Max Cavalera: “vou continuar fazendo esta porra até morrer!” | JUDAO.com.br

Líder do Soulfly fala sobre família, aposentadoria, planos para o futuro e mais uma porrada de coisas em entrevista exclusiva – na qual não teve AQUELA pergunta. Ainda bem! ;)

Assim que eu soube que teria a oportunidade de entrevistar Max Cavalera, um dos maiores nomes do heavy metal mundial, prometi uma coisa pra mim mesmo: “não vou perguntar porra nenhuma sobre a reunião da formação clássica do Sepultura”. Aquele papinho de sempre, sabe? Aliás, sendo bem franco, meu objetivo era não perguntar rigorosamente NADA sobre o Sepultura. Me focar especificamente no Max e em seu trabalho no Soulfly – que lançou ano passado o ótimo Archangel, seu décimo disco de estúdio, e está embarcando para uma turnê pelo Brasil em abril, passando por cinco cidades (SP, RJ, Florianópolis, Fortaleza e Ribeirão Preto).

Só que, pra fazer isso, pra fazer o papo fluir diferente, eu tinha que tirar o elefante branco da sala. E como este ano o Max está completando algo em torno de 35 anos de carreira como músico profissional (pense que o Roots está fazendo 20 anos enquanto o 1o disco do Sepultura, Morbid Visions, tá celebrando suas três décadas), soltei logo de primeira: “afinal, tem alguma pergunta que, depois de tanto tempo, você não aguenta mais responder?”. Eu podia ter dado um tiro no pé. Mas acertei na mosca: “ah, aquela sobre a reunião do Sepultura, né? Todo mundo pergunta sempre, já deu meio no saco. Eu respondo toda vez, sei que faz parte, é o trampo de vocês, é parte da minha história, tenho que aturar”. Eu logo emendei: “eu entendo. E posso te garantir que esta pergunta não tá na minha pauta”.

Ele riu. Eu ri. E o papo transcorreu de um jeito bem solto, bem leve, bem tranquilo. Max estava bem-humorado, empolgadíssimo pra falar sobre a sua banda – “é meu bebê”, diz ele. “O Soufly é a minha prioridade de vida. Tô nessa banda há 18 anos. Já gravei mais com o Soulfly do que qualquer outra banda na vida, do que com o Sepultura”. Sim, ele mencionou o Sepultura, mas sempre dentro de um contexto. Sem citar os trabalhos novos, o Andreas, o Derrick, quem quer que seja. Como a gente já disse aqui, apenas como parte de um passado do qual ele tem todos os motivos do mundo pra se orgulhar.

Uma das lembranças acontece justamente por causa do Roots, que é um conceito experimental que ele pensa em fazer mais daqui pra frente. “Este papo de metal com world music, sério, eu queria fazer mais. Tipo o que fizemos no Roots, com os xavantes. Sei que é difícil por causa das viagens, da grana. É caro. Mas seria foda gravar uns sons na África, no Oriente Médio, com artistas diferentes. Eu ainda vou fazer isso”. Ele lembra, com gosto, que neste disco mais recente eles até usaram o duduk, que é um instrumento de sopro típico da Armênia, na faixa bônus Soulfly X. “Temos este lado mais experimental mesmo, por mais que a banda esteja ficando cada vez mais pesada, mais extrema. Sei que teve gente que torceu o nariz, assim como sei que teve gente que torceu o nariz pro Roots – que eu ainda acho que é o disco certo, por sinal”.

Aliás, aos 46 anos de idade, este natural da cidade de Belo Horizonte mas atualmente morando em Phoenix, nos EUA, diz claramente que não tem mais nada pra provar pra ninguém e, de verdade, não está interessado em agradar todo mundo. “Ficamos mais pesados, mais radicais, menos naquela coisa de new metal, sei que nossa base de fãs diminuiu. Mas tudo bem. Acabamos ficando mais ligados no underground, que é de onde o metal vem originalmente. Este lance de tocar em lugares menores não me afeta. Eu até gosto. Acho que é mais legal do que tocar em lugar gigante, legal tocar com um monte de gente grudada em você”, diz, divertindo-se na resposta.

O movimento que o Soulfly seguiu rumo a uma sonoridade mais porradeira tem muito a ver com o que o próprio Max, um fã declarado de metal que está vivendo o sonho, anda ouvindo. “Hoje eu tenho ouvido muito mais metal extremo, sabe? Black metal, death metal. E os clássicos, né? Maiden, Sabbath, Judas. E o thrash, Slayer, Metallica. E ainda Pantera, Napalm Death, estas coisas”. Para ele, o que aconteceu com o Soulfly é algo que ele, enquanto ouvinte, queria que tivesse acontecido com o Metallica, por exemplo – os anos e a maturidade permitindo que eles pudessem ousar cada vez mais, e não menos. “O Archangel é tão pesado quanto o Conquer (2009) ou o Enslaved (2012)”, opina. “E ainda tem uma vibe meio Behemoth, Belphegor, meio black metal, este tema meio bíblico. Não tinha feito algo assim antes, colocando o arcanjo São Miguel na capa, mais provocativo”. E a promessa é que a banda fique cada vez mais pesada. “O próximo disco deve ser ainda mais extremo e mais barulhento”. Mas, tem limites pra isso? “Pô, acho que não tem limites não”, aponta, soltando uma gargalhada contagiante.

