Não foi um começo exatamente RUIM, veja. Mas o foco é muito mais num terror tradicional tipo anos 70 do que no Alan Moore — pelo menos até o momento. E talvez não seja o bastante pra quem acabou de nos entregar a Patrulha do Destino, né.
SPOILER! Desde o episódio 1, a série da Patrulha do Destino chegou sem concessões, atirando com todas as armas e apostando todas as suas fichas, espalhando humor, autocrítica e metalinguagem ao longo de uma estreia que já deixava claro o que viria a seguir: a inspiração era CLARÍSSIMA na fase de pura loucura escrita por Grant Morrison. Deu certo, deu certíssimo.
Portanto, exatamente uma semana depois do season finale da Patrulha, era natural que a estreia de OUTRA série do serviço de streaming da DC inspirada em personagens que ficaram famosos pela abordagem adulta nos gibis viesse carregada de expectativa. E que, de certa forma, acabou um tanto frustrada. Porque, apesar de rolar um papo de que a série do Monstro do Pântano vai ser inspirada em Lição de Anatomia, o arco escrito por Alan Moore que vira a origem do personagem completamente do avesso, pelo menos este primeiro episódio não serve como uma apresentação DISSO.
Na real, o piloto segue ares BEM tradicionais de condução da história, numa mistura de filme de terror baixo orçamento dos anos 70 — e aí conversando portanto bem mais com a origem do personagem criado por Len Wein e Bernie Wrightson do que com a fase Moore — com aquela clássica história de teoria da conspiração sobrenatural numa cidade pequena que facilmente poderia ser encaixada no caminho do Impala dos irmãos Winchester.
Não chega a ser ruim, apesar dos jumpscares meio óbvios, sobe música de tensão, vidro trinca, protagonista pula de susto. Mas para quem não necessariamente conhece o Monstro do Pântano das HQs originais e não faz ideia do potencial da história que vem à frente, fica uma sensação meio incômoda de “ah, legal, mas já vi isso antes”. Daí pra abandonar a série logo no terceiro episódio, é um pulo.
De verdade, não tenho problema algum com as mudanças com relação aos quadrinhos que a série tomou — Abby Arcane (Crystal Reed) é retratada como a real protagonista da parada, o que é uma ideia das mais interessantes. Cientista renomada do Serviço de Inteligência Epidêmica do Centro de Controle de Doenças (Center for Disease Control ou CDC, um dos mais importantes órgãos do governo americano), ela volta para sua cidade natal, a pequena e folclórica Marais, na Louisiana, para lidar com uma estranha epidemia que parece estar vindo diretamente dos pântanos. Mas acaba tendo também que encarar os fantasmas de seu passado, ao encarar o casal Sunderland, da mais rica e poderosa família da região. Aparentemente, Abby teria sido a responsável, há muitos anos, pela morte de sua amiga, Shawna, filha dos ricaços, cuja matriarca jamais perdoou a jovem...
No meio do caminho, ela conhece o biólogo Alec Holland (Andy Bean), um forasteiro contratado por Avery Sunderland para comandar um pequeno laboratório no qual tenta descobrir novas possibilidades científicas vindas a partir do pântano, como medicamentos, fertilizantes e afins. Sim, sim, a Abby conhece o Alec ANTES de ele se tornar a criatura do pântano. Talvez eu ache a decisão meio equivocada porque parte da grande graça de ver a paixão entre ambos é o fato de que ela se interessa por um MONSTRO sem ter contato prévio com sua versão humana, com uma estranha sensualidade sobrenatural? Talvez. Mas não é algo que tira totalmente o foco aqui — e além desta versão do Holland ser suficientemente simpática pra você se importar com ela (Chinelos, cara! Alec é #Familia013), com o seu próprio passado de erros dos quais se arrepende, a química entre os dois evidentemente funciona.
Igualmente, tenho ZERO questões com a morte de Alec, que não tem explosões no laboratório e obviamente tampouco a presença de sua esposa Linda na conversa — mas sim um par de balaços no meio do peito em meio a uma missão de resgate de estranhos elementos químicos mantidos sem que ele saiba para testes no pântano. E, de verdade, gosto BEM não apenas da ideia do Monstro ser apenas brevemente mostrado no final do episódio mas também dele ser, como imagino que vá acontecer, uma espécie de tubarão no filme do Spielberg, apenas sugerido aqui, mostrado de relance ali ou acolá. Isso ajuda a construir um clima diferente.
A merda é que é tudo isso acontece numa pegada de filme de terror BEM óbvio, formulaico, lembrando... senhoras e senhores, que rufem os tambores aqui... os filmes do Conjuringverse do James Wan, não por acaso produtor executivo da série. E é AQUI que a parada toda me incomoda.
Você sabe de onde vão vir os sustos muito antes que eles venham. A história deste episódio piloto segue um caminho que você tranquilamente consegue desenhar muitas cenas antes, “ah este é o melhor amigo que tem uma queda pela Abby, ah aquela é a melhor amiga maluquinha mas que ainda vai ajudar muito com seu talento que ninguém imagina”. E CLARAMENTE, pelo jeito que ele fala e se comporta, pelo jeito que ele é filmado, pelo seu olhar de cidadão de bem interiorano, qualquer um já saca que Sunderland é o vilão da porra toda e responsável pelo “acidente” que torna Holland no Monstro do Pântano. Já dá até pra ficar esperando a risada maléfica.
Dava pra inverter a narrativa. Virar tudo ao contrário, misturar passado e presente, aplicar uma dose extra de tensão e mistério, tornar mais palpável o clima de magia da região, tudo sem perder a homenagem às origens de Wein e Wrightson mas já criando uma conexão com o misticismo esquisito e sexy que Moore aplica no seu Monstro do Pântano elemental, o ser planta em busca de sua humanidade. Dava pra provocar um pouco mais, sem esfregar tudo na nossa cara de um jeito didático e todo explicadinho.
Pode ser que tudo isso esteja a caminho? Claro que pode. E vai ser LINDO se estiver, vou AMAR ser surpreendido. Mas a ideia de um episódio piloto é justamente te vender o CONCEITO de uma série, te fazer ficar louco pra acompanhar o que vem a seguir. É o seu primeiro contato com o que vem por aí, saca? E com base NESTE episódio piloto, digamos que as expectativas para os próximos NOVE episódios não são mais lá tão altas...