Acho que precisamos falar sobre Legends of Tomorrow | JUDAO.com.br

Série tem que entender o motivo para a própria existência, principalmente nessa segunda temporada — que começou na semana passada

SPOILER! Arrow é sobre a redenção de um playboy que, após passar “cinco anos no inferno”, volta com o objetivo de exorcizar os próprios demônios e salvar a cidade na qual cresceu. The Flash é sobre uma criança que vê a morte da mãe e a acusação injusta do pai, passando a vida perseguindo o impossível e, já adulto, descobre que precisa usar os poderes que ganhou para que aquela história não se repita com outras pessoas – e, quem sabe, arrumar o próprio passado. Supergirl é sobre uma garota que cresceu à sombra do primo mais novo, eventualmente percebendo que ela tem os mesmos poderes e, obviamente, as mesmas responsabilidades que ele em relação ao mundo que adotaram. Cada temporada tem objetivos mais específicos, mas, no MACRO, o caminho é mais ou menos esse.

Agora, qual é a grande motivação de Legends of Tomorrow? Além de, obviamente, ter crossovers com o resto do Arrowverse?

Você pode falar que é simplesmente juntar um grupo de heróis e, a partir daí, contar as histórias deles. Porém, será isso o suficiente para segurar roteiros minimamente interessantes, que prendam a nossa atenção e tiram o nosso fôlego enquanto acompanhamos as histórias daqueles heróis? A julgar pelo primeiro episódio da segunda temporada de Legends, Out of Time, não é.

Ok, juntar um grupo de pessoas diferentes e contar a história delas pode ser, de alguma forma, também o objetivo de Agents of SHIELD, do outro lado da FORÇA. Porém, Coulson, May, Daisy e companhia possuem um objetivo em comum: superar as diferenças entre si para compor a SHIELD, uma DIVISÃO responsável por manter a coesão de uma Terra cheia de perigos e superpoderosos enquanto precisam lidar com política, intervenção, espionagem, logística e dissuasão. A partir daí, cada personagem desenvolve a sua própria história, claro. Não é só sair por aí socando vilões.

Só que Legends, na primeira temporada, foi sobre um homem – Rip Hunter – que perdeu a família, viu o próprio mundo ruir e foi impedido de salvar tudo aquilo. Acabou reunindo um grupo de EXPENDABLES para lutar por ele e derrotar o imortal Vandal Savage. Ok, todo mundo lutava pelo futuro (distante) da Terra, mas no final o objetivo de Hunter acabou se mostrando mesquinho e vazio, sem qualquer impacto na curva de evolução dos outros integrantes do time. A série até tentou lidar com isso, usando essa motivação para causar conflito entre os personagens, mas passou a ficar difícil para nós, enquanto espectadores, nos empolgarmos com tudo aquilo. Se os personagens estavam, em muitos casos, no “tanto faz”, fomos seguindo a corrente.

Sim, aquele com a peruca bagunçada é Albert Einstein

Sim, aquele com a peruca bagunçada é Albert Einstein

Agora, nessa segunda temporada, Rip Hunter se foi. Não, ele não morreu (eu acho), mas sumiu e ficará boa parte do ano ausente. Caberá às próprias LENDAS DO AMANHÃ a lutar por si, arrumando distúrbios temporais causados por “não sei quem” – provavelmente o Flash Reverso. Ok, legal, ninguém quer ver o mundo indo pro saco mas, enquanto TRAJETÓRIA, o que isso agrega para os integrantes da equipe, que são Eléktron, Canário Branco, Nuclear, Onda Térmica e os novatos Cidadão Gládio e Vixen? Quais são os objetivos deles, onde eles querem estar no final da temporada? O que vão fazer, além de se divertir socando alguém na França em PRISCAS ERAS?

Na prática, só Sara Lance parece ter uma jornada enquanto personagem, com um objetivo tangível, agora marcado pela vingança contra Damien Darhk (que matou a irmã dela, a Canário Negro, na temporada anterior de Arrow).

Só a Canário Branco parece ter para onde ir nesta segunda temporada. Os outros personagens só estão lá pra fazer número, socar vilões e justificar crossovers.

Se Rip era o pequeno elo fraco que fazia o time ter alguma coesão, o que Legends guardará na manga para continuar? A Legião do Mal – formada pelo Reverso, Darhk, Merlyn e Capitão Frio — pode até justificar isso, mas o tripé (formado por bons vilões, um bom roteiro e uma boa motivação) continua manco. Essa passa a ser uma história que não vale apena ser contada, simples assim.

O que temos são personagens extremamente rasos, que repetem quase sempre as mesmas trajetórias, clichês e reações. Ray Palmer é o cientista que quer fugir do rótulo de ser alguma coisa só por causa da armadura, Jax é o mecânico, Sara Lance é o Zé Mayer de saias... E por aí vai. Mesmo Mick Rory, que teve toda aquela fase como integrante maligno dos Mestres do Tempo (e, pelas minhas contas, já deve ter UMAS CENTENAS DE ANOS), parece ter mudado ou evoluído muito pouco por conta de toda a experiência.

Talvez a entrada da Sociedade da Justiça, que já mostrou as caras no final desse último episódio, mude um pouco isso. Vai saber, os protagonistas de série podem se inspirar nos clássicos heróis e, a partir daí, encará-los como um espelho do que querem ser. Já é, de alguma forma, uma trajetória para eles. Mas os problemas não acabariam aí.

A SJA vem aí

A SJA vem aí

Por mais que Legends seja uma série sobre viagens no tempo, ela está estruturada de forma completamente careta, linear. Foram poucos os momentos nos quais, na primeira temporada, o enredo saiu dessa estrutura – basicamente naquilo que envolvia aqueles meteoritos do Savage. O primeiro episódio desta segunda temporada retornou ao feijão com arroz, com uma linha quase que reta com causa e consequência. “Ah, o Wave Rider aparece detonado no começo do episódio, não foi bem assim”. Não se engane: começar com tudo na merda para contar o que rolou antes como flashback é uma das coisas mais batidas do universo, sem falar que a saída para juntar Oliver Queen e Nate Heywood, que se tornará em breve o Gládio, foi só pra fazer um crossover SAFADO com Arrow.

Que tal, Legends, deixar de lado essa coisa de “causa e consequência”, invertendo o jogo? The Flash faz tão bem isso: toda a série – começando pela morte de Nora Allen – só é do jeito que é por uma consequência de causas que nem vimos, mas já aconteceram. Aliás, chega a até espantar como algumas regras das viagens temporais aplicadas na série do Corredor Escarlate são quase que totalmente ignoradas na produção da equipe. Quantas vezes a história já foi reescrita pelas Lendas, com quase nenhuma mudança perceptível ao resto do universo? Já o Barry, coitado, desiste de deixar a mãe viva e já é o suficiente pra fazer um monte de cagada.

E isso tudo é só o macro. Se for chegar no nível do detalhe, vai se perguntar como a geladeira do Wave Rider consegue guardar uma cerveja por 75 anos sem estragar. Isso tudo enquanto está no fundo do mar.

Até o momento, a segunda temporada de Legends of Tomorrow tem 13 episódios encomendados, mas mais podem ser pedidos. Porém, a julgar pelo que tá na TV (e pela audiência, que foi baixíssima nesse retorno), sei não. E o potencial, lá atrás, era tão grande...