Mesmo assim, para Max o Soulfly ainda é uma banda bem representativa no cenário metálico. “O Soulfly virou meio que uma entidade, né? Ainda é bem grande na Rússia, na Austrália, nos EUA, ainda sinto que é muito forte a cada show que faço. Tem bastante fã”. Ele explica que a coisa que mais o faz entender a força do Soulfly é a quantidade de gente que vê, lá de cima do palco, com tatuagens da banda nos shows. “A cada apresentação, vejo pelo menos uns três ou quatro. E, porra, sei que tatuagem é um lance que dói pra caralho, e o cara gosta tanto da gente a ponto de ir lá colocar a cara da banda na pele”.

“Cheguei a ver, lá na frente, em um show da Europa, um moleque que devia ter uns 8, 9 anos. Pô, aquilo é o futuro do metal”, decreta. Segundo ele, vai muito pai que é fã de Sepultura e moleque que é fã do Soulfly. “Às vezes o moleque nem me conhece da época do Sepultura mas tá lá, batendo cabeça com o pai. E eu gosto muito de fazer meet & greet, encontrar com esta galera toda, sentar pra conversar. Faço na boa. Porque só aí você tem uma noção da importância do seu trampo pro público, da mesma forma que sei o quanto o trampo das bandas que eu gosto é importante pra mim. O quanto isso faz a diferença da porta da casa delas pra dentro”.

Para a turnê, Max promete que eles tentarão passar a limpo estes quase vinte anos de trajetória do Soulfly. “Tem muita coisa mais antiga que a galera curte, tem Eye for an Eye, tem Tribe, Prophecy, tem músicas do Dark Ages”. Além disso, vão rolar pelo menos cinco músicas de Archangel. Mas com algumas surpresinhas reservadas para quem sentir saudades da banda original dos irmãos Cavalera. “A gente faz umas misturas – a música Archangel, por exemplo, a gente mistura com Refuse/Resist. Sodomites desemboca em Arise”. Além de uma homenagem ao finado Lemmy, com Ace of Spades, ele diz que as jams improvisadas são um dos grandes baratos no fim das contas. “Isso é a parada que faz o nosso show ser diferente, ser divertido. Umas jams tribais, meio Bad Brains, muita batucada, que duram uns dois minutos, pelo menos, entre uma música e outra”.

Música nova, por enquanto, não vai rolar – só no ano que vem. E isso vale não apenas para o Soulfly, mas também para o Cavalera Conspiracy e para o Killer be Killed (superbanda formada com Greg Puciato, do The Dillinger Escape Plan; Troy Sanders, do Mastodon; e Dave Elitch, ex-The Mars Volta). “Este projeto foi bem legal, todo mundo gostou, a gente deve fazer mais coisa junto”. Mas só em 2017. “Este ano não. É só turnê. Tá tudo cheio. Junta os shows já agendados do Soulfly e mais a turnê que vou fazer com o Cavalera Conspiracy, tocando o Roots na íntegra com o Igor, pô, já tem coisa pra cacete agendada”.

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Mas Max Cavalera não diz isso em tom de reclamação não, pelo contrário. Na verdade, ele diz que ama esta loucura de estrada, a correria pra lá e pra cá – desta vez, devidamente acompanhado dos filhos, Zyon (bateria) e Igor Jr. (baixo), ambos também integrantes da banda Lody Kong. “Mas na estrada não tem este lado de pai, eu trato eles sem frescura, falo com eles da mesma forma que o Marc (Rizzo, guitarrista)”. E tampouco ele se preocupa que vá rolar uma cobrança dos fãs, já que uma nova geração de Cavaleras tá no palco, a la Igor e Max no Sepultura. “Não dou muita bola pra isso, não. Quero botar a molecada pra tocar”.

O cantor/compositor/guitarrista, apesar de estar longe de ser um garotão – mais próximo dos cinquenta do que dos quarenta, na verdade — não pensa nesta coisa de aposentadoria, por mais que seus ídolos, como o Black Sabbath, estejam anunciando suas turnês de despedida. “Acho que só vou parar com esta porra quando morrer. Me vejo claramente tocando com 60, 65 anos de idade. Ainda mais hoje, que o lance da música pesada tá mais acessível, você vê claramente um monte de gente mais velha fazendo”.

Visivelmente empolgado, Max enfatiza pra caralho que gosta MUITO do lado “ao vivo” da profissão, de subir e bater cabeça. “Eu amo metal, tá na minha veia. Este lance de tocar ao vivo é o que vale pra mim. É a minha droga, sabe? Eu toco uma noite e no dia seguinte ainda quero mais, sou viciado nisso”.

E mais: ele acha que este papo de “aposentadoria” que está se tornando cada vez mais comum entre os rockstars das antigas é, na maior parte das vezes, papo furado. “Não acho, por exemplo, que os caras do Sabbath vão parar. O que o Ozzy vai ficar fazendo em casa? Eu, quando tô em casa sem fazer nada, já saio fazendo riff, quero tocar, vou já quebrar tudo. Acho que com ele deve ser a mesma coisa”.