É cada vez mais certo que a editora irá revitalizar a sua linha de HQs no meio deste ano – inclusive, a iniciativa já ganhou um nome que vem bem a calhar: REBIRTH
Renascimento. Foi assim, com uma única palavra, que os editores Jim Lee e Dan Didio confirmaram, via Twitter, um boato que estava circulando nos bastidores há algum tempo: o Universo DC dos quadrinhos passará por um grande relançamento em breve. Sim, mais um.
Até agora só existem rumores, mas já é possível entender o que a editora pretende. De acordo com o Bleeding Cool, o relançamento vai acontecer em junho, depois que os gibis lançados no reboot de 2011 alcançarem a edição 52 – que tem sido, nos últimos anos, o número mágico da editora. E não é só isso: antes do número 1, cada título vai ganhar uma edição especial, “Rebirth”, provavelmente mostrando o novo status quo pros leitores que chegarem agora.
E não será apenas uma simples ZERAÇÃO da numeração, não. Batman e Superman vão passar a ser títulos quinzenais. Faz sentido pelo Homem-Morcego, afinal o gibi dele vende muito bem. Mas não se pode falar o mesmo do Homem de Aço...
Também parece que é consenso que o roteirista Scott Snyder faz muito bem ao Cavaleiro das Trevas, mas que não é tão bom assim prendê-lo com obrigações editoriais no principal título do personagem. Por isso, ele migrará (novamente) para Detective Comics, que vai continuar sendo tratado como um “título de segunda linha”, mas com um roteirista foda e sem obrigações editoriais tão rígidas – ou de ter que entregar duas edições por mês.
Pro lugar de Snyder, estão falando em Tom King, atual roteirista de Grayson e que é ex-agente da CIA. Sério. Outro detalhe é que King e Snyder estão trabalhando em conjunto para estabelecer essa nova fase do Batman.
Pra Superman, o nome da vez é o do roteirista Peter J. Tomasi, de Batman and Robin. O curioso é que Tomasi já, de certa forma, está com o Azulão: ele é o roteirista do arco Super League, que irá correr por dois meses em TODOS os títulos do personagem – e que acaba bem a tempo do relançamento em junho. Coincidência?
Ok, os títulos tradicionais vão continuar com suas revistas próprias, mas o mesmo não se pode dizer de quem vem mais atrás. Batman/Superman, Superman/Wonder Woman, Grayson, Starfire, Black Canary, Midnighter e Doctor Fate estão a um passo do limbo. Porém, isso não quer dizer que esses personagens vão morrer: a Estelar, por exemplo, vai sair do gibi próprio e estrelar (!) o novo volume dos Titãs; a Canário Negro vai pra Aves de Rapina e assim por diante.
Falando nos Titãs, parece que a DC quer colocar Damian Wayne, o filho do Batman e atual Robin, como líder da equipe, o que fica bem difícil imaginar. Já pra ocupar o espaço de Batman/Superman e Superman/Wonder Woman, deve vir por aí um novo volume de Trinity, com os três heróis – e aproveitando o gancho da presença deles juntinhos em Batman vs Superman.
Outra novidade que pode surgir é The Super Man. Sim, separado. Não se sabe muito o que isso significaria, mas todo mundo vai lembrar de uma antiga história de Jerry Siegel e Joe Shuster, pré-criação do Homem de Aço, chamada The Reign of the Super-Man, com um protagonista vilanesco e careca. Só que, daquela vez, tinha hífen...
Também deve vir por aí Man of Steel, buscando um link direto com o filme que iniciou o Universo DC dos cinemas – e possivelmente chegando a cinco publicações mensais do Azulão. New Green Lantern é outra que aparece nos rumores, só que estrelada por Jessica Cruz, aquela que assumiu o Anel Energético que era da Terra 3 (e vai continuar com o mesmo anel). Já o Lanterna Verde mais tradicional irá dar as caras em Hal Jordan and the Green Lantern Corps. Isso tudo, claro, se os rumores forem verdadeiros.
Só que o que parece ser a jogada mais ARRISCADA é a da Sociedade da Justiça. O time pode voltar, mas não será uma versão da Terra 2: teremos um time do universo principal da DC, que lutou na Segunda Guerra Mundial e tudo mais. O que a editora pretende, pelos rumores, é colocar uma explicação para ninguém mais lembrar de toda uma geração de heróis e sobre como eles vão voltar do limbo ainda jovens. Talvez com alguma noção sobre as diversas linhas temporais que já existiram, como em Titans Hunt? Pode ser.
Outra aposta aqui é que a Sociedade da Justiça pode estar presente, de alguma forma, no filme da Mulher-Maravilha – o que explicaria colocá-los nesse bolo todo.
Pra entender a motivação para tantas (possíveis) mudanças, é só olhar o mercado dos EUA. A DC passou muito tempo consolidada no segundo lugar em vendas nos anos 2000, com um ou outro momento de ameaça à Marvel. Porém, tudo mudou em 2011, quando rolou o reboot da cronologia. Em outubro daquele ano, a DC conquistou 50,97% das vendas, contra 30,29% da Casa das Ideias. Foi representativo.
Só que a Marvel devolveu. No último mês de dezembro, o market share ficou em 41,87% pra Casa das Ideias, contra 29,93% da Distinta Concorrência. Já falamos aqui no JUDÃO que o mercado de HQs para comic shops no geral cresceu no último ano nos EUA, mas a parte que é da DC estagnou. Isso depois de promover o chamado DC You, que tentou alterar o status quo dos personagens com mudanças como Jim Gordon como o Batman, Superman de calça jeans e o Lanterna Verde usando uma manopla pra ter poderes. Basicamente: DEU RUIM. Tanto é que já tão desfazendo tudo isso.
