Jay & Silent Bob strikes back... De novo. | JUDAO.com.br

A dupla interpretada por Kevin Smith e Jason Mewes, que serve como elemento de ligação do chamado View Askewniverse, ganha uma mais uma chance solo – mas como diabos isso aconteceu? E… será que é uma boa ideia?

“Por mais que eu tenha amado brincar com os brinquedos dos outros nas séries do Flash e da Supergirl, tô ficando empolgado com este lance de brincar com meus velhos brinquedos de novo”. Foi assim que o roteirista e diretor Kevin Smith revelou no Instagram, com uma imagem de seu próprio computador, que teremos oficialmente um novo filme de Jay & Silent Bob, a dupla que aparece de maneira recorrente em boa parte de seus filmes.

Então, mas espera um pouco: você deve estar se perguntando aí o que diabos aconteceu tanto com O Balconista 3 quanto com Barrados no Shopping 2, as duas continuações nas quais Smith já tinha anunciado, com aquela empolgação costumeira, que estava trabalhando? Pois é. Ambas foram pro buraco. “O Balconista 3 não pode mais acontecer, porque um dos nossos quatro protagonistas pulou fora”, explica ele, deixando no ar que muito provavelmente foi Brian O’Halloran (Dante) ou Jeff Anderson (Randal), já que os outros dois seriam ele e Mewes. “Então, comecei a trabalhar em Barrados no Shopping 2... que não vai mais acontecer porque eu o transformei em uma série. E eu ofereci esta série (chamada MallBrats) para cerca de seis diferentes emissoras e não tive resposta positiva de nenhuma até agora”, conta.

O cineasta afirma que, apesar de tudo, não está reclamando da vida e que conseguiu fazer boa parte de tudo que queria nestes muitos anos trabalhando no mercado de entretenimento, mas relembra que O Balconista e Barrados no Shopping, apesar de serem suas ideias originais, foram devidamente vendidas para os estúdios. “O que limita minhas ideias com meu próprio material. Mas não me importo: lá no passado, tudo que eu queria era vender minhas paradas para que eu pudesse estar no mercado do cinema em primeiro lugar. Então, eu não sou dono d’O Balconista, Barrados no Shopping, Procura-se Amy ou Dogma”. Só que aí vem o ponto: “Mas eu sou dono de Jay & Silent Bob. (…) E eu já me encontrei com a galera da Miramax e eles estão dentro, então eu espero começar a rodar já no próximo verão”.

Em Procura-se Amy (1997), descobrimos que a dupla de quadrinistas Holden McNeil (Ben Affleck) e Banky Edwards (Jason Lee) produz uma bem-sucedida série de quadrinhos descerebrados e chapados chamada Bluntman & Chronic, uma dupla de heróis maconheiros inspirados em seus amigos Jay & Silent Bob. Os dois não gostam muito da ideia mas, enquanto recebem a sua grana de direitos autorais, tá tudo bem. Quando a MTV oferece a chance de transformar o gibi em uma série animada, Banky e Holden discordam e rompem a parceria. Banky fica com os direitos e os vende para a Miramax, que planeja fazer uma adaptação para os cinemas. É aí que começa O Império (do Besteirol) Contra-Ataca (2001).

Depois de lerem os comentários de alguns trolls em um portal especializado em cinema, Jay & Silent Bob decidem impedir a realização do filme, porque ele pode destruir a sua “reputação”. Mas, no fim, a produção acaba saindo, com Jason Biggs como Bluntman, James Van Der Beek como Chronic e ninguém menos do que Mark Hamill no papel do vilão Cock-Knocker. As inspirações para os personagens, no entanto, até acabaram participando de algumas cenas, já que invadiram o estúdio durante as gravações e tudo mais – e ficam tão putos com a repercussão que viajam pelo país visitando aqueles que fizeram comentários escrotos sobre o filme pra dar uns PETELECOS pessoalmente. Mesmo assim, a grana que os dois ganham com os direitos da produção ajuda a reabrir o Quick Stop em O Balconista II (2006). Um bom encerramento pra este papo todo, não? Ah, mas não se depender da mais nova mania da indústria do cinema, os reboots / remakes.

Pois bem: é daí que o novo filme, Jay and Silent Bob Reboot, parte. “Um filme divertido no qual os rapazes de Jersey voltam pra Hollywood para impedir um reboot daquele antigo filme de Bluntman & Chronic que eles tanto odiaram”, explica Smith. “É uma sátira que tira onda desta recente obsessão da indústria por refazer tudo, com um elenco de muitas participações especiais e aqueles rostos familiares”.

Olha só: Jay & Silent Bob são uma dupla divertidíssima, já viraram ícones da cultura pop. Talvez um dos maiores acertos da primeira leva de filmes de Kevin Smith, do começo de sua carreira. Em Procura-se Amy, por exemplo, eles roubam a cena em um diálogo incrível. Mas o grande lance é que eles funcionam muito melhor quando são, de fato, coadjuvantes. Vamos falar sério aqui.

Seja na série animada – que teve apenas uma temporada – ou nos gibis baseados em O Balconista, até quando eles dão as caras, de maneira absolutamente inesperada e gratuita, em filmes como Pânico 3, em HQs como Arqueiro Verde, Estranhos no Paraíso ou Savage Dragon, séries de TV como Degrassi: The Next Generation ou mesmo em clipes como Can’t Even Tell (Soul Asylum), Because I Got High (Afroman) e Kick Some Ass (Stroke 9), o negócio dá bem certo porque eles são apenas um tempero especial e não o prato principal.

O que acontece quando Smith resolve colocar a dupla como protagonista? Bom, eis que surge O Império (do Besteirol) Contra-Ataca – que, com ou sem título bizarro em português, é um filme de bosta, talvez a pior coisa que Smith já tenha dirigido na vida (e pense que ele já foi responsável por um filme de terror sobre um cara que vira uma morsa). A animação Jay & Silent Bob’s Super Groovy Cartoon Movie, lançada em 2013 como uma adaptação dos gibis de Bluntman & Chronic, também tá longe de ser lá um primor de originalidade e bom humor. Coloque os dois sob os holofotes durante duas horas e o meu grande medo é que apareçam apenas tiradas sobre bunda, pinto, peido, peitos e, claro, maconha.

Não que piadas escrotas, saídas daquele típico humor babaca e juvenil, sejam exatamente um problema. Adoramos essas merdas. Mas digamos que elas funcionam muito melhor quando ganham outra camada, né? Quando não temos duas horas de filmes APENAS E TÃO SOMENTE com tiradas sobre bunda, pinto, peido e peitos. Quando estão dentro de um conceito diferente, quando são ressignificadas... e quando tão dentro de contexto. Principalmente isso. Até o clubinho do trio Seth Rogen, Evan Goldberg e Judd Patow, com um tipo de humor que certas vezes é bastante questionável, já sacou isso.

A gente que acompanhou os primeiros filmes do Kevin Smith cresceu. Envelheceu. Aprendeu. Quem vê as entrevistas recentes do Smith sabe que até ELE é outro cara, mais maduro, que tá ligado em como a porra do mundo mudou (ainda bem). Se é o caso de chamar o filme de Jay and Silent Bob Reboot, talvez também seja o caso de fazer um reboot metalinguístico aqui e dar uma chacoalhada nos personagens. Afinal, tem gente fazendo besteirol bem melhor do que Kevin Smith nos dias de hoje. O cara vai precisar MESMO se atualizar pra continuar no jogo e contra-atacar de verdade.