Batemos um papo com o músico belga, saído do Soilwork, que foi parar em uma das maiores bandas do planeta, justamente aquela que tem um dos chefões mais durões do mundo do rock
Quando Dave Mustaine anunciou, em abril do ano passado, que o Megadeth teria dois novos integrantes, duas coisas ficaram bem claras de imediato para quem conhece um mínimo do mercado da música pesada: que o guitarrista Kiko Loureiro (Angra) duraria bem mais do que os pessimistas de plantão apostavam e que o baterista Chris Adler seria o primeiro a pular fora do novo barco. Pudera: o Lamb of God é, nos EUA de hoje, uma banda tão grande ou em alguns casos ainda maior do que o próprio Megadeth. Os conflitos de agendas obviamente o obrigariam a tomar uma decisão.
Depois de gravar o ótimo disco Dystopia e conseguir acertar alguns shows, logo ficou clara a escolha de Adler. Antes de sair oficialmente, ele mesmo indicou um batera substituto que, de apresentação em apresentação, ganhou a confiança de Mustaine e acabou sendo oficializado no posto. Trata-se do belga Dirk Verbeuren, conhecido principalmente pelo seu trabalho no Soilwork.
Um cara que não consegue esconder sua genuína felicidade e empolgação pelo novo desafio de assumir o posto de baterista de uma grande banda de heavy metal, apesar do aparente cansaço da longa e estressante turnê pela América Latina, que teve direito até a uma tempestade tropical em que a banda corria o risco de ser eletrocutada em El Salvador. “Tem uma coisa que aprendi durante todos esses anos: se você recebe a oportunidade de fazer alguma coisa especial na sua vida, não perca essa chance. Vá e faça!”, disse ele em entrevista exclusiva ao JUDÃO. “Eu não tinha planos de sair do Soilwork tão cedo. As coisas aconteceram de uma maneira bem inesperada mesmo. Depois de doze anos de Soilwork, você pensa já estar numa banda grande e bem sucedida e, de repente vem uma banda do tamanho do Megadeth bater à sua porta – não dá pra pensar duas vezes!”.
Você pensa já estar numa banda grande e bem sucedida e, de repente vem uma banda do tamanho do Megadeth bater à sua porta
Embora deixe claro que continua bastante amigo de todos os integrantes da sua banda anterior, ele sabe que alguns dos seus antigos fãs talvez não entendam e aceitem muito bem a sua saída. “Foi bem difícil deixar o Soilwork. Eles são como família pra mim também. Porém, eu acho que o Megadeth é uma banda que necessita ter um baterista dedicado”, opina. “Eu tenho minha família, ficar longe deles é muito complicado. Esse ano a turnê foi bem extensa e você não ter família por perto por um longo período de tempo é difícil. Então, se eu tento manter o compromisso com duas bandas que excursionam bastante ia ser muito puxado e eu não ia dar meu 100%. O nível de profissionalismo que envolve estar numa banda do tamanho do Megadeth é uma coisa que você tem que levar muito a sério. Muita gente pensa que é só puro glamour, tocar pra milhões de pessoas mundo afora. Mas é bem difícil e foi uma mudança extremamente radical pra mim”. Ele confessa, porém, que se por um acaso a sua entrada para o Megadeth cultivar a curiosidade das pessoas a saber mais sobre o Soilwork, ele ficaria MUITO satisfeito. “É realmente o que eu espero!”.
Acostumado a longas horas de ensaio (só para gravar o Deconstruction com Devin Townsend, por exemplo, ele se submeteu a seis meses de preparo para gravar apenas seis faixas e ainda fazer um DVD) e viagens por boa parte do mundo, Dirk diz que nem dá pra comparar com a complexidade da agenda do Megadeth. “Sou um músico experiente e com 41 anos de idade, já posso dizer que tenho uma boa experiência na indústria, mas nada do que fiz até agora se compara em estar numa banda como o Megadeth em termos de turnês, compromissos com a imprensa, entre outras coisas”. Ele revela que sempre manteve contato com o Chris, desde que fizeram algumas turnês juntos pela Terra do Tio Sam há alguns anos e o colega das baquetas sempre dizia que, se um dia precisasse indicar alguém pra cobrir outros bateristas, contaria com ele. “Quase aconteceu, por sinal, de eu ter que cobri-lo no Lamb of God. Eu acho que o Chris admira o meu trabalho e sempre me manteve no radar dele pra alguma oportunidade. Quando ele estava com a agenda bem cheia com o Lamb of God e o Megadeth, chegou o momento de ele ter de tomar uma decisão. O que dá pra entender, porque afinal o Lamb of God é a banda dele, é o bebê dele”.
