre de Gotham vive independentemente do Batman – e que Selina Kyle é uma peça importante nisso tudo
SPOILER! Crimes sem solução. Policiais corruptos. Políticos corruptos. Crime organizado, máfia dominando e um detetive novato tentando fazer a diferença no meio disso tudo – seja para a cidade ou para a vida de um garoto que busca justiça pela morte dos pais. Foi tudo isso o que prometeu o episódio piloto de Gotham. Só que sempre fica aquela dúvida: será que, nos capítulos semanais, a boa impressão da estreia se manteria? Será que a série não acabaria naquela coisa de “um policialzinho contra esse mundão todo” (™ Rubens Barrichello)? Pelo que se viu no segundo episódio, Selina Kyle, a peteca não caiu – diria até que ela tá num nível mais alto.
É claro que pode parecer estranho contar a história do mundo do Batman antes do Batman, quando Bruce Wayne ainda era um garoto que acabou de perder os pais. Porém, os super-heróis são usados para fugir da vida real e enquanto isso os vilões (principalmente os do Homem-Morcego) são verossímeis. São malucos que não acreditam no funcionamento da sociedade, que usam fatos e pessoas para atingir seus objetivos, sejam eles quais forem. Por isso, quando se coloca o detetive novato James Gordon como protagonista, Gotham se aproxima de todos nós. Torna-se a nossa luta diária contra aquilo que é errado, a dificuldade de escolher o que é certo. É sobre fazer a diferença, nem que isso aconteça em só uma oportunidade em toda a vida.
Só que Jim é, agora, um policial corrupto após os acontecimentos do piloto – por mais que não seja, efetivamente, mas teve que entrar no esquema. Isso é ótimo: não temos um cara perfeito ali, só que ao invés de abaixar a cabeça e fazer vista grossa parece que tal fato dá ainda mais força para o detetive. Mesmo contra a vontade do parceiro, ele dá atenção para um caso de crianças de rua que estão sumindo na cidade.
Bom, se na vida real dão pouca atenção para crianças de rua, imagina em GOTHAM? Pois é. Mas Jim vai lá, tenta movimentar o parceiro Harvey Bullock e a polícia como um todo. Nisso, vemos como a corrupção já tomou todas as instâncias da estrutura pública. Como a série prometia, sem as amarras de uma cidade real para retratar, é possível ir muito mais fundo nessa questão.
É aí que a história envolve Selina Kyle. Sem os pais, com apenas 13 anos, ela vive pelas ruas da cidade e para sobreviver aprendeu a ser esperta, a se proteger. Ainda está longe de ser a mulher dos quadrinhos, mas já é a “Gata” – e que fica justamente na mira do casal que estava sequestrando as crianças de rua. É assim que os caminhos de Selina e de Jim se cruzam pela primeira vez.
Explicando dessa forma, se você não viu o episódio, parece algo simples. “Ok, crianças sequestradas, beleza”. Mas estamos falando de Gotham. É tudo mais sujo, mais podre, assim como objetivo dos sequestradores: levar as crianças para o Fazedor de Bonecas, um vilão da DC conhecido nos quadrinhos por transformar crianças em robôs assassinos.
No meio disso tudo, Camren Bicondova vai surpreendendo no papel de Selina e, pelo jeito, é um daqueles nomes que precisamos guardar na memória.
Não é só Camren, aliás. O próprio Ben McKenzie está mandando muito bem como Gordon. Outros destaques são a Jada Pinkett Smith, a vilã Fish Mooney, que tem menos cenas nesse segundo episódio, mas uma delas (quando é emparedada pelo Don Falcone após as ações do episódio anterior) é bem forte e interessante. Já Robin Lord Taylor segue a lenta escalada de Oswald Cobblepot para o posto de Pinguim com uma insanidade e instabilidade que chegam a dar medo. O jovem Bruce, David Mazuoz, também aparece menos que no piloto, mas já está bem interessante ver o comecinho dessa caminhada dele para dominar o medo e a dor, ao som de death metal.
Depois de alguns tiros, mortes e arranhões, o caso NÃO é resolvido, apesar das crianças capturadas serem libertadas – nem vemos o Criador de Bonecas. Aliás, tudo isso vira um pretexto para o prefeito, com o maior sorriso no rosto, comunicar à população que as crianças de rua vão pra um reformatório. Elas são presas sem cometer um crime, sem um mandado, como o próprio Gordon joga na cara do prefeito. Pois é. Tudo sempre pode piorar, não adianta ter esperança.
Acredito que Criador de Bonecas nem precisa de muito esforço para justificar o apelido. Até porque, em Gotham, todos já são marionetes do crime.
Ao menos tudo isso serve para Selina ir atrás do Jim Gordon, o único policial que ela consegue confiar, para avisar: ela viu quem matou Thomas e Martha Wayne, um mistério que ainda vai longe.
Se você acompanha Arrow sabe que o Criador de Bonecas apareceu na série. Já tem gente acreditando que essa pode ser a primeira ligação entre a produção do Arqueiro e Gotham. Calma lá.
Pra começar, Geoff Johns já disse que quer separar as coisas, até para dar liberdade criativa para os roteiristas. Arrow e The Flash já dividem o mesmo universo, e até existe a chance (ainda que pequena) de as futuras Supergirl e Titans as acompanharem, mas isso dificilmente acontecerá com Gotham. A série do Bruce Wayne quando era garoto é claramente sobre um universo sem super-heróis e o fato de Arrow já ter “pegado emprestado” diversos vilões do Homem-Morcego seria um limitador para novas ideias.
O Criador de Bonecas visto em Arrow é mais próximo (mais não tanto) da versão do recente reboot dos quadrinhos, Os Novos 52. Nessas HQs, o vilão é conhecido por transformar pessoas em bonecos, matando-as no processo. Além disso, o antagonista de Oliver Queen já deixou claro que gosta de mulheres jovens, brancas e de pele macia, além de fazer sozinho o trabalho sujo.
Já o Criador de Bonecas de Gotham tem capangas e está atrás de crianças de rua. Talvez ele não seja tão próximo da versão original, que transformava garotos em ciborgues assassinos (afinal, isso não casaria tanto com o que está sendo montado em Gotham), mas ainda assim é bem longe do que foi visto em Arrow.
Pois é, gente. Não adianta forçar. Cada série da DC na TV vai continuar no seu quadrado...