Diário JUDÔNICO da Mostra: A Trilogia das Cores | JUDAO.com.br

A Mostra Internacional de Cinema, um dos eventos mais aclamados da cidade, acontece entre os dias 16 e 29 de outubro em 35 salas de cinema de São Paulo

Mais do que a possibilidade de conferir em primeira mão longas-metragens que podem ou não chegar ao circuito, a Mostra também proporciona uma chance de ouro de poder ver na tela grande clássicos indiscutíveis, em cópias originais no formato película (35mm). Acredite ou não, estas costumam ser as sessões mais disputadas – salvo, claro, os grandes lançamentos, como têm sido as sessões do esperado Foxcatcher, aquele do Steve Carell (que eu não me canso de lamentar por não ter conseguido ingresso...).

Por este motivo, meu foco neste terceiro dia foram os clássicos. Mais exatamente três clássicos em um: a maratona da aclamadíssima Trilogia das Cores do polonês Krzysztof Kieslowski, três fitas excelentes produzidas entre 1993 e 1994 que retratam histórias de gente comum, inspiradas nos ideais representados pela bandeira francesa. Os filmes fazem parte da Retrospectiva da distribuidora MK2, do produtor Marin Karmitz, responsável pela difusão de grande parte dos filmes independentes que ajudaram a consolidar o cinema europeu nos anos 1980 e 1990. Para quem curte cinema indie, é um prato cheio. :)

O primeiro longa, A Liberdade é Azul (Trois Couleurs: Bleu), retrata a dor de uma mulher, Julie, que não sabe mais como prosseguir com sua vida depois de um acidente de carro que matou seu marido e filha. O apoio de um antigo colega de trabalho de seu marido, que era somente um dos mais adorados compositores franceses, e a renúncia à rotina fazem com que Julie busque recuperar o amor pela vida. Um dos trabalhos mais impressionantes do diretor, falecido em 1996, e com uma atuação fantasmagórica de Juliette Binoche.

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A segunda parte da trilogia, A Igualdade é Branca (Trois Couleurs: Blanc), é mais leve e mais centrado na comédia involuntária em que geralmente histórias de vingança caem, talvez por isso causando estranhamento naqueles que conhecem a filmografia de Kieslowski – um cineasta intimista que curtia contar tramas silenciosas e centradas em detalhes quase imperceptíveis. Temos aqui a trajetória do polonês Karol (Zbigniew Zamachowski), que tomou na tarraqueta quando resolveu se mudar para a França sem saber ao menos o básico do idioma. Tudo isso porque sua esposa, a francesinha Dominique (Julie Delpy), pediu o divórcio alegando que a falta de comunicação entre eles causou a não consumação do casamento – mas o fato é que o sujeito foi acometido por uma crise de impotência psicológica... Sem uma Dilma no bolso (hehehe) e sem poder voltar para a Polônia, Karol segue os dias dormindo em estações de metrô até que conhece um sujeito que lhe dará a oportunidade de se vingar.

O melhor filme da trilogia é também o menor dos três. Indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 1995, A Fraternidade é Vermelha (Trois Couleurs: Rouge) une as três histórias ao narrar a improvável amizade entre a modelo internacional Valentine (Irène Jacob, espetacular) e seu vizinho, um juiz aposentado sem nome (o grande Jean-Louis Trintignant) com o hábito peculiar de espionar a rotina das pessoas que vivem a seu redor. Não dá pra dar mais detalhes desta belíssima história que conecta todos os personagens de uma forma impressionante. Os três filmes da Trilogia das Cores serão exibidos novamente nesta Mostra, em sessões gratuitas e em um espaço bem legal: o vão livre do Masp. Se você estiver de bobeira por São Paulo nos próximos dias, é uma excelente oportunidade de conhecer um pedaço desconhecido, mas não menos importante, do cinema europeu contemporâneo.

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A Fraternidade é Vermelha

Outros filmes importantes do dia 03: Camaradas, longa francês de 1970 dirigido pelo mesmo Marin Karmitz que, posteriormente, fundaria a MK2 e passaria a focar na distribuição de alguns dos melhores longas europeus da atualidade (o que seria dos hipsters sem ele, eu não sei); Um Cão Andaluz (1929) e A Idade do Ouro (1930), dois dos mais famosos trabalhos do cineasta surrealista Luis Buñuel – o primeiro deles é aquele da minazinha passando uma gilete no próprio olho, uma das imagens mais horrorosas da história; Boa Sorte, drama nacional dirigido por Carolina Jabor, filha de Arnaldo Jabor; e A Pequena Morte (Austrália), comédia de grande sucesso em seu país natal.

E a lição que fica deste terceiro dia: preciso dormir. Sério. :-D