Para Dirk, talvez a coisa mais engraçada seja o fato de que ele ainda tem memórias frescas de quando era um moleque comprando discos do Megadeth. “E agora estou atrás da bateria deles”, diz, empolgadão. “Sempre fui fã! Comecei minha coleção pelo Peace Sells, depois Rust in Peace e Countdown to Extinction. Mesmo quando o Youthanasia foi lançado, sendo bem diferente dos álbuns anteriores e menos técnico talvez, eu amei aquele disco. Eu ouvi Youthanasia repetidas vezes sem parar! Eu gosto de tocar ao vivo algumas coisas que parecem ser mais simples como A Tout Le Monde e Trust, do álbum Cryptic Writings“.
Isso leva imediatamente a uma discussão surgida entre os fãs do Soilwork: as músicas do Megadeth seriam teoricamente mais simples e menos intrincadas que as do grupo sueco. Dirk discorda. “Esse negócio de falar que as músicas são fáceis de tocar não é bem assim. É tudo uma questão de performance. Tocar essas músicas ao vivo de uma maneira excelente não é fácil, pois você tem a responsabilidade de tocar músicas que na grande maioria já são clássicos consagrados e você não vai querer estragar com invencionices. Se você acha que é fácil, por exemplo, tocar AC/DC ao vivo, não é! E eu desafio qualquer baterista a dizer que é fácil, pois estaria mentindo”.
Neste final de semana, finalmente o Soilwork vai tocar pela primeira vez no Brasil, depois de uma série de tentativas frustradas. “Uma pena eu não tocar para o Soilwork e é engraçado que acabei indo antes e tocando com o Megadeth”, diz. “Mas mal posso esperar pra ouvir as histórias dos caras depois de eles tocarem na América do Sul e também terem a oportunidade de testemunharem o que eu testemunhei”.
O público é ótimo e me recebeu super bem. Foi melhor do que eu esperava. Deu pra curtir um pouquinho também, andar pelas cidades. Lógico que tive que contar com a ajuda do Kiko, principalmente com o idioma e a comida, já que muita gente não fala inglês e eu não falo nada de português. O melhor mesmo foi testemunhar de perto a reputação dos fãs mais barulhentos do mundo em shows pela América do Sul: Brasil, Argentina, Chile não decepcionaram nenhum um pouco
Já no Paraguai, a situação foi um pouco triste e as lembranças não são nada boas. “A gente conseguia ver do palco que as pessoas na primeira fila estavam sendo esmagadas e as barras de segurança eram muito fracas. A segurança do local estava tendo bastante problema pra controlar o público e depois de umas sete músicas a gente resolveu parar principalmente pela segurança do público e também da banda”, relembra, com preocupação. “Não dava pra continuar senão uma tragédia maior poderia acontecer. A gente se sente em débito com os fãs do Paraguai e com certeza voltaremos para tocar num lugar mais seguro”.
Outra promessa que Dirk faz é que, depois dessa longa turnê de lançamento do Dystopia, vai voltar para o seu estúdio em casa e estudar, treinar e pensar em coisas novas que com certeza vai querer aplicar no Megadeth. “Com certeza eu vou tentar trazer coisas à mesa conforme o tempo passa; ideias para músicas, letras, ideias para a bateria, claro, porque é o que eu toco. Vamos ver o que rola. Eu vou tentar inserir um pouco da minha personalidade e jeito de tocar, minhas ideias, e talvez elas sejam mantidas. Mas não quero forçar nada. Eu respeito totalmente o fato de que o Megadeth é a banda do Dave. Ele é o cara que fez essa banda durar todos esses anos”.
Ou seja, se confirma, portanto, a fama de que o sujeito é o poderoso chefão do metal? “Você lê muita coisa por aí falando que o Dave é esse cara que contrata e demite músico da noite pro dia como bem entender e na verdade você vê que alguns dos músicos que passaram pela banda, na verdade, saíram pra fazer outras coisas que os interessavam. Eu acho que isso acontece mais do que realmente pessoas sendo demitidas da banda pelo Dave”, afirma. “Acho que no fim são coisas que acabam ganhando uma repercussão maior na imprensa. Eu não tenho o que reclamar do Dave. Ele tem sido um cara muito legal comigo. Aliás, com toda a banda. Ele está sempre preocupado pra saber como todo mundo está se sentindo e se estão sendo bem tratados. E, cara, ele é o líder da banda! Ele tem que ser rígido! Eu sinceramente acho que ele está certo. Pra mim, tocar numa banda desse tamanho e ao lado de um cara igual ao Dave é simplesmente saber os meus limites e conhecer o meu lugar dentro da banda. Eu respeito muito isso”.
Ao final da segunda sessão de entrevista, realizada via Skype, Dirk demonstrava cansaço mas, sempre com um sorriso, estava, isso sim, curtindo um bocado poder falar sobre o assunto. Mas voltava, sempre e sempre, a agradecer aos colegas do Soilwork. “O apoio que aqueles caras me deram facilitou muito pra mim e pra me ajudar a poder curtir esse momento. Seria muito triste se eu tivesse perdido amigos no meio disso tudo e na verdade até agora tem sido como um sonho se tornando realidade. Sou realmente muito grato por tudo que esta acontecendo nesse momento”.