O novo Quarteto Fantástico pode não ser aquele que você conhece... | JUDAO.com.br

A principal inspiração para o novo filme do Quarteto Fantástico é a versão Ultimate, que tem origem e Destino BEM diferentes da clássica

“Já começou errado, estão mudando a origem toda, que Reed Richards moleque é esse? Entrando depois de todo mundo no projeto que deveria ser dele? E cadê o foguete?”. A frase, verdadeira, foi vista nos comentários do post de um amigo no Facebook ao colocar para APRECIAÇÃO um dos trailers do filme do Quarteto Fantástico.

De fato, ele não tá de todo errado. Este Quarteto do novo filme, que estreia nessa quinta (06) no Brasil, não é o mesmo Quarteto dos gibis de Stan Lee e Jack Kirby – que inspirou, inclusive, os dois filmes dirigidos por Tim Story — mas sim o do universo Ultimate, que reinterpreta o grupo em uma espécie de realidade paralela, lançada em 2004.

Embora grande parte da contextualização dos personagens tenha vindo de Grant Morrison, o autor escocês acabou não assumindo o papel de roteirista porque fechou o contrato de exclusividade com a DC. A responsabilidade de começar tudo de novo ficou a cargo de dois sujeitos que já tinham estabelecido raízes no Ultiverso: Brian Michael Bendis (Ultimate Homem-Aranha) e Mark Millar (Os Supremos, a versão Ultimate dos Vingadores).

Considerando que os Supremos do Millar também são a grande inspiração para a versão cinematográfica dos Vingadores, podemos confiar que a Fox pelo menos quis apostar numa fórmula que deu certo.

Na mitologia de Lee e Kirby, os quatro fantásticos ganham seus poderes graças a uma expedição liderada pelo genial cientista Reed Richards, a figura paternal, autoritária e mais velha da equipe — que convence todos a embarcar mesmo sabendo que se trata de uma operação não oficial. Quando digo “todos” entenda Sue Storm, a namoradinha de Reed; Johnny Storm, o impetuoso e tagarela irmão mais novo da Sue; e Ben Grimm, colega de quarto de Reed na faculdade e seu melhor amigo. A ideia seria buscar respostas no espaço de um jeito que a NASA ainda não tinha experimentado, tudo pra deixar os russos pra trás na exploração do ESPAÇO SIDERAL. Mas eles vão longe demais, algo dá errado na fuselagem da nave e todos são bombardeados por raios cósmicos.

Quando caem na Terra, bingo, ganham seus superpoderes.

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A versão de Bendis e Millar, no entanto, é BEM diferente. Reed é um jovem gênio científico que cria, ainda moleque, um revolucionário método de teletransporte. Seus pais o acham estranho, alguém que vai explodir a casa algum dia, assim como os VALENTÕES da escola. Seu único amigo (e proteção) é Ben Grimm, esportista nato que mantém Reed longe dos croques e cuecões. Descoberto por um agente do governo de nome Willie Lumpkin (nos gibis originais, um carteiro), Reed é levado para um projeto secreto de inovação científica dentro do (estão preparados?) Edifício Baxter.

Pois é, esqueça o prédio que fica na esquina da Rua 42 com a Avenida Madison como um QG ultratecnológico de uma equipe de super-heróis e mantido essencialmente pelos royalties das invenções de Reed, este empreendedor de cabelos grisalhos. Aqui, o Professor Storm, pai de Sue e Johnny, é o líder do projeto e mantém as coisas rodando, incentivando os jovens cérebros dos talentos ali presentes a revolucionar o mundo. O mais jovem do local, um verdadeiro prodígio, Reed é a esperança da descoberta que vai dar início a revolução — pelo menos é o que o Governo dos EUA espera.

Inseguro e tímido, Reed está longe de ser o líder do time, apesar de ser tão brilhante quanto sua contraparte da cronologia normal. Na verdade, quem costuma assumir a posição de liderança é Sue – por quem o nerdzinho se interessa a princípio, mas que demora a engatar um relacionamento de fato. De gênio forte e longe do estereótipo da donzela em perigo, aqui Sue também é uma cientista, que entende tudo que Reed diz. Na real, uma bioengenheira obrigada a lidar com o temperamento engraçadinho do irmão mais novo (sim, a personalidade dele é uma das poucas coisas em comum entre as duas versões da equipe).