Pra piorar, existem relatos de alguns lojistas que apontam uma queda considerável nas vendas agora em janeiro. Não saíram, até o fechamento deste texto, os dados do mês, então fica difícil fazer uma análise mas, se a ~crise for geral, é de se imaginar que tenha afetado ainda mais a DC.
Pode parecer que o caminho mais fácil seria um reboot. Só que relançar tudo agora, menos de cinco anos desde o último, poderia ser desgastante junto aos leitores. Por isso a ideia é fazer AJUSTES FINOS no Universo DC, colocando elementos novos, trocando outros e assim vai. Ao mesmo tempo que faz um grande ponto de entrada pros novos leitores, ele se torna um que não irá irritar os atuais.
O timing do relançamento também não é por acaso: será logo após a estreia de Batman vs. Superman, o primeiro filme a dar realmente uma dimensão de Universo DC nos cinemas – por mais que ele tenha começado em O Homem de Aço. Vai ter muita gente empolgada com a tela grande e ter um gibizinho novo, recomeçando da edição 1, pode ser o atrativo que faltava pra entrar de cabeça nas HQs. Só que aí surge o primeiro grande problema dessa estratégia.
O Bleeding Cool afirma que há um grande acontecimento em BvS que está sendo mantido em segredo ATÉ dos roteiristas e editores. E esse grande acontecimento será importante para o Rebirth. Se você não sabe o que é, como traçar os rumos de uma história?
Outro problema é que todas as ideias antigas deverão ser jogadas fora – mesmo aquelas que não foram botadas em prática. Você é roteirista da DC e, sei lá, apresentou uma ideia genial pro Aquaman e não começou a botar em prática até agora? Esquece. Tenha outra ideia genial. Isso tudo colabora pra um ambiente de instabilidade dentro da editora, algo que já fez alguns roteiristas reclamarem publicamente no passado.
A DC também precisa entender se está lutando as batalhas corretas. Pelos rumores, seriam cinco gibis por mês do Superman. Se você olhar as vendas de dezembro, Superman #47 foi (coincidentemente) apenas o 47º, perdendo pra Saga, CHEWBACCA, Spider-Gwen, Deadpool, Arlequina, Demolidor, Gwenpool, X-Men... Action Comics #47 foi ainda pior, no 91º posto, atrás de INVADER ZIM, Silk, Carnage, Green Arrow, Inumanos, Miss Marvel, PATSY WALKER...
Por outro lado, todo mundo precisa acreditar nas apostas dos caras. Midnighter, super elogiado, está com vendas pífias. Bizarro, com o brasileiro Gustavo Duarte, era uma aposta e acabou encerrada depois de apenas seis edições. Criatividade, oportunidade e marketing inteligente são determinantes na reprodução do sucesso da Arlequina, por exemplo. Ou de Miss Marvel e Spider-Gwen, pra citar exemplos da concorrente. Fora o fato de que todos os exemplos que citei aqui serem estrelados por meninas, assim como quatro dos 10 gibis mais vendidos em 2015. Coincidência? Não.
Mais do que o Homem-Aranha, Thor, Vingadores, Homem de Ferro ou Hulk, a continuidade foi o grande presente que Stan Lee deu ao mundo dos quadrinhos. Não que não existisse alguma antes, mas foi com Stan Lee que se tornou possível acompanhar cada passo dos nossos super-heróis preferidos nas HQs, sabendo exatamente de onde eles vieram e para onde eles iam.
Quando o Universo Marvel chegou, no começo dos anos 60, a DC já era veterana. Só que eles aprenderam bastante com a Casa das Ideias, também. Se nos anos 50 o Superman e o Batman tinham mais ou menos o mesmo status quo em cada história, que quase sempre funcionavam sozinhas, no final da década seguinte isso foi mudando aos poucos. Essa mudança pode parecer pequena, mas finalmente tornou possível aos leitores crescerem com os personagens. Os super-heróis deixaram de ser folhas planas com personalidades imutáveis.
Se essa história fosse perfeita, o final feliz tava aqui. Não é. O que antes era uma dádiva, hoje se tornou uma maldição. É legal evoluir com seu personagem favorito? É. Mas é legal pegar a edição 47 daquele gibi que todo mundo acha legal e não entender LHUFAS de uma história que já tá começada e não acaba ali? Não é. Isso quando não fazem uma bela cagada com seu personagem favorito e, pra resolver isso, tudo se torna uma enorme dor de cabeça.
O resultado? Reboots. Relançamentos. Tudo que, de alguma forma, crie um novo ponto de entrada para os leitores que não vão conseguir alcançar décadas de cronologia. Só que a tática vai se desgastando. O Superman, nos últimos 30 anos, já teve cinco novas origens, sem considerar universos paralelos e outros selos. A Marvel, hoje, faz um relançamento por ano e promoveu Secret Wars para corrigir alguns desvios no caminho cronológico.
O fato é que o mercado de HQs dos EUA hoje é movimentado por esses relançamentos. Só que uma hora vai cansar. Talvez mais do que promover um “RENASCIMENTO” apenas no nome, a DC deveria propor uma nova lógica de mercado. Uma que mantenha as vendas independente de voltar ao número 1 de tempos em tempos.
É difícil, mas não é impossível.