Estrelado por um grupo de “influenciadores digitais”, ele agora tenta trilhar um caminho diferente de distribuição
Um grupo de jovens decide fazer uma viagem para o meio do mato, com o objetivo de conhecer a tal da Sickhouse, uma cabana nos arredores de Los Angeles que tem uma história macabra envolvendo um antigo produtor de Hollywood e sua esposa doente. E é claro que dá merda no meio do caminho, né. Isso você já imaginava.
Esta poderia ser a trama genérica de qualquer filme de terror lançado, sei lá, nos últimos 30 anos. Mas é a história-base de Sickhouse, produção da Indigenous Media – um estúdio que iniciou as operações recentemente e descreve a si mesmo como uma empresa “da nova geração focada em produzir conteúdo original para plataformas emergentes e tradicionais em todo o mundo, assim como desenvolver e operar plataformas multiplataforma de conteúdo para marcas”.
O que isso tudo significa, portanto? Que Sickhouse é um filme de terror do tipo found footage, câmera na mão. Mas inteiramente gravado no Snapchat — e com o vídeo vertical –, ao longo de cinco dias (de 29 de abril a 3 de abril), usando iPhones e publicando os vídeos de 10 segundos na conta de Andrea Russett (@andwizzle), que tem cerca de 2,5 milhões de inscritos no YouTube. E detalhe: sem avisar ninguém de que se tratava de um filme e não da vida real. Pelo menos até o último snap, que levaria para um vídeo no YouTube no qual ela explicaria a ideia por trás do projeto.
“Eu fiquei realmente preocupada com isso, mas seguimos por um caminho no qual não estávamos tentando DE VERDADE enganar as pessoas”, afirmou Andrea, em entrevista para a Variety. “Queríamos que as pessoas entendessem que era um filme e que elas estavam sendo convidadas para entrar nesta experiência junto com a gente. Só dá pra fazer uma coisa assim uma vez, mas vale muito a pena explorar como fazer outros filmes em plataformas sociais”.
Escrito e dirigido por Hannah MacPherson (que, depois de trabalhar no departamento de elenco de filmes como O Livro de Eli e Bravura Indômita, resolveu rodar seu primeiro longa justamente neste formato), é claro que muitas das atuações acabaram sendo improvisações. Além de Andrea, estavam participando nomes como o ator Sean O’Donnell (que, apesar de ser iniciante em Hollywood, já tem mais de 1 milhão de seguidores no Instagram) e o youtuber Jc Caylen (que também tem lá seus mais de 2 milhões de inscritos no canal).
Ou seja: estamos MESMO falando de um filme de terror para os MILLENIALS. Com muito mais apelo, por exemplo, do que o tal Amizade Desfeita, que apenas brincou com o formato de tela e com a edição, sem mergulhar de cabeça na ideia de aproveitar a força da web. Sabe aquela galera que coloca vídeos do WhatsApp em programas de humor na TV? “Ai, tá bombando na internet, vamos colocar aqui também?”. Muito isso. Sickhouse parece seguir um caminho mais orgânico. Bem mais naturalmente digital.
E com o vídeo vertical.
Os clipes de Sickhouse no perfil de Andrea, antes de sumirem no período padrão de 24 horas, foram vistos mais de 100 milhões de vezes – e, para dar ainda mais “autenticidade” à lenda da casa, os produtores criaram um site com uma pegada meio “amadora” e uma fanpage no Facebook dando detalhes a respeito de suas histórias passadas. Como a youtuber estava interpretando a si mesma, o que não faltaram foram fãs criando perfis falsos no Twitter para a sua prima de mentira, Taylour (interpretada pela atriz Laine Neil) – como o @SweetBaBayTay, que acabou ganhando mais de 4.000 seguidores em poucos dias.
Bom, tudo gravado verticalmente, via Snapchat, muito legal, mas e agora? Quando o filme vai ser lançado? Na real, ele já foi – mas não nos cinemas. Sickhouse está disponível para compra em formato digital no Vimeo On Demand por US$ 5,99. E detalhe que é uma “versão do diretor”, com duração de 68 minutos e cenas adicionais que não chegaram a ser postadas no Snapchat (incluindo um final menos ambíguo e mais direto). A tagline explica a estratégia: um filme feito para APARATOS móveis.
“Nós todos somos fãs de A Bruxa de Blair, o primeiro grande filme do tipo found footage”, explica Jake Avnet, todo-poderoso da Indigenous Media, além de filho (e sócio) de Jon, produtor veterano de Hollywood, numa entrevista ao Mashable. “E, claro, ficamos todos impressionados pela performance da LonelyGirl15, que de muitas formas foi a responsável por colocar o YouTube no mapa como uma plataforma para se contar histórias”.
Segundo ele, até o momento ninguém tinha tentado contar uma história mais longa no Snapchat, com vídeo vertical – que é “uma plataforma com muitas visualizações e engajamento”. Se você é daqueles que acha que isso é exagero e que o Snapchat é só uma “modinha”, vale lembrar um levantamento recente obtido pela Bloomberg, que indica que o Snap tem mais de 150 milhões de pessoas usando o serviço diariamente. Isso significa um número de usuários ativos diariamente maior do que os 140 milhões do Twitter. Isso levando em consideração que a rede social do passarinho está em funcionamento há uma década, enquanto o fantasminha tem menos de quatro anos.
“As pessoas mais jovens não estão indo aos cinemas, não estão vendo TV. Elas passam a maior parte de seu tempo livre na internet, vendo coisas no YouTube, no Snapchat, etc.”, reforça Avnet. “Já que é aí que este público vive, por que vamos ficar tentando forçá-los a ir para outros lugares na hora de ver um filme ou uma série?”.
Para a Fortune, o produtor deixou claro que não quis conversar com o próprio Snapchat para fechar algum tipo de parceria oficial, concentrando suas energias na força da própria base de Andrea e dos demais influenciadores digitais. Mas, afinal, será que isso tudo vai resultar em lucro de verdade? “Estamos bem entusiasmados, mas esta é daquelas situações nas quais temos zero histórico para fazer algum tipo de comparação a respeito do sucesso. Esperamos pelo melhor”.
No entanto, de acordo com o resultado que Sickhouse tenha no mundinho online, Avnet não descarta que ele possa ser negociado para exibição em salas de cinema tradicionais no futuro. “Queremos que ele chegue na maior quantidade de pessoas possível”, explica, ressaltando que não acha que esta nova forma de distribuição vá matar os filmes nas salas de cinema. “Este não é o fim dos Transformers da vida – e nem acho que o próximo blockbuster tenha que ser um filme de Snapchat, por exemplo. Eu acho, isso sim, que existem muitas oportunidades para múltiplos tipos de modelos de negócios”.
Só precisa saber como colocar a tela do cinema na vertical.
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