Quando chega aos 21 anos, Richards consegue desenvolver uma incrível máquina de viagem interdimensional, que pode levar diretamente para a chamada Zona-N (versão Ultimate da Zona Negativa). Reed, Sue e Johnny fazem parte da equipe de testes, ao lado de Ben, que estava mochilando pelo deserto de Nevada e aparece pra ver o que o velho amigo anda fazendo e acaba acompanhando tudo junto com eles, da mesa de testes. O grande lance aqui é que este Ben não é um ex-militar, ex-piloto de testes da Força Aérea ou coisa assim. Ele é apenas, como os demais, um JOVEM. E que manja ainda menos de aspectos científicos do que o Coisa da cronologia “normal”, gerando muito mais situações cômicas sobre sua teimosia e cabeça-dura.

A grande diferença está no fato de que a história toda acaba sendo de alguma forma sabotada por um quinto integrante do time, transformando o que seria apenas um experimento em uma viagem, um teleporte de fato. Alguém que se considera mais inteligente do que Reed Richards. Que acha que os cálculos do “recém-chegado” estão todos errados e os muda deliberadamente. Um certo Victor Van Damme.

É, Van Damme. Não Von Doom (ou Domashev). Em uma mudança de sobrenome nunca explicada satisfatoriamente, é aqui que a história faz com que eu amaldiçoe Bendis e Millar eternamente – assim como Warren Ellis, o roteirista que assumiu a partir do arco de histórias seguinte, justamente aquele que conta mais detalhes a respeito de Victor. Esqueça a parada do herdeiro de ciganos que quer buscar a alma da mãe no inferno, que tenta unir magia e ciência e acaba fodendo tudo. Esqueça a armadura, a dominação da Latvéria, a tirania, o rosto deformado. Deixe tudo isso pra trás. Porque Van Damme é um honrado herdeiro do conde Vlad Tepes — ou Drácula, para os íntimos — que vai parar no projeto do Edifício Baxter para honrar a tradição de sua família. E... meh.

Doom

Quando Van Damme (...) volta da Zona-N com os outros quatro (todos vítimas de um acidente e não de uma viagem deliberada) e é re-materializado em nossa dimensão, ele também foi modificado. Enquanto os poderes de Reed, Sue, Johnny e Ben são praticamente os mesmos, Destino torna-se um sujeito de pele metálica. Isso. Não falei pra esquecer a armadura? E ele tem garras nas mãos. E seus pés são em formato de pé de bode, para lembrar um demônio. E ele está longe, mais MUITO longe de ser o personagem interessante que é o Doutor Destino do universo regular da editora. Pouco ameaçador, fazendo uso de um cansativo exército de insetos mecânicos (ou algo assim, não pergunte), rapidamente ele some dos gibis Ultimate, fazendo apenas aparições esporádicas do tipo “morreu ou não morreu”. No fim, um fracasso que não é uma ameaça global em potencial, mas sim um banana com pés de bode.

A Zona N

Se, nos quadrinhos regulares, a Zona Negativa é uma espécie de universo de antimatéria paralelo à Terra, que tem em seu centro um incontrolável vórtex de energia, a Zona-N é outra parada. No Universo Ultimate, a Zona-N é uma dimensão próxima de seu fim. Nos estágios finais de uma entropia causada pelo calor, com poucos anos de existência até consumir a si mesma. Existem algumas poucas estrelas brilhando no céu – e uma criatura ancestral que materializa a entropia dentro de si: Nihil, a versão ultimate do Aniquilador.

No final, Nihil, cujo nome não por acaso é referência ao conceito filosófico do niilismo (a morte do sentido, a ausência de resposta sobre o destino), pode ser o elemento que falta no quebra-cabeças para entendermos qual vai ser a grande ameaça deste Quarteto Fantástico numa possível continuação (elas sempre existem, vamos ser honestos).

E o futuro?

É difícil imaginar o que vai acontecer daqui pra frente com a franquia, pra ser franco. Mas uma coisa interessante a se considerar é que o futuro do Quarteto Fantástico Ultimate é tão diferente do Quarteto Fantástico comum quanto é, por exemplo, a trajetória de Peter Parker – que na cronologia Ultimate, morre e é substituído por Miles Morales.

Tudo vira de cabeça pra baixo depois que Magneto muda o eixo magnético da Terra, causando uma catástrofe global que mata gente pra dedéu, incluindo alguns dos nossos maiores heróis. E neste mundo Ultimate, quem morre costuma ficar morto MESMO. Reed fica perturbado por não ter conseguido impedir nada daquilo – e também por saber que a sua equipe está se separando e que Sue não aceitou o seu pedido de casamento.

Ultimate_Comics_Doom_Vol_1_4É muita coisa pra cabeça do rapaz. Digamos que sua visão de mundo muda radicalmente a partir daí. Fingindo sua própria morte e explodindo a casa dos pais, ele passa a controlar das sombras uma raça de alienígenas que atinge os pontos fracos de alguns dos principais heróis Marvel. Seu objetivo? No melhor estilo Watchmen, a intenção era usar a tragédia para unir todos novamente. Em vão. Depois de lutar contra os velhos amigos, Reed acaba sendo acidentalmente jogado dentro de um portal dimensional. E aí, gente, é que fodeu.

Primeiro, com parte do rosto deformado, ele passou a usar a Zona-N como base para concretizar seus planos cada vez mais pirados de melhorar o mundo. Depois, criou uma sociedade de seres alta e rapidamente evoluídos que quase tomou conta (leia-se: absorveu) de boa parte da Europa e forçou os maiores pesos-pesados da prática super-heroística a se unirem para detê-lo antes que fosse tarde. Isso pra não mencionar que ele passa a procurar as Joias do Infinito para mudar o mundo e fazer dele “um lugar melhor”.

Exatamente isso que você pensou: Reed Richards se torna o grande vilão do Universo Ultimate. Muito mais legal, megalomaníaco e insano do que a própria versão Ultimate do Doutor Destino. Estaria aqui o futuro de Miles Teller, nesta visão mais sombria que a Fox quer impor ao Quarteto?

Quer ver outra coisa que se tornou bastante diferente na versão Ultimate? Ben Grimm ganhou a habilidade de mudar de forma quando quer. Além do corpo de pedra laranja, ao ser atingido por um dos aliens de Reed, ele passou a conseguir assumir uma forma humanoide de energia roxa e brilhante, tão forte e resistente quanto – e cujo visual lembra bastante o do Magnum/Simon Williams da cronologia clássica da Marvel. Isso pode ser algo que a Fox passe a usar – afinal, Jamie Bell não mostraria mais a carinha bonita depois do incidente que o transformaria em um monstrengo de rocha? Sei não. Se os heróis vivem tirando capacetes e máscaras para garantir um mínimo de exposição da face dos atores em tela, vai saber...

E quer ver outra coisa interessante? Com Reed totalmente amalucado e fora da jogada, Sue se envolve com Ben. Isso mesmo. Temos um triângulo amoroso. Nada de Alicia Masters aqui. Outra possibilidade para a Fox? Uma pimenta a mais nesta feijoada?

Isso se a gente não levar em consideração o fato de que o Tocha Humana se torna, nas HQs Ultimate, alguém que tem participação recorrente nos títulos do Homem-Aranha e... rufem os tambores... dos X-Men. Amigo de Kitty Pryde, ele passa a conviver com a ala jovem dos mutantes, incluindo Vampira e o Homem de Gelo. Seria a partir daí que as duas franquias começariam a conversar? ;)

Afinal, esta não é a fórmula que a Fox está querendo construir com X-Men, Deadpool, Gambit e a porra toda? Resta saber se vão mesmo saber entregar o que prometem. E direito.